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Os presidentes norte-americanos Jimmy Carter e Richard Nixon olham sorridentes para Deng Xiaoping |
Todas as nossas
definições sobre “socialismo” e “comunismo” esbarram num problema da maior
gravidade e interesse: a prática!
Como estes sistemas econômicos representam o futuro e o novo, não temos
receitas de bolo ou mapas que possam nos dizer: “chegamos” ou “está feito”!
Existem inúmeras polêmicas a respeito de tais termos que são, é claro,
utilizados indevidamente pela burguesia e os seus ideólogos para aprofundar a
confusão e a incerteza. É por isso que todo e qualquer tipo de dogmatismo
termina por dificultar ainda mais a nossa missão, que é ajudar os trabalhadores
e as trabalhadoras a vencerem a burguesia e a construírem o socialismo – que,
genericamente falando, sabemos ser a “fase inferior” do comunismo.
Nesse terreno pantanoso das dúvidas e das incertezas não
devemos ter medo, mas olhar confiantes o futuro, tal como os pioneiros, que são
aqueles que puxam o fio condutor da história! Revisitar as palavras da grande
economista chinesa Pao-Yu Ching é fundamental: “não afirmamos que Marx ou os marxistas conhecem o caminho para o
socialismo completamente. Isso não faz sentido. Sabemos a direção desse
caminho, sabemos quais forças de classes dirigem ao longo do caminho, mas de
maneira concreta e prática, isso será aprendido com as experiências das milhões
de pessoas que assumirem essa tarefa”[i].
Ou seja, ainda que nesta jornada humana a teoria seja
fundamental, devemos ter como principal medidor (termômetro e bússola) “a
experiência de milhões de pessoas que assumirem essa tarefa”. As revoluções do
século XX foram e são os principais medidores deste processo, pois representam
dolorosas experiências das quais devemos extrair todas as lições possíveis; e,
dentre estas, cabe destacar a experiência empreendida por milhões de
trabalhadores e camponeses chineses, que nos forneceram – muitos com a própria
vida – uma riquíssima experiência teórica e prática que devemos examinar com
todo o interesse de um cientista.
Justamente por não termos nenhuma receita de bolo, a
despeito de toda a teoria socialista – sobretudo os clássicos marxistas (Marx, Engels, Lenin, Trotsky, Rosa Luxemburgo,
dentre outros e outras) –, temos que nos esforçar para avançar sozinhos. Esta é
a quota de sacrifício que nos cabe nesta construção histórica. Repetir
afirmações passadas de forma dogmática e vazia de nada nos ajudará, senão que
prolongará a agonia e as tentativas vãs. Portanto, temos que apreender
dialeticamente os detalhes e as evidências que a realidade nos traz nos dias
atuais, passadas as dolorosas e importantes experiências do século XX, olhando
firmemente para os desafios e as novidades do século XXI.
Dentre estas experiências atuais destaca-se a economia
chinesa e a sua ascensão mundial, que traz uma série de fenômenos não
analisados e homericamente ignorados pela “esquerda” brasileira, que a enxerga
com as lentes um tanto embaçadas do século XX (ou, então, a idealiza infantil e
perigosamente). Por exemplo: grande parte dela entende “socialismo” como a
aplicação esquemática de planos quinquenais e despreza qualquer outro caminho
como “desvio burguês”. Joga-se fora não apenas as próprias experiências
revolucionárias de milhões de pessoas que assumiram a tarefa de edificação
socialista no século XX, mas os próprios indícios da prática atual, que deve
ser sempre a nossa principal guia.
Quando falamos da China contemporânea, o debate resume-se a
saber se ela é capitalista e imperialista ou “socialista”. Uma vez que se chega
a alguma conclusão, cola-se o rótulo, fica-se de bem com a própria consciência,
e ignora-se toda a trajetória revolucionária e as principais lições deste
processo, concordemos com ele ou não. Por acaso todo este processo, que envolve
e envolveu milhões de pessoas, não teria nada a acrescentar na nossa luta pela
construção socialista, mesmo que o consideremos como um equívoco ou uma
traição?
A teoria marxista nos deixou um norte importante, que aponta o comunismo como a fase superior e o
socialismo como “a fase inferior do comunismo”. É consenso entre a esquerda
revolucionária e os intelectuais honestos que nunca existiu socialismo sobre a
face da Terra, justamente porque o mercado mundial sempre foi dominado pelos
países imperialistas e o capitalismo nunca teve sua espinha dorsal quebrada. Um
país solitariamente não pode atingir o socialismo – esta foi uma das principais
conclusões práticas das polêmicas entre o stalinismo e o trotskismo no seio da
União Soviética (URSS), comprovadas pela história.
Com mais razão ainda podemos afirmar que jamais existiu
comunismo, pois este é caracterizado por dar fim às classes sociais e ao
Estado. Este seria o norte máximo do sistema comunista. Para atingi-lo, seria
necessário passar por sua “fase inferior”, o socialismo, levando à emancipação
dos trabalhadores e a construção das condições materiais desta emancipação a
partir do controle operário da produção e de um governo revolucionário que
prepararia sua própria dissolução. Entre o capitalismo – isto é, a sociedade
atual, com suas distintas realidades nacionais – e o comunismo, existe um
emaranhado de incertezas e confusões que, nas palavras de Lenin, exigirá uma
série de formações econômicas mistas.
No percurso desse processo histórico as forças produtivas devem se desenvolver,
superando o atual estágio do seu desenvolvimento.
1) O mercado mundial como encarnação do sistema capitalista
O capitalismo é um sistema econômico mundial, que hoje
estende suas raízes por todos os países e regiões. Possui um centro e
periferias em uma totalidade
interligada que não pode ser nunca esquecida. Grande parte da noção do
internacionalismo proletário desenvolvido pelo marxismo provém desta
compreensão. Nem sempre ele foi assim. Atingiu esse grau de maturidade ao longo
de sua transformação de capitalismo comercial (ou mercantilismo) em capitalismo
industrial, quando os mercados regionais e nacionais começaram a interligar-se
dando origem ao mercado mundial.
Marx
escreveu em O capital que “a circulação de mercadorias é o ponto de
partida do capital. A produção de mercadorias e o comércio, forma desenvolvida
da circulação de mercadorias, constituem as condições históricas que dão origem
ao capital. O comércio e o mercado mundiais inauguram no século XVI a moderna
história do capital”[ii].
Marx apontará ainda que somente no mercado mundial adquire o dinheiro
plenamente o caráter de mercadoria. Assim sendo, a “alma” do capitalismo é
produzir para o mercado. O papel histórico progressista do sistema capitalista,
bem como sua “missão” histórica, foi unificar as distintas regiões do planeta
em torno do mercado mundial. Isso, como sabemos, foi feito com profundas e
graves contradições que custaram (e ainda custam!) inúmeras vidas humanas.
Lenin,
por sua vez, apontou que “o capitalismo
não pode existir nem se desenvolver sem estender sempre o âmbito do seu domínio,
sem colonizar novos países, sem inserir no turbilhão da economia mundial velhos
países não-capitalistas”[iii].
E salienta “a existência de uma
divisão mundial do trabalho, já constituída, e de um mercado mundial, graças a
que as colônias podem se especializar na produção maciça de produtos agrícolas,
recebendo, em troca, produtos industriais acabados ‘que, em outras condições,
teriam de fabricar”[iv].
Ou seja, os países imperialistas vão modelando e remodelando as diversas
regiões do mundo e dominando-as política, econômica e militarmente (se
necessário for).
Deste
modo, dentro do mercado mundial nenhuma economia está desconectada da outra. O
centro comanda as periferias e umas se desenvolvem em detrimento de outras.
Isso explica, em parte, porque a elite brasileira procura “enxugar os gastos
públicos” do Estado para poder subsidiar a produção do seu setor
agro-exportador ou dos monopólios industriais e comerciais que aqui operam.
Para “atrair capital” joga as taxas de juros para a estratosfera e busca vender
os recursos naturais do país (incluso a força de trabalho do povo) pelo preço
mais barato possível. Evidentemente que o colapso de economias periféricas tem
menos peso na engrenagem mundial do sistema do que as economias centrais (vide
a crise de 2008), mas não podemos pensar o desenvolvimento do socialismo, por
exemplo, dissociado dessa relação com o mercado mundial. A não ser, é claro,
que joguemos fora a compreensão marxista de que o socialismo deve surgir das
contradições internas do próprio capitalismo, trabalhando para superá-las e
levar o desenvolvimento das forças produtivas a um estágio superior.
A
medida de isolar do mercado mundial e criar embargos econômicos aos países que
passam por processos revolucionários é uma ação consciente do imperialismo no
sentido de contê-los e asfixiá-los, matando o “germe da rebeldia” na raiz e
impedindo que se espalhe para todo o corpo. As revoluções daqui para frente não
podem mais perder de vista esta compreensão. Tampouco devem se satisfazer com o
auto isolamento, como fizeram as burocracias stalinista soviética e chinesa
(até 1978), o que significa um suicídio. Também não devem “vender a alma” para
permanecer no mercado mundial, tal como fez a última após 1978.
Partindo
da experiência chinesa, devemos tirar as lições de todo o processo e buscar uma
política justa que encontre um equilíbrio entre todas estas disjuntivas.
2) A abertura econômica da China ao mercado mundial: “socialismo
de mercado” ou capitalismo de Estado?
É dentro de uma lógica binária de “totalmente bom versus totalmente mal” que grande parte
da “esquerda” brasileira e mundial analisa a política de abertura do Partido Comunista Chinês (PCC) ao mercado mundial. Muitos “trotskistas” e outros tantos “comunistas”
(sobretudo os stalinistas), por olharem a realidade pelo prisma binário,
desconsideram totalmente as lições da política de abertura de Deng Xiaoping,
sem separar o joio do trigo, porque no início o principal beneficiário desta
política foi o imperialismo estadunidense. Por se tratar de uma burocracia stalinista,
simplesmente colocam um rótulo e deixam de agir como cientistas sociais, que
aproveitam as boas oportunidades – mesmo que não concordemos com as políticas
que analisamos – para extrair todas as lições possíveis. Outros tantos, por
verem que a burocracia chinesa encontrou-se em maus lençóis, tendo que
abandonar certos preceitos “socialistas” e, consequentemente, frustrando seu
“revolucionarismo”, acabam, também, por jogar tudo fora.
