sexta-feira, 5 de maio de 2023
Os Estados nacionais subordinados às big techs
terça-feira, 25 de abril de 2023
Para onde estão nos levando os valores sociais e educacionais do capitalismo?
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A entrada da escola, em Santa Catarina, após o comunicado sobre os atentados |
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sábado, 22 de abril de 2023
A velocidade nas mudanças econômicas e nas mentalidades
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Lula em viagem à China, de onde pronunciou declarações que desagradaram o imperialismo estadunidense e sua mídia. |
quinta-feira, 6 de abril de 2023
Retorno triunfal?
sábado, 11 de março de 2023
O autoritarismo petista nos sindicatos
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Lula, Alckmin e as "lideranças" das centrais sindicais |
O petismo usa e abusa do discurso
relacionado à “democracia”. Sente-se e vende-se como o “guardião democrático”
do Brasil. Podemos dizer, repetindo Florestan Fernandes, que o PT teve papel
importante no desenvolvimento e consolidação da democracia burguesa brasileira,
mas não podemos deixar de apontar as insuficiências e contradições dessa mesma
democracia, defendida tão exageradamente por ele como a única possível.
O efeito mais negativo desse discurso
petista se dá, certamente, no movimento sindical, que controla desde o final da
ditadura militar e do advento da “nova” República iniciada em 1985-1988. Desde então,
o sindicalismo petista-cutista tornou-se um nítido entrave que piora a
confiança dos trabalhadores nas suas forças independentes e na consciência de
classe, uma vez que se desenvolve no sentido do controle com mãos de ferro, que
distorce e persegue oposições minoritárias, tendo na sua total institucionalização
um dos principais sintomas do seu esgotamento.
O
sindicalismo petista desenvolveu um respeito quase religioso à legalidade, às
eleições e às instituições da democracia burguesa, que, quando se sentem
ameaçadas, tramam golpes e retirada de direitos dos trabalhadores em plena luz
do dia. Certamente que se deve observar certas práticas da legalidade para que
os sindicatos não sejam cassados burocraticamente e possam existir, mas isso
nada tem a ver com cultuar a legalidade, embelezá-la, chamar a classe
trabalhadora a confiar nela cegamente em todas as circunstâncias, tal como faz
o petismo. O resultado é a destruição completa da independência de classe e a
submissão total da classe trabalhadora ao Estado burguês – portanto, significa
o fim de qualquer movimento sindical que interesse ao proletariado.
Na prática de administrar os sindicatos
dentro dessa estreita legalidade, PT e CUT tratam como inimigos
irreconciliáveis todos aqueles que, de alguma forma, questionam essa legalidade
e que reconhecem nela um entrave. Não é necessário ser um gênio em sociologia e
em história para perceber o interesse da classe dominante neste legalismo, que
é o meio mais eficaz para controlar movimentos de base. Qualquer tipo de criatividade
que sobrevenha de baixo no calor de uma luta é morto antes mesmo de nascer,
dado que não encontrará nenhum tipo de receptividade por parte das direções
sindicais, preocupadas unicamente com os protocolos e rituais burocráticos
aceitos pela letra fria da legislação vigente.
Nesta perspectiva, as oposições
classistas são muito mal vistas, tendo seu direito de fala e de expressão
restringidos ou mesmo suprimidos. As desculpas para isso são as mais “nobres”:
falta de representatividade; ou então, a simples repressão ou negação do
direito a fala, tal como faria qualquer tipo de ditadura militar. Esta conduta
sindical desenvolve o costume da não-escuta!
Os argumentos não são rebatidos dentro do campo das ideias e no sentido
construtivo de se educar toda uma categoria (ou mesmo a classe trabalhadora
como um todo), mas tratados com ataques baixos, como simples “loucura” que não
é digna sequer de ser considerada. Isto é, vemos, na prática, uma censura
autoritária disfarçada.
Sabemos que existem oposições
irrealistas ou mesmo “irresponsáveis” (para se usar um jargão muito utilizado
pela burocracia cutista), mas nem todas as oposições ou posições da base podem
ser classificadas desse jeito tão edificante, nem devem ser respondidas com
métodos autoritários de censura e exclusão. Como os sindicatos são órgãos
coletivos por excelência, todos os seus eventos devem ser utilizados para uma
formação teórica coletiva – mesmo os mais insólitos e aparentemente
desrespeitosos.
