segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Um retrato das eleições municipais de 2020

O debate eleitoral dos candidatos à prefeitura de Porto Alegre foi pobre e patético. Cheio de hipocrisias, jargões vazios, meias verdades e mentiras completas (dentro das regras da mídia burguesa, que são viciadas, limitam e condicionam). Um grenal acéfalo em que a estrutura não só não é questionada, como sai fortalecida. É a velha política e a hipocrisia institucional falando pela boca de todos os candidatos. Nada de bom, honesto e sadio pode vir disso...

Vale lembrar Paulo Freire e a sua Pedagogia do Oprimido: "esteja todo o dia aberto para o mundo, esteja pronto para pensar; esteja todo dia pronto a não aceitar o que se diz, simplesmente por ser dito; esteja predisposto a reler o que foi lido; dia após dia, investigue, questione e duvide. Creio que o mais necessário é duvidar. Creio sempre necessário não ter certeza, isto é, não estar excessivamente certo de 'certezas'".

E candidatos e "apoiadores" estão lamentavelmente cheio de certezas obtusas, todos ajudando a embelezar o lixo e a hipocrisia, indo direto pro abismo da institucionalidade burguesa e gritando que "estamos certos"!

A "esquerda" entra, inclusive, no jogo viciado do tipo de debate proposto pela RBS/Band, que limita e condiciona qualquer reflexão séria. Deixam o papel de "questionar" este limites viciados pra um oportunista e carreirista incorrigível como Rodrigo Maroni (PROS), que critica a ZH no ar e a "esquerda" bem quietinha e conivente com a farsa toda.

Duas formas de manipulação eleitoral descarada, tratadas como absolutamente normal (ambas deveriam ser expressamente proibidas):
1) Pesquisa eleitoral: como isso pode ser tratado como normal (ainda mais quando levamos em consideração que houve uma CPI sobre isso abafada no Congresso Nacional)?
2) Cabos eleitorais pagos: como condescender que candidatos "comprem" militância, ignorando que eles não o fazem por consciência e convencimento, mas por necessidades materiais geradas pelo próprio sistema que os candidatos e partidos que eles fazem campanha sustentam?
PS: e a "esquerda" obviamente acha tudo isso normal...

Perguntas importantes sobre as eleições municipais:
1.
Quem ganha com as eleições municipais? Ou melhor: quem se fortalece com as ilusões oriundas das eleições municipais?
2.
Manobra interessante a do MDB. Dá pra ver que conhece bem os meandros da institucionalidade burguesa: joga com a propaganda e as pesquisas eleitorais (e, talvez, com a fraude, por que não?). O mesmo fez Eduardo Paes (MDB) no Rio. Representam o "velho" disfarçado de "novo". As ilusões eleitorais abrem tais possibilidades. A questão é: até quando vamos acompanhar esta novela?
3.
Muito "fora Marchezan" (PSDB) e "fora Crivella" (Republicanos) se gritou, mas os negociadores profissionais sempre sabem usar a institucionalidade e as suas ilusões. Aqui Marchezan "saiu", mas entrou na disputa Melo (MDB), que vai defender o mesmo programa do antecessor. Que responsabilidades há em relação a aqueles que plantaram e plantam ilusões na institucionalidade que abre a possibilidade de vender o "velho" como "novo"?
4.
Que responsabilidades há para aqueles que, ao longo dos quatro anos passados gritaram "fora Marchezan", mas silenciaram em relação aos visíveis problemas da institucionalidade burguesa? Devemos nos preparar já para o futuro "Fora Melo" caso não ganhe Manuela (PCdoB/PT)? Até quando? Nada estaria errado na nossa atuação? Basta só seguir fazendo o mesmo de sempre?
5.
Até que ponto as candidaturas de "esquerda" tem se enfrentado com o sistema? Para João Bernardo, escritor do livro, A transnacionalização do capital, torna-se cada vez mais patente o surgimento do que ele chama de um “Estado amplo”, controlado pelos monopólios e trustes internacionais, que não reconhecem os limites das fronteiras e legislações nacionais, estaduais e municipais em contraposição ao que ele chamou de “Estado restrito”, que é o Estado “tradicional”, com suas instituições políticas circunscritas ao seu território, mas subordinadas e dependentes deste poder econômico superior.
6.
Nesse caso: elegemos "representantes" e legislamos no Congresso Nacional, nas Assembleias Estaduais e nas Câmaras de Vereadores para quê, uma vez que o poder do "Estado amplo" (dos monopólios de mercado) asfixia e torna inócua toda a legislação que limite seu poder? (basta ver a situação das multinacionais frente ao governo do Estado — se falamos em cobrar os impostos devidos elas ameaçam ir embora e o governo aceita tudo quietinho).
7.
Qual dos partidos de "esquerda" que elegeram representantes se enfrentam com o poder deste "Estado amplo"? Até onde transformaram o identitarismo apenas em uma nova forma de renovar ilusões? Se "só a luta muda a vida", conforme atesta o jargão repetido quase unanimemente pela "esquerda", como e contra o quê especificamente vamos lutar? Os mandatos parlamentares conseguidos nas eleições de ontem vão combater ou reforçar a institucionalidade e as ilusões que sustentam o "Estado amplo"?
8.
Em São Paulo ocorreu um fenômeno interessante, ainda que bastante incipiente: o Psol foi ao segundo turno contra a velha elite paulistana! Boulos tem grande capacidade argumentativa, o que é, sem dúvida, importante, embora também se restrinja aos limites da institucionalidade burguesa. Fala muito, tal como Lula em 2002, de "esperança". Para o artista e apresentador Antônio Abujamra, "a esperança matou esse país". Boulos avançará contra o "Estado amplo" ou governará reforçando a esperança na institucionalidade atual?

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