As
“reformas” de Deng Xiaoping possuem méritos e defeitos. Os últimos são maiores
do que os primeiros, mas não quer dizer que os primeiros não existam. Há um certo parentesco entre as reformas de
Deng e a Nova Política Econômica (NEP, na sigla em russo) proposta pelos
bolcheviques após o final da guerra civil de 1919-1921. Há, também, perigosas
diferenças que pretende-se analisar a seguir.
O pensamento corrente entre a esquerda brasileira e de
grande parte dos intelectuais burgueses é que “socialismo” é sinônimo exclusivo
de planos quinquenais; isto é: que “para ser socialista” a economia deve ser
exclusivamente planificada, seja pra sempre ou por um tempo determinado (no
caso soviético, em planos que abrangiam 5 anos). Nos planos quinquenais se
determinavam as metas, por setor econômico, do que seria investido e o do que
seria produzido. Na URSS stalinista se considerava crime contra o Estado o não
cumprimento das metas de produção estabelecidas. Ainda que a planificação
econômica seja fundamental e indispensável para uma economia socialista, ela
não é o único instrumento e, em muitos casos, não deve ser o principal –
sobretudo se levarmos em consideração a forma como a burocracia stalinista
entendia a aplicação de tais planos. Em todos os casos, a planificação não pode
sufocar completamente o mercado.
Há
que se ter um certo equilíbrio dependendo do nível de desenvolvimento econômico
de cada país e região. O mercado é um mecanismo econômico
importante que pode ser assimilado por uma economia socialista, principalmente
na sua fase inicial. O “mercado socialista”, é claro, deve ser regulamentado e
controlado – ou seja, o oposto do que o capitalismo neoliberal professa,
inclusive através das armas e invasões militares. Como já foi analisado no
texto A ascensão mundial da China,
não é isso que acontece no país de Deng Xiaoping, marcado por um capitalismo de Estado. Falar em “mercado
socialista”, portanto, pressupõe a tomada do poder pelos trabalhadores em
diversos países e a transformação do mercado mundial, pelo menos em uma grande
parte dele, em “mercado socialista” – levando-se em consideração também outros
critérios, como o controle operário da produção, as instituições políticas e
econômicas, etc. Socialismo jamais pode ser considerado apenas do ponto de
vista da planificação, pois Japão e Coréia do Sul planificam e planejam suas
economias sem serem países socialistas.
De
qualquer forma, é fundamental compreender a experiência econômica chinesa
desencadeada pelas reformas de Deng Xiaoping – chamada eufemisticamente de
“socialismo com características chinesas” – para poder desmistificá-la e
incorporar suas lições positivas e progressistas à luta e ao programa do
proletariado mundial, visando enriquecer a teoria socialista. Dois perigos
ameaçam atualmente o processo chinês: a burocracia stalinista à frente do poder
– com métodos políticos burocráticos e paternalistas que impedem a emancipação
dos trabalhadores – e o agudo aumento das desigualdades sociais; ambos podem
preparar o caminho para a retomada plena do poder político por parte do
imperialismo Ocidental, fato que ainda não ocorreu.
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Mineiros chineses retratados pelo artista Liu Xiaodong |
3) Pontos positivos e negativos da abertura proposta
por Deng Xiaoping
É consenso entre os historiadores que nos primeiros anos
após a revolução de 1949, o governo chinês adotou como norte os planos
quinquenais soviéticos. Durante esse período (1949-1978) se acreditou que ser
“socialista” e “marxista” significava seguir o modelo e a experiência da
construção econômica soviética (stalinizada, cabe acrescentar). Mao Tsé-tung
proclamou que “o Partido Comunista da
URSS é o nosso melhor mestre, e devemos acatar suas lições”[v],
ao mesmo tempo em que afirmava que ele “triunfou sob a direção de Stalin”,
igualando-o, como sempre fez – para o regozijo da mídia burguesa –, a Lenin.
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Mao Tsé-tung lendo livro de Stalin durante a guerra civil, de onde tirou grande parte de suas ideias políticas e econômicas |
Geralmente a mídia burguesa ignora e menospreza os grandes
avanços da sociedade chinesa com a planificação imposta pelo PCC sob o controle
de Mao, como a industrialização do país, que jamais ocorreria sem a revolução
de 1949. Contudo, a visão stalinista e maoísta tende a isolar a economia
nacional do mercado mundial, como se a parte pudesse se desenvolver sem o todo.
Se é certo que pode haver industrialização e desenvolvimento econômico em um
país isolado, é mais certo que haverá um claro limite para este desenvolvimento,
que tende a se esgotar e estagnar; além de ser impossível de construir o
socialismo, uma vez que tal país ficará à mercê do mercado mundial e de quem o
controla.
Fernando Claudín alerta para o fato de que “a industrialização da URSS – que constituía
o conteúdo econômico efetivo desse ‘socialismo integral’ – não era
objetivamente incompatível com a economia mundial capitalista”[vi].
Para o stalinismo e todo o “marxismo” vulgar, socialismo se resume à
industrialização e planificação. Mas como bem alerta Claudín, isso não é
incompatível com o mercado mundial. Como ao longo do século XX Rússia e China
estavam na periferia do sistema e não desempenhavam na economia mundial nenhum
papel comparável, ainda que de longe, ao dos principais países capitalistas, o
mecanismo pôde continuar funcionando sem essas “peças” (sobretudo sem a Rússia,
já que o mercado interno chinês sempre foi cobiçado pelo imperialismo Ocidental
e gradativamente tenderia a “emperrar a engrenagem”).
Com o passar do tempo, ficou patente que a economia chinesa
não poderia desenvolver-se a partir de planos quinquenais isolados, conforme
atesta o fracasso do “grande salto adiante” (plano quinquenal proposto pelo PCC
entre os anos de 1965 e 1969 em meio à ruptura política e econômica com a
URSS). Tal proposta foi o mesmo que tentar se salvar da areia movediça se puxando
sozinho pelos cabelos, uma vez que buscava um desenvolvimento econômico e
tecnológico isolado e autóctone, ignorando as contribuições dos outros países e
o intercâmbio com o mercado mundial.
“Os absurdos mortais
do ‘grande salto adiante’ – escreveu Hobsbawm – se deveram basicamente à convicção, que o regime chinês partilhava com
o soviético, de que a agricultura devia ao mesmo tempo alimentar a
industrialização e manter-se sem o desvio de recursos de investimento
industrial para ela. Em essência, isso queria dizer substituir os incentivos
‘materiais’ por ‘morais’, o que significava, na prática, pôr o volume quase
ilimitado de braços humanos disponíveis na China no lugar da tecnologia que não
havia”[vii].
Para Francisco Martins Rodrigues, “o
grande salto em frente estava condenado ao fracasso. Para os direitistas não
era difícil demonstrar a incongruência de se pretender levar os camponeses a
passar ao comunismo quando a economia não estava preparada para tal. A
supressão dos estímulos materiais e a distribuição de alimentos segundo as
necessidades e não de acordo com o trabalho prestado iriam provocar uma baixa
na produção. A criação de indústrias artesanais improvisadas nas comunas não
tinha qualquer valor econômico. Tudo não passava de uma espécie de ‘comunismo
primitivo’”[viii].
A crise aberta com a estagnação econômica resultante do
“grande salto adiante” levou à Revolução Cultural (1966-1976) e, com o fim
desta, à ascensão política da fração de Deng Xiaoping, que surfou no desgaste
político dos defensores dogmáticos do “modelo soviético” – isto é, dos planos
quinquenais burocráticos. Em um processo que vai durar de 1978 até 1992, Deng inicia
uma grande campanha interna que abrirá a China ao mercado mundial em um
programa de reformas que ficará conhecido como “as quatro grandes
modernizações”[ix].
Utilizando-se de métodos stalinistas e inicialmente
reabilitado e apoiado pelo próprio Mao, Deng expurga os “esquerdistas”; isto é:
o grupo político que o condenou como “direitista” ao longo da Revolução
Cultural e que entendia “socialismo” e “marxismo” como a aplicação burocrática
dos planos quinquenais. Alijando os seus mais ferrenhos adversários do poder,
Deng dribla a burocracia política para conseguir aplicar as reformas, buscando
uma aliança direta com os dirigentes provinciais, a quem contrapõem à cúpula do
PCC em Pequim – prometendo liberdade de comércio e rendimentos de impostos a
partir das zonas francas que foram criadas em suas províncias –; e com o
exército, a quem conquista o apoio a partir da promessa de liberdades
econômicas, como a livre compra e venda de armamentos, tal como faz o exército
dos EUA, ingressando no mercado internacional do ramo militar, além da
possibilidade de possuir empresas próprias como as que existem hoje: Xinxing, Norenco e Poly Tech;
todas aptas a competir no mercado mundial[x].
A política das “quatro grandes modernizações” previa a
reabertura de enormes zonas territoriais da China em um regime “econômico
especial”, onde a propriedade privada e o capital seriam não apenas garantidos,
como incentivados, para, segundo Deng, captar recursos econômicos e tecnologia
do Ocidente, modernizando, assim, a indústria. O plano previa também
“modernizar” a agricultura a partir da legalização dos rendimentos privados e
da restauração de relações de produção capitalistas no campo; “modernizar” a defesa,
abrindo o exército para a possibilidade de grandes rendimentos econômicos em
troca da lealdade às suas políticas e ao poder político estabelecido na China
pelo PCC; e “modernizar” a cultura, legalizando os princípios capitalistas da meritocracia,
calcados na eficácia e na produtividade. Deng propôs a “reforma” das empresas
estatais para torná-las mais receptivas às “forças do mercado”, bem como
legalizou o fim do pleno emprego, abrindo precedentes para a demissão de
trabalhadores. Mesmo escancarando a China para o mercado mundial e o
imperialismo Ocidental, Deng reforçou o poder centralizador do PCC, atribuindo
às instituições políticas chinesas um “caráter inegociável” – diferentemente da
restauração capitalista na URSS, em que, à abertura econômica, seguiu-se a
abertura política aos partidos e instituições burguesas[xi].