O debate precisa ser qualificado, e não
simplificado a partir de generalizações rasas que apenas rotulam para a
manutenção do que aí está. Este tipo de “formação sindical” – que é a que
impera no sindicalismo cutista/petista – apenas pode alimentar o espírito de rebanho, pois não educa a
classe no sentido da reflexão crítica e do questionamento, tensionando setores
a se localizar embaixo da asa de um ou de outro caudilho sindical.
Alimentando o espírito de rebanho
No
CPERS, que serve de exemplo por ser um dos maiores sindicatos do Brasil e da
América Latina, dirigido por PT-CUT e PCdoB-CTB, qualquer crítica é tratada
como “um ataque” e vista sempre como automática auxiliadora da direita. É comum
ouvir comentários tristes e singelos como esse: “votaram na direita e depois querem que o sindicato resolva”. Como
se tudo se resumisse às eleições burguesas – sendo que ninguém sabe ao certo em
quem cada um votou. Como construir alguma luta séria com um debate tão raso e
mesquinho, incapaz, no geral, de fazer surgir pensamento crítico?
Com este tipo de “discussão” não é de
se admirar que se formem apenas rebanhos humanos e currais eleitorais, de bases
mais ou menos perdidas, que oscilam de um lado para outro, em busca de uma
liderança que diga o que se tem que fazer. Um sindicalismo alternativo
necessitaria trabalhar em uma nova perspectiva sindical, não apenas com
formação teórica e política, mas com escuta sincera e diálogo permanente
(aquilo que propõe Paulo Freire, que é sempre muito cultuado, mas quase nunca praticado).
Ou seja, este sindicalismo necessitaria evitar criar novas cunhas e divisões
dentro de cada aparato sindical, mas priorizar a resolução honesta das
divergências que inevitavelmente surgem.
Os congressos, plenárias e instâncias sindicais
são viciados e meramente reprodutivos de práticas típicas de currais eleitorais
que lembram muito o voto a cabresto da República Velha. A militância petista
funciona, portanto, como uma reprodutora da estrutura oficial do Estado, de uma
forma ou de outra, reforçando, assim, o
espírito ordeiro de rebanho. Desta forma, não podemos ver surgir um
sindicalismo crítico, ativo, revolucionário, que enfrente as estruturas; apenas
um questionamento pontual ao que é tolerado pelo próprio sistema.
O petismo nos sindicatos segue a
mesma prática do stalinismo
O PT e Lula falam seguidamente em “democracia”
e muitas vezes condenaram o “socialismo autoritário” (no caso, deveriam chamar
pelo nome correto: stalinismo), contra o que não há nada a se objetar, porque é
muito importante questionar as experiências socialistas autoritárias e
burocráticas; porém, incorre nos mesmíssimos métodos do stalinismo quando está
na direção dos sindicatos: calúnia, trapaças e uso de diplomacia secreta. Abafa
críticas e as ridiculariza, tirando do contexto sempre que preciso – seja uma
crítica que venha de pessoas organizadas em partidos e correntes sindicais ou
não. O petismo não precisa recorrer à repressão física e ao assassinato de
opositores como fez o stalinismo porque existem métodos mais sofisticados,
feitos “democraticamente”; por exemplo: ignorando aqueles que estão “fora da
legalidade sindical” e os “degolando burocraticamente”.
Isso
não quer dizer que o PT não possa sofrer com oposições também desonestas e que exagerem
ou mintam, mas o fato é que não está aberto a ouvir críticas e respondê-las com
sabedoria, sobriedade, mas, sobretudo, com honestidade em reconhecê-las. Parte
do combate das oposições histriônicas e exageradas está em não usar da desonestidade
e omissão, mas enfrentá-las com argumentos e paciência, aprendendo a demonstrar
suas contradições ou mentiras. Contudo, não é assim que age o PT nos
sindicatos, mas as abafa com a mão burocrática do aparato e geralmente coloca
todas as oposições no mesmo “saco de gato”, prestando um desserviço ao
pensamento crítico e à própria construção teórica e formativa da base sindical.
