segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

A encenação da vacina

João Dória e o governo Bolsonaro transformaram a aprovação da utilização da vacina contra o corona vírus pela Anvisa num episódio burlesco e deprimente. O tucano "independente", que tem projeto personalista, nitidamente transforma as declarações oficiais do lançamento da vacina num palanque eleitoral com vistas a 2022; enquanto o ministro da saúde bolsonarista, o "general" Pazuello, retruca afirmando se tratar de declarações "politizadas acerca de questões de saúde pública", denunciando que o governo de São Paulo omitiu inúmeras informações do apoio dado pelo seu ministério e pelo SUS à fabricação da vacina.

Com uma apresentação teatral, copiada descaradamente do governo britânico, o governador de São Paulo dá um passo adiante nesta disputa quando diz que enviará para Manaus 50 mil vacinas à reveria do ministério da saúde que, segundo ele, é inconfiável. Ou seja, desacata a hierarquia institucional do país como forma de luta política. Para isso, evidentemente, se utiliza do poderio econômico paulista, que sempre foi uma força autônoma no Brasil.
Dória tem se vendido como um gestor responsável, que "escuta a ciência", querendo se colocar contra o obscurantismo bolsonarista. Vai capitalizando, com a ajuda política petista, o desgaste do governo Bolsonaro. Para Tarso Genro, por exemplo, é João Dória que tem que liderar a luta pelo impeachment do atual governo federal (fala isso sem nenhuma vergonha; ao contrário: vende essa capitulação, que custará muito caro à classe trabalhadora, como política "realista" e "responsável").
Aí está se revelando, na prática, o que significa a palavra de ordem "Fora Bolsonaro" sem correlação de forças. O restante da "esquerda" nada faz em relação a esse teatro mórbido. Apenas reproduz, em essência, a política apresentada por Dória (Vacina já!), não desmascara a postura oportunista do governador paulista, nem do petismo, reforçando direta ou indiretamente o "Fora Bolsonaro" e o "Viva Dória!".
Assim, o ciclo segue seu curso: se cai o neofascismo bolsonarista, o poder é ocupado pela burguesia "democrática", que vai seguir com todo o seu programa econômico neoliberal de uberização e de sustentação do agronegócio, mas com o discurso demagógico de "respeito à ciência", "contra o obscurantismo", em defesa do "liberalismo" à brasileira. A classe trabalhadora, em todos os cenários, perde. E o pior não é perder: é não ter perspectiva, nem programa com as organizações de "esquerda" que aí estão.

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