A esta política econômica contraditória Deng chamou
perigosamente de “socialismo com características chinesas”; e assim o PCC a vem
chamando desde então. Contra a acusação dos “anciãos do partido”, como Chen
Yun, que o acusavam de querer repetir a abertura soviética protagonizada por
Gorbatchev na URSS, Deng se defendia afirmando que o Estado ainda mantinha a
predominância na propriedade das zonas francas de “economia especial”, se beneficiando
da importação de tecnologia e no aprendizado da administração. Para ele “a linha demarcatória entre planejamento e
mercado não é a diferença substantiva entre socialismo e capitalismo, e isso
não tem qualquer ligação com a escolha entre socialismo e capitalismo. Economia
planejada não é a mesma coisa que socialismo, porque capitalismo também tem
planejamento. Por outro lado, economia de mercado não é igual a capitalismo,
porque socialismo também tem um mercado. Tanto o planejamento como o mercado são
instrumentos da economia”[xii].
A uma compreensão correta da utilização de “mercado” e
“planejamento” como “instrumentos da economia”, Deng agrega uma perigosa
compreensão de que o que fez com suas “reformas” foi construir o “socialismo
com características chinesas” e não o desenvolvimento de um tipo peculiar de
capitalismo de Estado[xiii].
Além disso, instituiu que tal projeto de reformas não deveria ser modificado
por cerca de 100 anos e que o PCC deveria zelar por ele ao longo de todo esse
percurso de tempo. Somente assim a China tornar-se-ia uma potência mundial. Ao
longo de distintas passagens dos seus textos e discursos, Deng “confunde” o
“socialismo com características chinesas” com a transformação da China em
potência mundial. Aqui cabe perguntar no que a China realmente está
interessada: construir o socialismo ou tornar-se uma potência mundial?
Para tentar encontrar a resposta, temos que analisar o
contraditório pensamento e as ações de Deng. Ele declarou solenemente que “a chave para atingir a modernização é o
desenvolvimento de ciência e tecnologia (...). Conversa mole não vai levar nosso programa de modernização a parte
alguma; precisamos ter conhecimento e pessoal treinado (...). Agora parece que a China está uns bons
vinte anos atrás dos países desenvolvidos em ciência, tecnologia e educação (...). Já na Restauração Meiji, os japoneses
começaram a fazer um grande esforço em ciência tecnologia e educação. A
Restauração Meiji foi uma espécie de campanha de modernização empreendida pela
emergente burguesia japonesa. Como proletários devemos, e podemos, fazer mais”[xiv].
Se por um lado Deng conseguiu dar o tão esperado “salto
adiante” e, portanto, conseguiu desenvolver a ciência e a técnica da China,
sendo, por isso mesmo, um grande incremento e um importante passo no sentido do
“socialismo” (ou dito de outra forma: o socialismo deve surgir de uma superação
do capitalismo em todos os seus pontos positivos – esta sempre foi a perspectiva
colocada por Marx e Engels); por outro, usando um discurso pernicioso, Deng
deixa aberta perigosas portas para a retomada total da China pelo imperialismo,
uma vez que os trabalhadores chineses estão capciosamente afastados de qualquer
órgão de poder – sem o quê não existe a menor possibilidade de efetivamente
construir o socialismo – e iludidos quanto ao discurso oficial do PCC (ou
reprimidos quando tentam afirmar o oposto).
Deng teve méritos, sem dúvida, no sentido de lutar contra
concepções petrificadas e dogmáticas de membros da burocracia do PCC e da
“esquerda” em geral, propondo reformas econômicas que contrariavam preceitos há
muito arraigados na “doutrina oficial”, o que abriu precedentes para tirarmos
conclusões acerca desta experiência; porém, distorce a noção do que é socialismo,
chegando ao ponto de falsificá-lo, tirando-o da perspectiva de qualquer poder
operário e popular. A principal vitória do socialismo – para além da
industrialização, da eliminação do analfabetismo, do desenvolvimento de
condições materiais básicas para o proletariado – estará na sua capacidade de
formar adultos socialmente auto-suficientes do ponto de vista intelectual e
emocional (mas sempre ligados entre si pelos interesses gerais da sociedade),
para que estes possam educar as crianças no mesmo sentido e assumam suas
responsabilidades nos organismos políticos e instituições de massas com poder
real sobre o governo e a sociedade. Neste esforço, a luta contra o
irracionalismo das massas e o seu espírito de rebanho é fundamental, sem o quê,
para além das condições materiais, não haverá possibilidade alguma de acabar
com as classes e o Estado para, aí sim, criar as condições reais que possam atingir
o comunismo.
O
PCC e a sua “nova” doutrina não apenas não lutam contra isso, como reforçam
este docilidade diante da autoridade. Assim, de nada adianta o grande
desenvolvimento econômico das forças produtivas, tal como propunha Deng. Pra
piorar, ao longo da década de 1990, o PCC incentivou a propaganda de um nacionalismo chinês a partir do resgate
da figura de Mao Tsé-tung, mesclando-a com o confucionismo; tudo em detrimento
da ideologia comunista (que é internacionalista por excelência).
4) NEP versus
reformas de Deng: lições, erros e acertos
Mesmo
havendo parentesco entre a NEP proposta por Lenin e algumas das reformas de
Deng, há profundas e perigosas diferenças que merecem ser analisadas e
pontuadas agora.
Após
a vitória do governo revolucionário soviético liderado por Lenin e Trotsky
sobre os exércitos contra-revolucionários na guerra civil de 1919-1921, a
Rússia encontrava-se arrasada social, política e economicamente. “Os três primeiros anos [da revolução russa]
– escreveu Trotsky – foram de uma guerra
civil aberta e dura. A vida econômica foi inteiramente subordinada às necessidades
das tarefas de combate”[xv].
Era necessário, portanto, reestruturar a economia e superar o chamado
“comunismo de guerra” – um termo que gera muita confusão porque nos remete à
“comunismo”, mas que não passou de uma forma de requisição forçada de mercadorias
e mantimentos para manter de pé o exército revolucionário e o governo –,
sobretudo porque não houve revolução europeia, o que selou o isolamento
internacional da URSS. Durante este período, Lenin apontou que “o ‘comunismo de guerra’ nos foi imposto
pela guerra e pela ruína. Não foi e nem podia ser uma política que respondesse
às tarefas econômicas do proletariado. Foi uma medida provisória. (...) é preciso não esquecer o seguinte: a miséria
e a devastação são de tal ordem que não podemos restabelecer de repente a
grande produção fabril, a produção estatal, a produção socialista”[xvi].
Para Trotsky, “o confisco dos excedentes
de grãos dos camponeses e a distribuição das rações não eram medidas próprias
de uma economia socialista, mas de uma fortaleza sitiada”[xvii];
“o comunismo de guerra” criava toda uma burocracia que envolvia uma certa
unidade econômica – em parte necessária, em parte reproduzindo as
características herdadas da antiga economia russa.
A
partir de 1921, quando a guerra civil se encerrou, os congressos do Partido
Comunista da URSS se debruçaram em um debate apaixonado sobre os rumos
econômicos a seguir e delinearam, por iniciativa de Lenin, o que veio a ficar conhecida
como Nova Política Econômica (NEP em russo).
Em síntese, ela consistia em restaurar as leis de mercado entre o campo –
atrasadíssimo – e a indústria recém coletivizada, em um país onde os pequenos
camponeses eram maioria[xviii]
(além de preservar parte da pequena propriedade nas cidades). Não casualmente,
tanto Gorbatchev, com sua nefasta Perestroika[xix],
quanto o PCC de Deng, fazem referências à NEP e a esse período da história
soviética. Contudo, há que se ter muito cuidado nessa comparação.
Ainda
que Lenin e Trotsky sempre enfatizassem a necessidade da aplicação de uma NEP
como o resultado da derrota da revolução europeia e do isolamento da URSS, devemos
levar em consideração outros pontos não abordados por eles, como a possível necessidade de uma etapa de
capitalismo de Estado na transição para uma sociedade socialista; ou, nas
palavras de Lenin, um estágio que seria a “ante-sala” para a passagem ao
socialismo. Ele escreveu que “a transição
ao comunismo pode se efetuar também por meio do capitalismo de Estado”, e
sublinhou a palavra “também” para enfatizar que essa passagem não deve se dar somente por meio do capitalismo de
Estado[xx].
Porém, vimos que o capitalismo não pôde ser superado de forma tão fácil com
planos abstratos, sendo necessário o desenvolvimento de formas mistas de
transição de um sistema econômico para o outro – sem capitular à conciliação de
classes! –, sabendo usar a força do inimigo e o peso da inércia das
mentalidades contra ele próprio. Cabe ressaltar ainda que em outras passagens
de diversos artigos sobre a NEP, Lenin parece contradizer-se com o que afirmara
a respeito da ponderação do “também”.
Por
exemplo: “os melhores não compreenderam
que os mestres do socialismo não tinham falado em vão de todo um período de
transição entre o capitalismo e o socialismo e não salientaram em vão as
‘longas dores do parto’ da nova sociedade e não entenderam que ela é, por
certo, uma abstração e só pode encarnar na vida por meio de ações concretas,
imperfeitas e variadas, para se criar um ou outro Estado socialista. Exatamente
porque não se pode continuar avançando a partir da atual situação econômica da
Rússia, sem passar pelo que é comum ao capitalismo de Estado e ao socialismo, é
um completo absurdo teórico assustar os outros e a si mesmo com a ‘evolução
para o capitalismo de Estado’”[xxi].
Ou ainda: “o socialismo não é mais que o
passo seguinte ao monopólio capitalista de Estado. (...) [ele] é a sua ante-sala, um degrau na escada
histórica entre o qual e o degrau chamado socialismo não há nenhum degrau
intermediário”[xxii].