No
CPERS, por exemplo, PT e PCdoB exercem uma tirania burocrática contra todos
aqueles que pretendem militar de forma independente e com consciência de
classe, controlando o aparato através do legalismo, manobrando, sufocando ou
condenando debates que questionem seu projeto de poder e o seu programa. Não
deixa nenhum movimento independente se desenvolver pelo livre debate de ideias,
pois as teme (por mais que jure de pés juntos o oposto).
Essa
contenção do movimento pela força burocrática beneficia a quem? Ora, beneficia
a própria direita e as forças conservadoras, a tradição e a zona de conforto em
torno daquilo que existe – se considerarmos que o bolsonarismo é uma expressão
organizada dessas forças, logo, o petismo o beneficia indiretamente, mesmo dizendo
o oposto. O neofascismo só pode ser
melhor combatido pela diversidade organizada e consciente de si mesma, não pelo
cinismo institucional, que submete tudo à sociedade oficial. Este cinismo, no
geral, tende a facilitar o trabalho do neofascismo,
que sabe se utilizar e dialogar muito bem com ele.
Que postura ter frente ao futuro
governo Lula com um sindicalismo deste tipo?
O
novo mandato de Lula à frente do governo federal contará com medidas de
contenção da crise econômica e social, a exemplo da Argentina, que vive o
aprofundamento de graves problemas econômicos, a inflação descontrolada, cujo
presidente, Alberto Fernandez, não conseguiu enfrentar com os tradicionais
métodos da democracia parlamentar burguesa. O mesmo problema pelo qual passou
Gabriel Boric no Chile, com uma tremenda desvalorização dos salários, bem no
auge do debate sobre a “nova Constituição”.
Os
sindicatos e centrais petistas certamente cumprirão um papel de aprofundar o
controle e a contenção do movimento de massas – ainda que grande parte delas se
coloque embaixo de suas asas de bom grado. Qualquer crítica ao governo Lula,
mesmo aquelas honestas, refletidas e bem fundamentadas, serão tratadas com
rechaço por parte da sua base mais fanática, que dirá se tratar de um
automático apoio à direita. Este tipo de “resposta” não pode contribuir para a
formação de um pensamento sindical e militante crítico e ativo, mas apenas erigir
uma blindagem em torno do governo que serve como cortina de fumaça para deixar
o caminho livre para novos e piores golpes de direita.
Onde
não há criticidade viva, honesta e
ativa, impera a despolitização e a reprodução de rebanho.
O
fato é que existe uma notável correlação entre a educação e a opinião pública
política dos eleitores (sejam nas eleições sindicais ou nas eleições gerais).
Os eleitores menos esclarecidos inclinam-se para soluções irracionais e
fanáticas. A própria estrutura da justiça eleitoral, da cobertura midiática,
dos debates e das pesquisas eleitorais reduzem o debate ao que é aceitável para
o sistema e tudo o que foge à sua lógica é condenado, combatido ou censurado. O mesmo método é utilizado pelo petismo dentro dos sindicatos,
reduzindo a luta sindical centralmente ao calendário eleitoral.
A liberdade política é uma condição de
liberdade humana só porque favorece o desenvolvimento do que é especificamente
humano. A liberdade política numa sociedade alienada, que contribui para a
desumanização do ser-humano, transforma-se em não-liberdade. Um debate sindical
restrito forçosamente às eleições burguesas é um não-debate.
A preferência pela calmaria e
estabilidade do funcionalismo público
O
sindicalismo petista também prefere se enraizar no funcionalismo público, pois
reforça a sua prática legalista. Como é centralmente restrito a este setor
(prática seguida por outros partidos como Psol PSTU, etc.), ignora a
organização e as necessidades dos trabalhadores das empresas privadas, bem como
dos terceirizados e precarizados de todos os setores – vistos, em última
análise, como responsáveis pela sua própria situação.
