Dois escritores abordam as tendências modernas da transnacionalização do capital e do enfraquecimento do Estado-Nação. São eles: João Bernardo, no livro Transnacionalização do capital e fragmentação dos trabalhadores; e Pepe Escobar, no livro 21: o século da Ásia. Em um exercício de "futurologia", podemos estabelecer uma perspectiva comparada sobre o que trazem os dois autores acerca deste tema nas suas obras, tentando traçar o que há de semelhante e o que há de diferente. O denominador comum entre ambas pode nos revelar o que a realidade reflete corretamente no pensamento dos dois autores.
O escritor português, João Bernardo, nos afirma que torna-se cada vez mais patente o surgimento do que ele denominou de "Estado amplo"; isto é, uma estrutura social, política e econômica hegemonizada pelos monopólios e trustes internacionais, que não reconhecem os limites das fronteiras e legislações nacionais, em contraposição ao que ele chamou de "Estado restrito", que é o Estado "tradicional", com suas instituições políticas circunscritas ao território nacional, mas subordinadas e dependentes deste poder econômico superior. Assim, ocorre aquele fenômeno bizarro onde uma empresa transnacional tem um PIB maior do que um Estado nacional, como é, por exemplo, o caso da GM em comparação à Bolívia.
Pepe Escobar, por sua vez, traz a análise do economista irlandês Hamish McRae, que enumera uma série de desdobramentos básicos deste crescimento das transnacionais sobre o mercado mundial e a relação entre os países: "1) enfraquecimento da Nação-Estado; 2) emergência de organismos supranacionais, como a União Europeia, a APEC, a ASEAN, o Mercosul; 3) emergência de poderes regionais em detrimento do poder central, como, por exemplo, Sul da China, Catalunha, norte da Itália, o Estado de São Paulo; 4) mercados financeiros determinando política fiscal e monetária para quase todos os países do mundo; 5) limitação cada vez maior de políticas domésticas protecionistas que atrapalhem a panacéia mundial do livre comércio; 6) dominação de multinacionais que baseiam seus investimentos em isenção de impostos — o que limita a liberdade de governos de arrecadar impostos de empresas estrangeiras; 7) mobilidade cada vez maior de talentos top em business, entertainment e serviços financeiros: ou seja, governos cada vez mais devem competir por talentos".
Algumas conclusões: vivemos a época da hegemonia do mercado internacional sobre o poder da Nação-Estado (com a exceção pontual dos países imperialistas). Isso tem reflexos avassaladores sobre toda a política revolucionária e aumenta descomunalmente a importância da associação internacional da classe trabalhadora. A agitação, propaganda e os debates teóricos e práticos deveriam refletir esta nova etapa de "desenvolvimento" do capital, mas a "esquerda", ao contrário, continua com o seu ramerrão oportunista e/ou doutrinário. Em termos comparativos, os pontos 4 e 5 harmonizam-se com a análise de João Bernardo sobre a "restrição do Estado" (ou a consolidação do "Estado restrito") e o ponto 6 traz a definição do que é o "Estado amplo", que é, como foi dito, completamente ignorado pela "esquerda" e pelas reivindicações do movimento sindical.
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