Justo na primeira “experiência socialista” foi-se necessário recorrer a ele. Na
China novamente. Portanto, deve haver alguma ligação (que certamente precisa
ser melhor debatida e desenvolvida) entre o capitalismo de Estado e as formas
de transição baseadas na construção de uma nova hegemonia na sociedade, bem ao
estilo da “estratégia socialista para os países ocidentais” proposta por
Gramsci.
Isso
se passaria desta forma porque não há como tirar da cartola uma nova economia,
pronta, em perfeito estado de expansão e prosperidade, sobretudo após uma
revolução, que inevitavelmente apresentará uma série de formas mistas de
economia – principalmente nos países periféricos. Qualquer formalismo neste
assunto compromete o êxito revolucionário, porque é necessário ter a clara
consciência de que o novo regime que surgirá da revolução não pode ser, em
nenhuma medida, outra coisa que não um regime
de transição, com formas econômicas mistas e até opostas. Se não somos idealistas
que vivem nas nuvens ou tementes crônicos à frustração, é inevitável se
recorrer a alguns velhos métodos econômicos, bem como às técnicas e aos
especialistas da velha sociedade burguesa.
Foi
por isso que Lenin afirmou que “o
socialismo é inconcebível sem a grande técnica capitalista, calcada na última
palavra da ciência moderna, sem uma organização estatal harmônica, que submeta
dezenas de milhões de pessoas à mais rigorosa observância de uma única norma na
produção e na distribuição”[xxiii].
A despeito dos problemas de desumanização da técnica capitalista e, também, da submissão
“de dezenas de pessoas ao Estado” – o que gera contradições absurdas (e até
mesmo fascistas), sendo necessário analisá-las num artigo específico –, sem
dúvida o socialismo precisa partir do ponto evolutivo onde o capitalismo “parou”,
e não estagnar, retroceder ou criar uma “economia nova do nada”. Lenin ainda
afirma que “ao derrotarmos os
latifundiários e a burguesia, limpamos o caminho, mas não construímos o
edifício do socialismo”; e que “não é
o capitalismo de Estado que luta contra o socialismo, mas sim a pequena
burguesia mais o capitalismo de economia privada, unidos, de comum acordo, que
lutam tanto contra o capitalismo de Estado como contra o socialismo”[xxiv].
Evidentemente
que Lenin sempre falou em um “capitalismo de Estado” como o resultado de uma revolução,
que leve ao poder uma organização revolucionária dos trabalhadores; e não uma
economia saída de eleições burguesas, dentro de um Estado burguês. Ele afirma
que somente “quando a classe operária
tiver aprendido a defender a ordem estatal contra o anarquismo
pequeno-proprietário, quando tiver aprendido a colocar em marcha a grande
organização estatal da produção, tomando por base os princípios do capitalismo
de Estado, terá em suas mãos todos os triunfos; deste modo a consolidação do
socialismo estará assegurada”[xxv].
Ou seja, o capitalismo de Estado saído de uma revolução vitoriosa seria o
andaime da construção do edifício do socialismo, que deve ser obrigatoriamente
retirado quando este edifício estiver “pronto”.
Lenin
também sugeriu – embora o governo revolucionário nunca tenha concretizado tal
sugestão – entregar zonas econômicas especiais ao grande capital privado
internacional para que explorassem recursos naturais da Rússia que o poder
soviético não tinha condições de explorar naquele momento. Cabe ver o que ele
escreveu a respeito: “O exemplo mais
simples de como o poder soviético dirige o desenvolvimento do capitalismo em
direção ao capitalismo de Estado são as concessões. Agora, todos estamos de
acordo que as concessões são indispensáveis, mas nem todos refletem sobre seu
significado. (...) O concessionário é
um capitalista. Dirige as empresas à maneira capitalista, com o objetivo de
obter lucro, estabelecendo um acordo com o poder proletário tendo a finalidade
de obter lucros extras, superlucros, ou tendo a finalidade de obter um tipo de
matéria-prima que não poderia obter ou dificilmente conseguiria de outro modo.
O poder soviético obtém vantagens no desenvolvimento das forças produtivas, do
aumento imediato ou a curto prazo da quantidade de produtos. (...) A determinação da medida e das condições em
que as concessões são convenientes, e não representam um perigo para nós,
depende da correlação de forças e se resolve pela luta, já que também as
concessões representam um aspecto da luta, a continuidade da luta de classes
sob outra forma, e de modo nenhum a substituição da luta de classes pela paz de
classes. Os métodos de luta a serem empregados serão determinados pela prática.
(...) Pagamos um certo ‘tributo’ ao
capitalismo mundial, ‘resgatando-nos’ dele, em alguns aspectos, obtendo, em
certa medida, imediatamente, a consolidação do poder soviético e a melhoria das
condições de gestão de nossa economia. (...) Inegavelmente existem dificuldades e os erros seguramente serão
inevitáveis nos primeiros momentos, mas essas dificuldades são mínimas se
comparadas com outros problemas da revolução social, particularmente com outras
formas de desenvolvimento, admissão e implantação do capitalismo de Estado.
(...) A política de concessões, em caso
de êxito, nos proporcionará um pequeno número de empresas-modelos – em
comparação com as nossas – que estarão no nível de adiantamento do capitalismo
atual; que, depois de alguns anos, passarão integralmente para as nossas mãos”[xxvi].
Muitas
passagens do trecho acima são semelhantes ao que escreveu Deng Xiaoping para
justificar as concessões na China, que lá assumiram o nome de zonas econômicas especiais (o mesmo que
zonas francas, como são chamadas no Brasil). No entanto, demonstram, também,
profundas diferenças, como, por exemplo, o fato de Deng ter proposto exatamente
a substituição da luta de classes pela “paz de classes”.
***
Já
em Trotsky, podemos ler que “uma vez
conquistado o poder, o trabalho de construção, sobretudo no campo econômico,
torna-se o trabalho-chave e também o mais difícil. Sua solução depende de
fatores das mais variadas ordens e de diferentes magnitudes. Em primeiro lugar, do nível de desenvolvimento
das forças produtivas, sobretudo da relação recíproca entre a indústria e a
agricultura”. Depois complementa, dentre vários fatores, que o mais fundamental “é o desenvolvimento das forças
produtivas, depois o nível cultural do proletariado e, finalmente, a
situação política e militar em que se encontra o proletariado”. Depois
chama a atenção para a questão decisiva de que “o que é racional na vida econômica nem sempre é racional na vida
política”, embora qualquer economia possa crescer “desde que exista certa proporcionalidade entre seus diferentes
setores”[xxvii].
Eis
aí apenas uma pequena parte do problema.
***
Podemos perceber nestes trechos de Lenin e Trotsky muitos
parentescos com algumas das ideias
que Deng Xiaoping aplicou na China. Como por exemplo, a busca e a forma de
aprender com a experiência do capitalismo “mais avançado”. Deng afirmou que: “é preciso aprender a gerenciar a economia
com meios econômicos. Se nós mesmos não conhecemos a metodologia avançada desse
gerenciamento, devemos aprendê-la com quem conhece, em nosso país ou no
exterior. Esses métodos devem ser aplicados não apenas em operações
empresariais com tecnologias e materiais recentemente importados, mas também na
técnica das empresas existentes. Até podermos começar em campos limitados a
introdução de um programa nacional unificado de gerenciamento moderno; digamos,
uma região em particular ou um determinado comércio e, a partir daí, levar a
aplicação do processo a outras áreas”[xxviii].
Dentre as propostas apresentadas por Deng, está a que
defende uma espécie bem evidente de capitalismo de Estado adaptado às condições
da China do final do século XX: “a economia
de mercado transformou todas as transações econômicas em mercado e moeda
corrente. O propósito da nova formulação era retirar o governo do
microgerenciamento da economia. O documento nº4 reduziu o papel da Comissão de
Planejamento Estatal e aumentou o papel do mercado. Esse novo dispositivo
deixou bastante claro que o papel principal era do mecanismo de mercado que
controlava toda a distribuição. O planejamento central continuaria com a
vigência do novo dispositivo, mas o governo não mais interferiria nas empresas
por meio de ordens administrativas. Em vez disso, regulamentaria e padronizaria
as atividades empresariais por meio de planejamento não-obrigatório e do uso de
alavancas econômicas tais como impostos, taxas de juros e políticas
industriais, manobra muito semelhante àquela aplicada pelos japoneses por intermédio
do Ministério de Indústria e Comércio Internacional”[xxix].
Deng leva em consideração o conjunto das relações
internacionais – e, portanto, o mercado mundial. Para Lenin, não levar em
consideração tais relações é sempre um erro. Os adversários de Deng dentro do
PCC apresentavam argumentos fraquíssimos, pautados num dogmatismo agonizante
que resultava da ortodoxia stalinista da URSS. Nada de muito positivo poderia nascer
deste embate, embora muitos deles, como Chen Yun, tenham apresentados pontos
importantes, ainda que profundamente limitados.
A
esquerda critica e excomunga Deng por ter tomado medidas econômicas “capitalistas”
no sentido de modificar a indústria e o desenvolvimento da China. Como sabemos,
por ter sido uma colônia de distintos países imperialistas ocidentais, esta
fase ficou incompleta[xxx].
A revolução de 1949 criou as possibilidades de resolvê-la, embora o comitê central
do PCC e muitos autores, de “esquerda” e de “direita”, compreendem que houve um
período de “construção do socialismo” na China (isto é, entendem “socialismo”
como um período de isolamento econômico nacional baseado em planos
quinquenais). O próprio Deng incorre neste erro quando afirma que “o socialismo em nosso país se desenvolveu
por um curto período”[xxxi].
Tal
como vimos em Lenin, a busca pelo incremento econômico, a conquista da técnica
“baseada na última palavra da ciência” e no desenvolvimento das forças
produtivas estão em consonância com o que preconizou Marx e Engels – e isso
mereceria ser reconhecido e debatido entre a esquerda, sobretudo para gerar uma
nova prática, novos debates sobre a transição ao socialismo, etc. A esquerda
brasileira e mundial, na contra mão disso (e quase como regra), joga tudo fora
para reproduzir dogmas.