Ao ter este tipo de estratégia
sindical, acaba por se desconectar das demandas reais da totalidade da classe,
que não está no funcionalismo público. Muitas vezes não sabe criar uma unidade
harmônica entre os diversos segmentos de classe e seus setores, criando
benefícios e privilégios de uns em detrimento de outros. Muitas oposições país
afora – às vezes com métodos corretos, às vezes com métodos incorretos –
alertam as direções petistas desta contradição, mas são ignoradas ou abafadas
(às vezes expulsas dos sindicatos).
A mentalidade média do trabalhador do
funcionalismo público procura uma vida tranquila e sossegada, fechada em si
mesma, que geralmente apenas os governos petistas lhe proporcionam. Por isso,
parte bastante sólida do eleitorado militante petista se encontra aí. Enquanto
que a direita mais raivosa tende a se enfrentar aberta e diretamente contra o
funcionalismo, pregando quase que como uma religião o Estado mínimo e a
privatização de tudo.
Dado os anos de neoliberalismo, de
desarticulação de vínculos trabalhistas, de representação fragmentária de
sindicatos e centrais, o apoio popular e sindical organizado do petismo nos dias de hoje não está mais na classe
trabalhadora, mas no funcionalismo público. Mesmo o bolsonarismo hoje possui um
grande peso no seio da classe trabalhadora – talvez tanto quanto o petismo! Ele
os atinge por outros meios que não a intervenção sindical direta, como por
exemplo, os métodos refinados do neofascismo
de manipulação da psicologia de massas
através da utilização das redes sociais.
Ao não avançar para uma organização
coesa de todos os setores e segmentos da classe trabalhadora – até onde isso é
possível –, acaba por reforçar as pautas e demandas do funcionalismo público,
como se essas refletissem a realidade de toda ela. A culminância disso tudo é a
CUT, que dá preferência às categorias do funcionalismo público e trata secundariamente as categorias do setor privado.
A confusão em relação à estratégia
socialista
Os sindicatos surgiram como uma força
independente na sociedade europeia do século XIX. Só puderam se desenvolver e
conquistar direitos porque se mantiveram nesta condição. Posteriormente, ao
longo do século XX, foram sendo cooptados pelo Estado burguês e sua
institucionalidade. O fascismo italiano abriu um longo caminho que subordinou
totalmente o sindicalismo ao seu Estado, no que foi copiado por Vargas no
Brasil. Todos os governos brasileiros subsequentes mantiveram a mesma
legislação restritiva e subordinadora. O petismo cumpre hoje o mesmo papel regulador
dos sindicatos exercido pelo varguismo no passado, embora com métodos muito
mais refinados.
A força criadora, organizadora e
propulsora do sindicalismo está nesta sua independência do Estado, da sua
legalidade sufocadora, da sua institucionalidade. Sem esta independência, o
sindicalismo se torna, em maior ou menor medida, um simples reprodutor da ordem
vigente.
O
petismo é confuso e dúbio em relação ao socialismo, tanto na esfera política
quanto na esfera sindical. Ao abandonar a estratégia socialista, termina por se
afundar na única legalidade que existe: a burguesa!
Isso não é precisamente uma novidade.
Florestan Fernandes já havia analisado isso em detalhes nos congressos do PT na década de 1990. O petismo não resolveu este problema porque optou por seguir
um caminho de conciliação com o grande capital.
Observemos
algumas citações de Florestan Fernandes tiradas de um livro que reúne suas
principais contribuições aos congressos petistas (Reflexões sobre a construção de um instrumento político, Editora
Expressão Popular, 2019):
“As lições tiradas da ‘crise
do socialismo real’ são equivocadas e perfilham tendências social-democratas,
ou de um ambíguo ‘socialismo democrático’, que condenam as classes
trabalhadoras e os movimentos populares radicais e revolucionários à castração
social-democrática. Nas bases, as manifestações se dispersam, naturalmente,
pela influência quase hegemônica dessas lideranças, todas reformistas, e como
efeito do tipo de organização vertical-horizontal, que eleva demais os
militantes e os quadros por suas categorias e por suas tendências. O ‘petismo
como modo de ser’, ou ‘como estado de espírito’, sofre um esfarelamento,
resultante do modelo organizatório e administrativo mais adequado à
transferência do micropoder para as instâncias dirigentes, dos diversos níveis,
que à articulação ideológica e politicamente unificada das massas”
(página 96).
