quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Medo de voar e o verdadeiro sexo frágil

No livro Medo de Voar, da escritora norte-americana, Erica Jong, publicado em 1973, podemos encontrar uma série de reflexões riquíssimas sobre casamento, monogamia e relações humanas (dentre outras não menos importantes). Nele, a personagem principal se encontra dividida entre o amor por dois homens diferentes que sabem estar em um triângulo amoroso e numa espécie de "relacionamento aberto" — elemento constitutivo dos relacionamentos modernos, embora ainda pouco explorado pelos romances. Ela também aborda, de uma forma inusitada e profunda, a questão da impotência masculina.

Por exemplo: "a humilhação sexista suprema: o cacete que se deita. A arma suprema, na guerra entre os sexos: o cacete mole. A bandeira do inimigo: o cacete a meio-pau. O símbolo do apocalipse: o cacete de ogiva atômica que destrói a si mesmo. Era essa a desigualdade básica que nunca poderia ser consertada: não que o homem fosse dono de uma atração maravilhosa a mais, chamada pênis, mas que a mulher era dotada de uma pomba maravilhosa, enfrentando qualquer tempo. Nem tempestade, nem granizo, nem escuridão da noite conseguiam intimidá-la. Estava sempre ali, sempre pronta. Coisa das mais apavorantes, quando se pensa bem. Não admira que os homens odiassem as mulheres. Não admira que tenham inventado o mito da insuficiência feminina".

Isso explica muito sobre a nossa sociedade patriarcal e fálica (e sobre o bolsonarismo em particular). O dinheiro, o cartão de crédito, a casa luxuosa, o acelerador do carro são os compensadores da frustração sexual não reconhecida e sequer refletida na consciência. Como o prazer não vem dos "canais naturais", resta buscá-lo na compensação da riqueza material, no ódio sadomasoquista, na humilhação do outro, na raiva despejada incontidamente (na política, nos colegas de trabalho, nos vizinhos, na suposta "inferioridade" social dos outros).

Na verdade, Jong aponta que a potência sexual está com a mulher (o suposto "sexo frágil"); e não com o homem. Ela afirma: "Nem tempestade, nem granizo, nem escuridão da noite conseguiam intimidá-la". Tal alusão à disposição sexual da mulher em comparação a do homem deixa bem claro que este é o verdadeiro e único sexo frágil, que sofre com todo tipo de intimidações que tenham reflexos sobre o desempenho do seu cacete a meio-pau.

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