Por
outro lado, reconhecer os méritos de Deng não exclui analisarmos os efeitos
negativos de sua política, que são por demais evidentes; e nesta interação
dialética entre o lado positivo e o negativo das reformas e aberturas de Deng,
podemos não apenas enriquecer a teoria socialista, como tentar intuir os passos
em direção ao socialismo, bem como compreender a ascensão da China ao posto de
país imperialista hegemônico no mercado mundial. Já foi analisado a natureza e
o papel do Estado e da economia existente na China atual no texto A ascensão mundial da China[xxxii];
por isso não retomaremos essa discussão aqui.
***
Quando Lenin e Trotsky iniciaram o processo de aplicação da
NEP na URSS, tiveram o seguinte cuidado na narrativa: “hoje, temos que recorrer ao velho método burguês e aceitar os
‘serviços’ dos grandes especialistas burgueses em troca de uma remuneração mais
alta. Os que conhecem a situação compreendem isso, mas nem todos param para
pensar a respeito do significado de tal medida tomada pelo Estado proletário. É
evidente que essa medida constitui um compromisso, um desvio dos princípios
sustentados pela Comuna de Paris e por todo poder proletário, que exigem a
redução dos ordenados ao nível do salário operário médio, que exigem que se
lute contra o arrivismo com fatos e não com palavras”.
E concluem: “é
evidente que tal medida não só é uma interrupção, em certo terreno e em certo
grau, da ofensiva contra o capital (já que o capital não é uma simples soma de
dinheiro, mas determinadas relações sociais), mas é também um passo atrás de
nosso poder estatal socialista, soviético, que desde o primeiro momento proclamou
e começou a levar à prática a política de redução dos altos salários até o
nível do ordenamento de um operário médio. (...) Ocultar às massas que atrair os especialistas por meio de salários
extremamente elevados é um desvio dos princípios da Comuna, seria descer ao
nível dos políticos burgueses e enganá-las. Ao contrário, explicar abertamente
como e por que retrocedemos nesse caso, discutir publicamente os meios de que
dispomos para recuperar a perda, significa educar as massas e, baseados na
experiência adquirida, aprender com elas a construir o socialismo. (...) É indiscutível que as altas remunerações
exercem uma influência desmoralizadora, tanto sobre o poder soviético, como
sobre a massa operária. Porém, todos os operários e camponeses pobres, conscientes
e honrados, concordarão conosco, reconhecerão que não estamos em condições de
nos livrarmos, de repente, da herança nociva do capitalismo. (...) E se Bukhárin afirma que nisto não há
violação de princípios, eu sustento que o que se infringe é o princípio da
Comuna de Paris. O capitalismo de Estado não tem sua raiz no dinheiro, mas sim
nas relações sociais. Quando nós pagamos à razão de dois mil rublos, conforme o
decreto ferroviário, isto é capitalismo de Estado”[xxxiii].
Eis que Deng Xiaoping e o PCC fizeram exatamente o oposto na
aplicação do seu tipo de capitalismo de Estado: não apenas não o chamaram pelo
nome, mas o enfeitaram, batizando-o, capciosamente, de “socialismo com
características chinesas”. Como não poderia deixar de ser, os intelectuais e a
mídia burguesa tiram todo o tipo de vantagem propagandística disso. Portanto,
conforme o linguajar de Lenin, agiram como políticos burgueses e enganaram as
massas, escondendo que estavam rompendo princípios e, ao invés de explicarem
clara e publicamente que retrocediam, afirmaram exatamente o contrário, que
estavam construindo o “socialismo com características chinesas” (isto é,
“avançando”). Mesmo todas essas diferenças nada desprezíveis não impedem os
intelectuais e a mídia burguesa de chamarem Deng e o PCC de “leninistas”.
No caminho contrário ao deles, Lenin aponta “o fato de que o trabalho para organizar o
registro e o controle tenha ficado atrasado em relação à obra de expropriação
direta dos expropriadores explica por que o poder soviético foi obrigado a dar
um passo atrás ou a aceitar um compromisso com as tendências burguesas. Por
exemplo, foi um passo atrás, um retrocesso em relação aos princípios da Comuna
de Paris, a introdução de altos salários para alguns especialistas burgueses.
Um compromisso desse tipo foi o acordo com as cooperativas burguesas a respeito
das gestões e medidas visando incorporar paulatinamente toda a população às
cooperativas. Enquanto o poder proletário não estabelecer por completo o
controle e a contabilidade populares, tais compromissos são indispensáveis e
nossa tarefa, sem ocultar o mínimo que seja ao povo os seus aspectos negativos,
está em intensificar todos os esforços para melhorar o confronto dos salários
com os resultados gerais do trabalho da fábrica, com os rendimentos das
ferrovias ou do transporte fluvial, etc.”[xxxiv].
Aqui, novamente, percebemos que não apenas os aspectos negativos são ocultados, como
Deng e o PCC trabalharam no sentido de afirmar que estão aplicando os
princípios do “socialismo” com o seu mágico adendo de “com características
chinesas”. Dentro da lógica de Lenin, a colaboração prevista entre socialismo e
capitalismo de Estado não teria um compromisso de poder. Privilegiar-se-iam as
relações econômicas assentadas no capitalismo de Estado e, portanto, em
definitivo as relações capitalistas de produção, mas não o poder político dos
capitalistas como classe. Aos capitalistas que estivessem dispostos a
colaborar, seria pago um tributo econômico, mas ficariam, como antes, excluídos
do poder, que permaneceria solidamente nas mãos da classe operária como poder
da ditadura proletária para que tais relações fossem limitadas e não se
transformassem em novas relações de poder[xxxv].
O que Lenin critica de forma enfática é exatamente o que
acontece na China. Baseando-se na teoria de Mao-Stalin da “Nova Democracia”,
ocorre não apenas a participação da burguesia no governo do PCC, mas as
posições defendidas por Deng e consolidadas por outros líderes “comunistas”
chineses, passaram a permitir a filiação de “bilionários,
que encontram na atual estrutura social chinesa a fonte de sua riqueza; e
outros tantos empresários e burocratas corrompidos que nem sequer sabem o que
significa ‘comunismo’, mas ajudam a
manter toda a pirâmide hierárquica”[xxxvi].
5) O capitalismo de Estado como primeira etapa da fase inferior do comunismo, isto é, do socialismo
(ou como o primeiro “degrau” antes do “degrau do socialismo”)
Foi durante as polêmicas de aplicação da NEP que somos
brindados com um dos textos mais sóbrios de Lenin, que confronta a teoria com a
dura realidade que os bolcheviques foram obrigados a encarar. Trata-se do
artigo Sobre o imposto em espécie, onde
ele polemiza com a visão “infantil” cristalizada em grande parte dos militantes
bolcheviques, que tendiam a ter uma visão teórica e prática dogmatizante,
embalada por um verbalismo revolucionário que, como sempre, servia para
dissimular a perda da noção de realidade. Tais debates são riquíssimos e,
certamente, representam um grande tesouro do pensamento socialista – sobretudo
no que diz respeito a edificação do socialismo.
Foi durante estas polêmicas que Lenin constatou que os
raciocínios sobre a transição e edificação do socialismo contem erros quanto
aos prazos. Segundo ele, estes se revelaram mais longos do que se supunha então
(desconsiderando ainda o isolamento da revolução russa, que também foi
determinante). A realidade da Rússia colocou uma série de desafios à teoria
que, obviamente, não foram e nem poderia ser previstos por Marx e Engels. Um
destes desafios é o debate sobre o capitalismo de Estado, que segundo Valentino
Gerratana, “foi tacitamente sepultado”,
não se encontrando nas pautas posteriores do partido bolchevique nenhum sinal
dele[xxxvii].
A ascensão do stalinismo, que coagiu e sufocou qualquer tipo de discussão,
transformou o capitalismo de Estado, mesclado a outras formas econômicas
híbridas, no conceito definidor do que seria “socialismo” (a grande mídia
burguesa passou a chamar tudo isso, posteriormente, de “socialismo real”). A
confusão e o estrago estavam feitos. Qualquer semelhança com o processo chinês
liderado por Deng não é mera coincidência.
Para Lenin, ao contrário: “tecemos sutilezas a respeito de como se deve compreender o capitalismo
de Estado e folheamos velhos livros. Mas nada disso encontramos aí, em
absoluto, pois fala-se dele no regime capitalista, mas não há um só livro que
fale do capitalismo de Estado que existe sob o ‘comunismo’. Nem mesmo Marx
suspeitou da necessidade de escrever uma só palavra sobre isso, e morreu sem
deixar citações precisas ou indicações irrefutáveis. Por isso, agora temos que
nos esforçar para avançarmos sozinhos. (...) O capitalismo de Estado desorienta muitas pessoas. Para que isso não
ocorra é preciso recordar o fundamental: que não há teoria e nem trabalho sobre
economia que analise um capitalismo de Estado do nosso tipo, pela simples razão
de que todas as noções comuns, relacionadas com essas palavras, se referem ao
poder burguês na sociedade capitalista”[xxxviii].
Talvez seja por isso que Lenin adverte-nos sobre aqueles que
“como papagaios repetem palavras
decoradas, sem contudo, compreendê-las”; e que, justamente por isso, é “um erro evidente dar rédeas soltas aos
faladores e linguarudos, que se deixam levar pelo ‘brilhante’ revolucionarismo,
mas são incapazes de realizar um trabalho revolucionário firme, refletido e
ponderado, que leve em conta também as dificílimas transições”[xxxix].
Grande parte da militância da “esquerda” está picada por este mosquito do
“revolucionarismo”, que causa intolerância a frustrações e cegueira diante da
realidade em que as “dificílimas condições de transição” a contra-revolução e a
luta de classes nos colocam. Fácil seria se tivéssemos uma receita de bolo
infalível que nos desse a rota da estrada de tijolos amarelos ao socialismo;
mas infelizmente tal receita não existe. Assim, quem “teme lobos” deve
continuar “evitando ir à floresta”[xl].