“No PT prevalece uma
predisposição muito forte por realizações e ganhos relativos na competição pelo
micropoder, o poder pequeno que nasce na estrutura hierárquica do partido e das
probabilidades de mando que ela confere. Há também uma ambição clara de chegar
ao poder institucionalizado, intrínseco à ordem social vigente, o que envolve a
instrumentalização do partido para a satisfação de objetivos pessoais e de
grupos congeniais” (página 95).
“O partido não tenta
aproveitar politicamente as potencialidades do comportamento coletivo e permite
que ele se dissipe nos fins institucionalizados e regulados pela ordem, no
plano da representação e das eleições ritualizadas. Tampouco lhe infunde uma
duração permanente e conteúdos ideológicos contra a ordem, restringindo-se a
colher os frutos das mobilizações mais imediatistas”
(página 97).
“A educação para o
socialismo continua a ser uma esfera pobre e secundária”
(página 85).
“Trata-se não só de
adquirir uma consciência social operária e socialista, mas de eliminar a
alienação social das estruturas mentais e da imaginação política dos
assalariados, moldadas pelo capital. Por fim, é preciso inseri-los na luta
política, salientando suas duas faces: a corporativa e ‘economicista’, e aquela
que, a médio e longo prazos, enfatiza a perspectiva do poder e do que fazer com
o Estado. É atribuição do partido produzir e difundir entre os militantes da
causa operária uma visão teórica e prática desse processo multiforme, fator sem o qual a luta pelo poder se dissolve nas
fricções e entrechoques do dia a dia” (página 74).
Florestan
Fernandes, assim como muitos ex-militantes petistas, alertou para os problemas
decorrentes do curso que o petismo estava tomando. Até hoje as advertências
inconvenientes são ignoradas. O resultado não pode ser diferente. Talvez
veremos daqui por diante apenas uma trégua com a direita neofascista, que conhecendo e surfando em todas essas contradições
petistas, recuperará a força e criará as condições para alijar o petismo do
poder novamente, já que ele não pode ser derrotado pela prática política do PT.
***
Em síntese, para o petismo a luta sindical
é tolerada enquanto não se choque com as estruturas institucionais da sociedade
“democrática”. Isto é: enquanto a luta não sai do grito ordeiro, de cima da
calçada, preferencialmente, pode ser tolerada e até “admirada”, mas no momento
que questiona algum tipo de institucionalidade a luta passa a ser atacada pela
burocracia sindical muitas vezes tão ou mais virulentamente do que a própria
direita.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023
A pauta tributária do novo Congresso
Publicado originalmente em: https://knigaeconomiapolitica.blogspot.com
Espetáculo por espetáculo, qual foi o maior e mais impactante: a posse de Lula dia 1º de janeiro de 2023 ou o vandalismo da turba bolsonarista dia 8? Só a história responderá. Neste cenário de dissonâncias cognitivas: um fala branco outro fala preto, uns fazem balanço positivo, outros negativo, alguns dizem que Lula 3 sai fortalecido, outros acham que o governo foi golpeado e se enfraqueceu. Alguns acham que a democracia venceu, saiu fortalecida, outros acham que o governo seguirá refém do bolsonarismo (denominação genérica para as forças de direita).
O espetáculo da posse recheado de mensagens pacificadoras, integradoras e inclusivas foi ofuscado pelo espetáculo do quebra-quebra no domingo seguinte. Na margem de tempo de uma semana ficou evidenciado o antagonismo entre as classes na sociedade capitalista. Embora petistas e bolsonaristas não compartilhem de que no capitalismo prevaleça a divisão de classes: petistas olham para as desigualdades promovidas pelo sistema e com visão romântica das contradições do capitalismo, pensam que podem erradicá-la com harmonização de interesses. Já os bolsonaristas só enxergam o apocalipse.
Em 1º de fevereiro tomaram posse os novos parlamentares e na mesma data elegeram a mesa diretora das duas casas que compõem o Congresso. Da mesma forma que o atual vice-presidente Geraldo Alckmin, os senhores Arthur Lira (Progressistas – AL) e Rodrigo Pacheco (PSD – MG), respectivamente presidente da Câmara de Deputados e Senado, se converteram em companheiros. O processo eleitoral de ambos seguiu os ritos habituais: troca de cargos. A gestão Lula 3 reitera o fisiologismo e o cretinismo parlamentar. Por trás de uma retórica inflamada aos eleitores, o modus operandi nos bastidores se repete e perdura.
Por isso, não constitui surpresa que no caso da eleição de Lira para a Câmara dos Deputados tenha ocorrido um rendez-vous (tradução: regabofe) à altura do cretinismo parlamentar que acomete os partidos, tanto os da situação, como os da oposição (em alternância de poder). O jornal O Globo em sua edição de 28 de janeiro de 2023, página 8, informou que no dia 26 uma quinta feira a noite, em jantar para promover a eleição de Arthur Lira à presidência da Câmara compareceram, dentre outros comensais, os ministros petistas Luiz Marinho (Trabalho) e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário); o governador de São Paulo Tarcísio Freitas (Republicanos); e os seguintes deputados federais, pelo PSOL – SP Guilherme Boulos e Erika Hilton; pelo Republicanos – SP o também Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus Marcos Pereira, pelo PT – RS Maria do Rosário, a cônjuge do senador Sérgio Moro a deputada pelo União de SP Rosângela Moro e o filho de Jair Bolsonaro o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL – SP).
Interessa-nos, todavia, a pauta econômica inicial da nova legislatura. No Congresso Nacional a equipe econômica pretende pautar a reforma tributária. Embora exista várias propostas na mesa de ambas as casas legislativas, há expectativa de qual deles será abraçado pelo governo. No entanto, com base em declarações à imprensa tanto do presidente da Câmara dos deputados, como da equipe econômica, a prioridade é iniciar por uma ampla e radical reformulação dos impostos que incidem sobre o consumo. Aqueles que incidem sobre a renda e a propriedade ficariam para depois. Ou seja, o que poderia favorecer os trabalhadores fica para depois. A urgência em alterar o caráter regressivo da nossa política tributária (quem ganha menos acaba pagando mais imposto) fica adiada.
Por esse motivo existe um consenso entre as elites por onde começar a reforma. O governo dessa forma irá contrariar os interesses populares. A reformulação das bases de arrecadação dos impostos no Brasil deveria ser iniciada pela renda e propriedade. Exatamente onde os desfavorecidos são mais prejudicados. Três medidas podem e devem ser encaminhadas: a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, a revogação da isenção nos lucros e dividendos e o voto de qualidade no CARF.
GRANDES FORTUNAS
Os trabalhadores não podem se deixar contaminar pelo cinismo e desfaçatez dos parlamentares, ministros e demais representantes do capital. O imposto sobre grandes fortunas não demanda votação ou debate. Já está aprovado, é lei constitucional. Como está prescrito pela Constituição Federal artigo 153 inciso VII, aqui citado em sequência: “Compete à União instituir impostos sobre grandes fortunas, nos termos de lei complementar”. Consequentemente cumpre de modo simples regulamentar a lei. Dada uma terceira oportunidade a Lula e uma quinta ao PT, que eles não se façam de rogados e, ao contrário dos mandatos anteriores, promovam a regulamentação da lei e mobilizem por sua aprovação.
LUCROS E DIVIDENDOS
Fernando Henrique Cardoso em seu primeiro mandato isentou de imposto de renda os lucros e dividendos em uma lei geral que trata de outros assuntos. Desnecessário perder tempo com nova legislação. Um passo inicial e simples é revogar o artigo 10º da Lei 9.249, de 26 de dezembro de 1995 que altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências: “Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior”. A manutenção desse dispositivo lesa os cofres públicos. Sua revogação deve ser encampada pelo movimento popular e contra a vontade de uma maioria de deputados e senadores impor uma vitória aos interesses populares.