***
Todas as experiências do movimento operário internacional
são valiosas lições da tentativa de construção do socialismo. Estudá-las e
conhecê-las o mais profundamente possível é tarefa fundamental de todo
trabalhador e toda trabalhadora consciente. Contudo, nenhuma delas deu a última
palavra sobre o socialismo – nem poderia dar. Estamos, precisamente, na fase
histórica de transição ao socialismo (a fase inferior do comunismo), vindo de
profunda derrota (restauração do capitalismo nos ex-Estados operários, onde a
burguesia retomou plenamente o poder) e, por isso mesmo, tal como nos apontou
Lenin, devemos nos “esforçar para avançar sozinhos”.
Ele dava toda razão a Marx “quando ensinava aos operários a importância de se conservar a
organização da produção, exatamente para facilitar a passagem para o
socialismo”[xli] –
dentre outras recomendações não menos importantes. Grande parte da “esquerda”
ainda se prende a noção – baseada, em parte, no anarquismo, expresso por
Proudhon – de que devemos formar federações colaborativas de pequenas
propriedades individuais, quebrando a lógica da grande produção e,
provavelmente, as importantes relações internacionais criadas pelo mercado
mundial. Tais medidas não nos levariam à superação do capitalismo e à
continuidade do desenvolvimento das forças produtivas, mas, possivelmente, ao
retrocesso a etapas já superadas pelo capitalismo como parte de um elo na
evolução dos modos de produção humanos.
Nesse sentido, o capitalismo de Estado deve ser, como
preconizou Lenin, a ante-sala do socialismo – e não uma forma de embelezamento
do capitalismo, tal como faz toda a sorte de reformismos –, uma vez que não
temos como conservar a grande produção criando uma economia totalmente nova ou
tirando-a de uma cartola num passe de mágica, como querem os “brilhantes
revolucionaristas”. O capitalismo de Estado – como o estágio inicial e embrionário
da fase inferior do comunismo, o socialismo; ou como sua “ante-sala” – é,
segundo Lenin, “um degrau da escada
histórica entre o qual e o degrau chamado socialismo não há nenhum degrau
intermediário”[xlii].
Em caso de um processo revolucionário em que seja possível
dispensar o capitalismo de Estado ou qualquer tipo de compromisso econômico (e
nunca de poder) com a burguesia, mantendo a grande produção e as suas forças
produtivas, os trabalhadores e suas organizações não devem titubear em passar
direto ao socialismo. Mas isso soa muito abstrato. A experiência histórica do
século XX serviu para nos demonstrar que esta transição é mais longa e
contraditória do que supúnhamos. Conhecemos apenas os seus primeiros passos.
Para Lenin, “todos estamos de acordo em
que os primeiros e fundamentais passos que se deem [no sentido do
socialismo] devem consistir em medidas
como a nacionalização [estatização] dos
bancos e dos cartéis. Realizemos antes de tudo essas medidas e outras
semelhantes e depois veremos. Uma vez conseguido isso, saberemos melhor a que
nos ater, pois a experiência prática, que vale milhões de vezes mais do que os
melhores programas, ampliará infinitamente o nosso horizonte. É possível, e até
provável, e, mais ainda, indubitável, que nem mesmo aqui possamos prescindir de
‘tipos combinados’ de transição”[xliii].
Haveremos, segundo Lenin, de começar e recomeçar várias
vezes; e para isso, a independência e a criatividade para “avançarmos sozinhos”
serão decisivas. Não se trata apenas dos países mais atrasados, mas
provavelmente dos “desenvolvidos” também, dadas as contradições sociais,
psicológicas, culturais, etc. No texto A
ascensão mundial da China foi questionado se é “errado um governo operário se utilizar do mercado para o seu
desenvolvimento econômico com vistas ao socialismo”[xliv];
e a resposta foi “não! Seria, ao
contrário, um dever! Porém, seria importante traçar alguns critérios bem claros
para explicar tudo aos trabalhadores – tal como Lenin e Trotsky fizeram com a
Nova Política Econômica (NEP) em 1921, ao contrário do PCC de Deng”. Como
vimos, há uma distinção entre a forma de aplicação da NEP – falando sempre tudo
claramente sem vender gato por lebre – e das reformas de Deng – que chama
capitalismo de Estado de “socialismo com características chinesas”.
Parte da tarefa do governo revolucionário neste período de
transição entre o “degrau do capitalismo de Estado” e o degrau seguinte, “o
socialismo”, está em, ao mesmo tempo que permite determinada acumulação de
riqueza pessoal (quer dizer, uma relativa condescendência com a formação de
poupanças pessoais, familiares e de algumas empresas privadas), regulamentar e
controlar o mercado; isto é, a intervenção consciente do Estado na economia –
ou seja, a concretização do pesadelo dos neoliberais de todos os matizes. A
formação e a existência dos monopólios e trustes econômicos, por exemplo, só
podem ser públicos e jamais privados, pois são estas distorções que geram a
degeneração completa de um punhado de bilionários que controlam mais da metade
da riqueza gerada na maioria esmagadora dos países (são os monopólios privados
que precisam ser combatidos conscientemente pelos revolucionários, procurando
ganhar o apoio daqueles que possuam uma pequena riqueza ou poupança, até que se
abra uma nova fase de desenvolvimento econômico mundial tornando obsoleto tal
tipo de compreensão e programa). As organizações dos trabalhadores deverão
intervir conscientemente no processo econômico, acompanhando passo a passo e
combatendo as inevitáveis contradições que resultarão de tudo isso. Entende-se
que apenas um governo revolucionário, com uma clara perspectiva socialista (o
que não é o caso do PCC), pode direcionar o desenvolvimento do capitalismo de
Estado em direção ao socialismo (qualquer outro governo, sobretudo as frentes populares
eleitorais, criarão somente um novo emaranhado de dificuldades que terminarão
abrindo caminho à direita fascista ou neofascista).
Dentro desta perspectiva, Trotsky observa que “é o mercado que certifica a rentabilidade
econômica de uma linha [de trem], já
que não elaboramos os métodos de cálculo estatístico de uma sociedade
socialista. (...) Considerando a rede
como uma entidade técnica auto-suficiente, fixando modelos uniformes de
locomotiva e vagões, centralizando os trabalhos de reparos e, por conseguinte,
seguindo um plano técnico-socialista abstrato, nos arriscávamos a perder
totalmente o controle do que era necessário, aproveitável ou não, de cada linha
em particular e de toda a rede. Que linha deve ser ampliada ou reduzida? Tal
linha deve existir? Que financiamento deveria o Estado fazer para suas próprias
necessidades? Que divisão da capacidade de transporte deveria ser feita entre
as necessidades particulares e as das organizações?”.
E ainda complementa que “durante
um longo tempo o Estado operário deverá utilizar os métodos capitalistas, ou
seja, servir-se do mercado para dirigir a rede. (...) Nem os planos econômicos incubados entre as paredes de um escritório,
nem os sermões comunistas abstratos garantirão [o funcionamento da
economia]. Cada empresa estatal, com seu
diretor técnico e comercial, deverá necessariamente estar sujeita a um controle
permanente, que virá não só de cima, ou do Estado, mas também de baixo, isto é,
do mercado, que continuará sendo o regulador da economia estatal por muitos
anos no futuro. (...) Agindo dessa
forma, o Estado não parte de um cálculo a priori e de hipóteses abstratas, que seriam, em grande parte, inexatas, como
ocorreu durante o ‘comunismo de guerra’. Seu ponto de partida está na ação do
mercado. A condição monetária do país e seu sistema de crédito governamental
centralizado servem para regular o mercado”[xlv].
E conclui: “Sob um
capitalismo de Estado autêntico, ou seja, sob uma direção burguesa, o
crescimento do capitalismo de Estado significa o enriquecimento do Estado dos
burgueses e seu poder crescente sobre as massas operárias. Entre nós, o
crescimento da indústria estatal soviética significa o crescimento do
socialismo, que procede diretamente do poder proletário. No curso da história,
observamos diversas vezes o desenvolvimento de um fenômeno novo, apesar de
mascarado por velhas formas. Fenômeno que, por outro lado, se dá de maneiras
diferentes. Quando a indústria assentou suas raízes na Rússia, ainda sob as
leis feudais, na época de Pedro, o Grande, as fábricas, embora fossem
concebidas de acordo com os modelos europeus da época, foram edificadas,
contudo, com sobrevivências da base feudal. Os servos se encontravam ligados a
elas por meio de sua força de trabalho (as fábricas recebiam a denominação de
fábricas senhoriais). Os capitalistas (...) proprietários destas empresas, desenvolveram seu capitalismo no
interior do ‘sistema feudal’. De modo similar, o socialismo deve dar seus
primeiros passos no círculo capitalista que o antecede. Não se pode realizar
uma transição para métodos perfeitos, saltando a primeira tarefa do socialismo,
e isso ainda quando a sua cabeça se encontra suja e despenteada, como ocorria
com nossa cabeça russa. (...) Devemos
aprender sempre e sempre continuar aprendendo”[xlvi].
***
Grande parte da população – sobretudo a classe média – tem
verdadeiro horror ao discurso “socialista” de retribuir o salário de todos (ou
quase todos) com o salário médio de um operário (tal como o preconizado pela
Comuna de Paris e repetida, muitas vezes, de forma dogmática e descolada da
realidade pela “esquerda” atual). Toda a condenação à “ausência de liberdade”
supostamente ocasionada pelo “socialismo” tem a ver, no fundo, com o medo do
fim da “liberdade econômica de acumular riqueza”. Como combater essa
mentalidade? Apenas pela força? Seria possível usar a capacidade de gerar
riqueza a partir da acumulação pessoal (controlada e em pequena-média escala)
numa forma de incentivar a transição ao socialismo? Até que ponto seria
possível e até que ponto não? Por que a esquerda se nega a debater tais
questões, colocando um rótulo de que isso é “desvio do socialismo” e “resolvendo”
os problemas desta maneira simplista? Se é possível fazer esse debate e seguir
tal curso, qual programa seria o mais conveniente para a China, por exemplo
(levando em consideração que lá o processo é outro, diferente da NEP)?