CARF
A Medida Provisória 1.160, de 2023, cuja ementa: “Dispõe sobre a proclamação do resultado do julgamento, na hipótese de empate na votação no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, e sobre a conformidade tributária no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda e altera a Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020, para dispor sobre o contencioso administrativo fiscal de baixa complexidade.”. Nem reforma, nem extingui o CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Diante disso nos resta defender sua aprovação apesar da timidez com que trata do problema crônico da sonegação de impostos. O montante é assustador até junho de 2022, as dívidas no Conselho chegavam a R$1 trilhão, que somados aos R$216 bilhões em litígio nas Delegacias de Julgamento da Receita Federal chegam ao total de R$ 1,216 trilhão. Só nos dois anos que antecederam a mudança sobre o voto de qualidade (voto de minerva do presidente do Conselho, um auditor fiscal), 2018 e 2019, foram arrecadados R$ 142,15 bilhões. Prova de que dinheiro há e muito. O Conselho é controlado pelas confederações empresariais que indicam metade dos julgadores, a outra metade é composta por auditores. No entanto, quando o governo perde, a decisão possui caráter terminativo, quando os empresários perdem podem recorrer ao Judiciário. Entre a disputa nos órgãos da Receita Federal e no Judiciário o tempo médio é superior a 15 anos. Tal o descalabro em sua permanência e rotina de atuação que não somos os únicos a denunciar a existência do órgão e propor seu fim: “O CARF controlado pelas corporações empresariais não é uma instituição republicana! É um esbulho patrimonialista com raízes nas oligarquias do Império. Pelo fim imediato do CARF! (cf. Ricardo Fagundes da Silveira – Auditor Fiscal da Receita Federal e Membro do Conselho Deliberativo do Instituto Justiça Fiscal e Wilson Luiz Müller – Integrante do Coletivo Auditores Fiscais pela Democratização – AFD https://jornalggn.com.br/crise/carf-o-estouro-da-maior-boiada-de-bolsonaro/ )
Os trabalhadores não têm a oportunidade de recusar pagamento ou questioná-lo pois são tributados na fonte ou no momento do consumo. O mesmo deve ocorrer com a patronal. Se houvesse honestidade entre os grandes empresários, a proposta de retomada do voto de qualidade no CARF não teria sido repudiada. E ao Ministro da Fazenda não deveria ser dada agenda para que sonegadores fossem recebidos presencialmente como ocorreu dia 1º de fevereiro. O objetivo dos sonegadores é barrar a medida, que por ser provisória, depende de aprovação do Congresso. Os R$ 50 bilhões previstos podem virar pó. Compete aos gestores governamentais não negociar nenhum acordo e fazer valer o interesse popular, executar as dívidas que alcançam a cifra de R$ 1,216 trilhão e destinar o recurso para o bem-estar social. O Congresso deve votar a medida provisória como ela foi elaborada.
segunda-feira, 30 de janeiro de 2023
Não existe amor em SP
domingo, 15 de janeiro de 2023
Língua viva!
Como pode boca fria
no entrave entre as línguas
Ser prática mecanizada?
Como pode?
A linguística sendo mordiscada
Em destroços seus pedaços caem conforme avança
A lingua é viva, mas nem por isso
Merecia ser violada
A língua pode ser tida como burguesa
E nem por isso, assassinada
A burguesia ainda é louvada com praticas veladas e outras escancaradas
Palavras com poder, ao invés de significadas e voarem
São jogadas no lixo
Palavras ao vento
Trazer à consciência processo dolorido
Enquanto a violência come em baixo do teto das casas
Palavras vão para lixeira
Novas formas de opressão
Que não trazem solução aos antigos problemas
Novas embalagens, novas faces
O mesmo grude verde vômito
Solução apresentada:
oportunidade pra alguns;
fome e exploração a todos!
Igualdade, sem justiça
Sistema e barbárie
Salve a língua
Salve, salve!
Que ainda pode ser utilizada contra o sistema
Salvem as ferramentas que desconstroem ideias
Se com as palavras demonstrar a prisão já é difícil, sem elas?
Como expressar? Como demonstrar?
Que modificar a língua importa, sim. Mas não derruba a burguesia por si só?
Como demonstrar que o debate poderá fortalecer? Como te dizer? Ou melhor como te mostrar?
Se as palavras andam tão esvaziadas?
Vamos ressignificar? Mostrar na prática...
Passando adiante ferramenta que auxilia na luta proletária
Rafaela Lima