É bastante plausível levar em consideração que se Marx está
correto e não podemos quebrar a espinha dorsal da “grande produção”, partindo
do atual estágio de desenvolvimento das forças produtivas para fazer com que
sigam evoluindo; e se Lenin também está correto quando parte da compreensão de
que não podemos prescindir de tipos combinados de transição, num misto de
“monopólio estatal proletário” com “livre concorrência”; então, forçosamente,
temos que reconhecer que Deng não está completamente errado (apesar das suas
graves falhas e conciliações – sobretudo as compreensões e práticas
stalinistas) e que certa condescendência com práticas de mercado e de
acumulação pessoal serão inevitavelmente necessárias.
Um
dos principais erros de Deng consistiu, tal como o apontado no texto A ascensão mundial da China, em cessar a
propaganda e a luta revolucionária nos demais países da periferia do mercado
mundial para demonstrar sua “boa vontade” aos investidores estrangeiros,
chegando ao cúmulo de apoiar a ascensão de ditadores pró-capitalismo
neoliberal, como Pinochet, no Chile[xlvii].
Assim, Deng cumpriu o mesmo papel que Stalin quando aceitou as orientações do
1º ministro britânico Chamberlain: “não
temos nenhum problema em comerciar com vocês, mas, por favor, tenha a
amabilidade de acabar com a Internacional Comunista”[xlviii]
– que servia “casualmente” para impulsionar a propaganda e a luta
revolucionária nos países capitalistas.
***
A propaganda imperialista Ocidental liderada pelos EUA, como
sempre, não deixa de tirar vantagem da confusão. Utilizam-se da experiência
chinesa atual – que, recordemos, é ignorada pela “esquerda” – para afirmar que
Deng contrapôs mecanicamente a troca nos altos cargos decisórios da economia
por “especialistas” e “tecnocratas”. Isto é, querem dizer que os “vermelhos”
seriam marxistas ortodoxos que nada entendem de economia e que apenas os
“especialistas” e “tecnocratas” são capazes de “fazer a economia funcionar”[xlix]
(ou seja, apenas o capitalismo funcionaria e Deng teria reconhecido isso
tacitamente).
Trata-se, evidentemente, de uma profunda distorção da mídia
e dos intelectuais burgueses, que contam com a cumplicidade de Deng por
reforçar indiretamente o mesmo discurso. Em síntese: o que quer o imperialismo
estadunidense com essa disputa ideológica é afirmar que haveria o abandono da
“ideologia marxista” em prol do capitalismo de Estado como forma de afirmar que
esta ideologia “não funciona” e “está superada”. Comparando este discurso com a
aplicação da NEP na URSS e, estabelecendo um paralelo com as reformas de Deng,
tenho a pretensão de ter deixado claro o real motivo do abandono do método
marxista por Deng; e não, como vimos, por ter procurado utilizar-se do
capitalismo de Estado como forma de transição ao socialismo (as diversas
citações de Lenin não deixam a menor dúvida sobre o tema). Naturalmente, os
ideólogos burgueses tentam aproveitar todas as oportunidades para vender o
capitalismo como um sistema eterno, insuperável e preferível; o que está longe
de ser o nosso caso.
***
Há outro problema fundamental também já analisado em A ascensão mundial da China, que versa
sobre a questão ambiental. Os economistas burgueses sempre fazem uma análise
metafísica e utilitária da realidade econômica porque separam economia de meio
ambiente, como se uma coisa não tivesse nada a ver com a outra. Tal “erro”
também é cometido pela burocracia chinesa, que ignora as catástrofes ambientais
de uma economia e de um mercado consumista, que coloca o lucro acima da vida e
das condições de regeneração da natureza.
A
utilização de um capitalismo de Estado que aspire atingir o socialismo deve
estar dentro desta perspectiva – agroecologia, respeito aos ciclos da natureza
e ambientais, busca por outras matrizes energéticas, etc. – tudo isso,
obviamente, terá reflexos sobre a taxa de lucro. Mas o sistema socialista tem o
duplo desafio de superar as forças produtivas do capitalismo ao mesmo tempo em
que respeita a regeneração da natureza e, a longo prazo, entra em harmonia com
ela. Nada disso esteve nas preocupações de Deng ou está, seriamente, nas do PCC
(a não ser em palavras vazias).
***
Com esta discussão não se quer dizer que o que a China
pratica hoje é o capitalismo de Estado proposto por Lenin com os debates da NEP.
Não! Todo este texto é uma tentativa
de nos apropriarmos da experiência chinesa no sentido de, em primeiro lugar,
desmascará-la (pois não conduz o processo da mesma maneira que Lenin e provavelmente terminará no exato oposto
– ou inevitavelmente se confrontará com revoluções futuras tanto na China
quanto em outros países); e, em segundo, aprender com todo este processo, que
envolve “centenas de milhares de pessoas”, muitas das quais, creem sinceramente
estar construindo o “socialismo”.
Dentro desta perspectiva, cabe se perguntar sobre o que
apoiar e não apoiar na China atual? O que incorporar e não incorporar como
“correto” à teoria socialista? A dolorosa experiência chinesa, bem como a
maioria dos processos revolucionários do século XX, demonstraram não ser
possível prescindir de uma etapa inicial de transição ao socialismo, que aqui
procuramos chamar de capitalismo de Estado controlado por um governo
revolucionário – discussão iniciada na URSS da NEP, mas sepultada precocemente.
Outra importante parcela das respostas a estas perguntas foi dada no texto A ascensão mundial da China, e versam,
essencialmente, “sobre a legalização de
sindicatos e organizações operárias independentes do PCC”, além do
impulsionamento entre a “esquerda” e, sobretudo, entre os trabalhadores
chineses, de uma “nova psicologia de massas
para que eles possam assumir seus postos nos organismos coletivos, como
sovietes [se existem ou se ressurgirem],
comunas, cooperativas, associações, órgãos de governo, etc.”; ou seja, o
mesmo que Lenin exigia sobre possibilitar gradativamente a participação, a
contabilidade e o controle popular das empresas e de toda a economia de acordo
com a elevação do nível cultural e político dos trabalhadores.
Devemos,
em essência, militar pela criação das condições em que os trabalhadores
chineses e suas organizações (e também a base do PCC, excluída de qualquer
decisão oficial) possam decidir sobre as políticas oficiais, desde as
econômicas, como as taxas de juros, impostos, política industrial, metas nas
suas empresas, no campo; até as gerais, educacionais, sociais, culturais, etc.
Em caso de negativa – que certamente deverá ocorrer – ir denunciando e
demonstrando o mais amplamente possível todas as contradições sem capitular em
1 vírgula à política oficial do imperialismo ocidental que pretende derrubar o
PCC para restaurar o multipartidarismo burguês e as suas instituições
correspondentes.
6) Perspectivas do capitalismo de Estado chinês que
toma abertamente formas de um perigoso imperialismo “multipolar”
Vimos que o “socialismo com características chinesas” é um
embuste. Trata-se, na verdade, de uma espécie
de capitalismo de Estado que, dado o tamanho do mercado interno chinês, somado
a outros fatores, transformou-se em imperialismo que tende a remodelar o
mercado mundial. Conclui-se a partir desta discussão que a China vive um
capitalismo de Estado que, visivelmente,
não caminha no mesmo sentido da NEP proposta por Lenin. Tende a caminhar pra
trás e ter dois possíveis desfechos:
levar à restauração do capitalismo colonial em novas bases; ou, então, caso a
burguesia sob a asa do PCC se perpetue triunfalmente, ir consolidando-se como
um imperialismo capitalista direto e aberto, embora esse veredicto da história
ainda não tenha sido dado, já que a guerra híbrida entre EUA e China pela
hegemonia no mercado mundial não teve vencedor. A primeira hipótese é reforçada
por “uma forte ala neoliberal do PCC que
sonha com uma conversão do partido em uma espécie de social democracia
ocidental e, ainda por cima, subserviente aos interesses do capital ocidental”[l].
Nos EUA há duas políticas em disputa para lidar com a China:
a dos Republicanos e a dos Democratas. A primeira nos é conhecida: trata-se de
despertar as forças mais reacionárias e atrasadas, impulsionando políticas neofascistas de sabotagem e guerra sob
total controle do deep state; a
segunda tem um discurso aparentemente mais “humanista” e “democrático”, uma vez
que procura dar ênfase à postura expansionista da China, que tende a atacar o
“direito dos trabalhadores” – para isso, basta ver o documentário vencedor desta
categoria no Oscar 2020, Indústria
Americana, que demonstra como age a nova burguesia chinesa (isto é, no
essencial atua exatamente como a burguesia estadunidense quando exporta capital
e fábricas para outros países do mundo – e isso, como era de se esperar, foi
omitido no filme).
Ocultando a ação dessa nova burguesia da China, bem como a
ação das estatais chineses, que vendem a ideia de que estão construindo “novas perspectivas de globalização”, o
PCC tem patrocinado um discurso de que sua ascensão como potência mundial não
causará distúrbio na comunidade internacional, impulsionando um mundo
multipolar (isto é, com vários protagonistas), e que, sedutoramente, cumprirá “estritamente as leis e regulamentações dos
países” que receberem seus investimentos, “assumindo ativamente as responsabilidades sociais correspondentes”[li].
O referido documentário Indústria
Americana, patrocinado pela família Obama, demonstra exatamente o contrário
de tais afirmações.
Apesar
destas perspectivas nada animadoras, cabe aos trabalhadores conscientes
levantarem reivindicações condizentes com o que prega a cúpula do PCC, seja
para que efetivamente venha a cumpri-las (o menos provável) ou, então, para que
seja desmascarada. Tais reivindicações devem ser intercaladas com a denúncia do
papel dos EUA, que é um imperialismo abertamente intervencionista e
hegemonista. Também é necessário aprofundar o debate sobre como aproveitar e
intervir na luta entre EUA e China em prol da construção e benefício de um
movimento operário internacional pautado pela independência de classe.
***
Entre as possibilidades de desfecho para a China, há uma
leve preponderância sobre a tendência dela se transformar abertamente em
imperialista em detrimento da possibilidade de regressar à condição de colônia sob
“novas bases”. Isso se dá desta forma porque o PCC abriga sob sua asa uma
perigosa burguesia que se disfarça de “vermelho”.
Há
justamente aí uma diferença fundamental entre a burguesia da época de Mao
Tsé-tung e a burguesia atual: dessa vez os chineses são senhores de seus próprios
negócios e tem competência para fiscalizar os estrangeiros e seus investimentos[lii].
Por isso, certamente não abrirão mão desta nova condição que lhes foi garantida
pela burocracia stalinista chinesa, constituindo-se num contraditório fruto da
revolução de 1949.
***
Em seu livro A China de
Deng Xiaoping, o representante do departamento de defesa dos EUA e “especialista”
em segurança nacional da China, Michael Marti, sustenta que “o contínuo crescimento econômica da China
se nutre do acesso ao capital e aos mercados estrangeiros, principalmente ao
mercado norte-americano ou os mercados influenciados pelo mercado
norte-americano. Aproximadamente 30% de suas exportações destinam-se
exclusivamente aos EUA. Seria um duro golpe no esforço de modernização da China
se esse comércio fosse interrompido. Por que, então, deveria a América [leia-se:
os EUA] permitir acesso incondicional aos
mercados norte-americanos, ao passo que a China nega o mesmo acesso às empresas
dos EUA?”[liii].
No entanto, o nosso “especialista” não percebeu que se
preparava um turning point na relação
EUA-China. A economia simbiótica que existia entre os dois países está se
separando. O gigantesco mercado interno chinês de 1,4 bilhão de pessoas
acabaria por tragar, inicialmente o asiático e depois o mundial, tal como uma
força centrípeta[liv]; e
Deng não apenas sabia disso, como apostou nisso. A cultura milenar chinesa, que
se refletiu nele, colocou um prazo tímido de 100 anos para este desenvolvimento
econômico e, muito antes disso, os resultados já começaram a ser sentidos: a
Ásia não apenas sentiu diminuir drasticamente a presença norte-americana em
prol da chinesa, como a China passou a estender seus tentáculos para Europa –
reeditando a Rota da Seda –, África e
América Latina.
Apesar disso, a burocracia do PCC teme certas medidas de “alguns políticos americanos”, que
defendem “a ‘teoria de desacoplamento’
entre a China e os Estados Unidos em uma tentativa de cortar artificialmente o
fluxo de capital, tecnologia, produtos, indústrias e de pessoas entre os dois países”,
demonstrando que ainda há certa dependência econômica entre ambos países. A
China quer se tornar a economia de ponta do mercado mundial mantendo os EUA
nele em uma posição secundária. Para tentar evitar esta tentativa de
“desacoplamento”, o PCC critica a “mentalidade
autoritária e dominadora destes políticos norte-americanos”, ressaltando
que “o comércio bilateral de mercadorias
entre a China e os EUA aumentou mais de 250 vezes em comparação com o momento
do estabelecimento de relações diplomáticas, sendo que um total de 72.500
empresas americanas investiu na China. Uma pesquisa de 2019 divulgada pelo
Conselho Empresarial EUA-China mostrou que 97% das empresas americanas sondadas
tiveram lucros no mercado chinês. Os dados da mesma instituição revelam também
que, entre 2009 e 2018, as exportações dos EUA para a China geraram mais de 1,1
milhão de empregos nos EUA. Uma pesquisa recente da Câmara de Comércio
Americana na China indica que 84% das empresas americanas não querem deixar a
China. Desde o início deste ano, empresas como a Exxon Mobil, Honeywell, Tesla
e Walmart expandiram seus investimentos e cooperação na China. Em abril deste
ano, a China voltou a ser o maior parceiro comercial dos EUA. A China e os EUA
embarcando em uma viagem de cooperação win-win é uma necessidade inerente ao desenvolvimento econômico dos dois
países, o resultado do desenvolvimento normal das relações internacionais e o
cenário natural da coexistência pacífica humana”.
É
por isso que a burocracia do PCC reafirma que “na era da globalização econômica, o ‘desacoplamento’ está destinado a
deitar tudo por terra. Quanto terão os EUA de pagar e quantas perdas o mundo
terá de suportar para que seja atingida a meta de dividir à força o mercado
mundial e a cadeia global industrial e de fornecimento?”[lv].
***
Procurando mistificar esta realidade com “roupagem de
esquerda”, Xi Jinping, em um recente artigo (de 16 de agosto de 2020),
classifica o processo da China atual como a aplicação da “economia política marxista”, sustentando que o PCC “enriqueceu a economia política marxista ao
combinar seus princípios básicos com novas práticas de reforma e abertura e
obteve muitas realizações teóricas importantes”[lvi].
Isso, como vimos, é parcialmente verdadeiro. Houveram importantes realizações
teóricas, mas não porque o PCC tenha aplicado a “economia política marxista”, e
sim porque o processo desencadeado, sem as preocupações centrais apontadas por
Lenin, serviram para que pudéssemos refletir sobre os seus resultados (como
tentamos fazer com esta análise). Ou seja, as “realizações teóricas
importantes” se deram pela negativa – ou dito de outra forma: como não fazer.
O artigo de Xi ainda afirma que “diante de uma situação econômica extremamente complicada no país e no
exterior, bem como de fenômenos econômicos variados, estudar os princípios
básicos e a metodologia da economia política marxista é propício para o domínio
de uma abordagem científica para a análise da economia. Além disso, ajuda a
compreender as leis que regem o desenvolvimento social e econômico e a melhorar
a capacidade de administrar uma economia de mercado socialista. (...) Sendo o ponto de vista fundamental da
economia política marxista, a filosofia de que o desenvolvimento é para o povo
deve ser mantida na implantação do trabalho econômico, na formulação de
políticas econômicas e na promoção do desenvolvimento econômico”[lvii].
Como já vimos, não se trata de “socialismo com
característica chinesas” ou de “economia de mercado socialista”. Além disso, tal
“desenvolvimento”, que foi a resultante da aplicação do capitalismo de Estado
chinês, não tem sido em benefício do povo, senão que tem servido como uma luva
aos interesses da nova burguesia chinesa, aumentando assustadoramente as
desigualdades sociais no interior da China e reforçando um nacionalismo
desprezível no PCC que não conserva nada do internacionalismo proletário.
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Pintura de Liu Xiaodong |
7) Trabalhadores do mundo: uni-vos para regulamentar o
mercado mundial e expropriar os grandes oligopólios internacionais!
Sabemos que o mercado mundial dominado pelo imperialismo
norte-americano trabalha pela total desregulamentação econômica, impondo o
dólar sem lastro-ouro para poder imprimi-lo segundo sua vontade política e
repassar livremente a inflação para o resto do mundo. É assim que agiu e age o
imperialismo estadunidense, sem falar na sua política de intervenção militar
direta ou indireta como forma de moldar aliados e combater inimigos que, por
ventura, se oponham às suas pretensões econômicas. Ainda que aparentemente
pretenda restaurar o padrão lastro-ouro do dinheiro e queira dar um fim à farra
da dólarcracia, o poderio econômico
da China não tem servido para regulamentar o mercado mundial, tendo poucas
diferenças se comparado ao papel desempenhado pelos EUA. Se realmente atendesse
aos interesses dos trabalhadores, estaria criando as condições para a
regulamentação do mercado mundial de acordo com esses interesses de classe.
Durante os debates da NEP, Lenin afirmou que o comércio é
uma das formas mais vantajosas e úteis que podem ser utilizadas pelas alavancas
econômicas. Isso o capitalismo, como modo de produção, entendeu e desenvolveu
bem, embora o tenha empregado cada vez mais inescrupulosamente, já que a
liberdade de comércio é utilizada para a especulação – e esta é capaz de gerar
distorções absurdas como uns poucos bilionários num polo e milhares de miseráveis
e esfomeados noutro. Não é casual que durante os debates da NEP Lenin proponha
combater a impunidade da especulação e a reformulação de todas as leis sobre
ela. É precisamente este um dos principais objetivos a serem cumpridos pela
ditadura do proletariado (entendida aqui sempre como Comuna de Paris e não como stalinismo)
e o capitalismo de Estado: regulamentar os mercados internos e, por que não
(?), o mercado mundial. É disto que fogem banqueiros, agiotas e empresários do
mundo todo; seja em Wall Street, na City londrina, na Avenida Paulista ou em
Hong Kong. Regulamentar o mercado é dar um passo importante no sentido do
capitalismo de Estado e, consequentemente, no sentido do socialismo. A China
faz isso? Não, apenas muito pontualmente
no seu mercado interno.
***
Outra característica do mercado mundial que precisa ser
encarada pelo movimento consciente dos trabalhadores é a sua transformação em
reles fantoche dos oligopólios transnacionais. Segundo João Bernardo, hoje “verificamos que grande parte do comércio
que as estatísticas oficiais contabilizam como externo é, na realidade, um
comércio interno, constituído por transações entre matrizes e filiais”; e “esta alteração de perspectivas não ocorre
apenas no plano econômico, mas no político também, porque as fronteiras entre
os países marcam a amplitude da esfera de ação de cada governo”[lviii].
Para João Bernardo, torna-se cada vez mais patente o surgimento do que ele
chama de um “Estado amplo”, controlado pelos monopólios e trustes
internacionais, que não reconhecem os limites das fronteiras e legislações
nacionais, em contraposição ao que ele chamou de “Estado restrito”, que é o
Estado “tradicional”, com suas instituições políticas circunscritas ao
território nacional, mas subordinadas e dependentes deste poder econômico superior.
Assim, ocorre aquele fenômeno bizarro onde uma empresa transnacional tem um PIB
maior do que um Estado nacional, como é o caso da GM em comparação à Bolívia.
Além
disso, os grandes monopólios transnacionais, em conjunto com o Estado nacional
dos países imperialistas, sabota qualquer tipo de tentativas sistemáticas de
desenvolvimento industrial dos países da periferia do sistema. É deste modo que
o centro do mercado mundial, controlado não apenas pelos países imperialistas,
mas por suas respectivas empresas transnacionais – que se tornaram gigantescos
leviatãs –, sabota as periferias, deixando-as condenadas à eterna dependência
econômica como reles mercados consumidores e produtores de commodities. A China, que hoje é um poderoso Estado nacional, não
apenas não combate esta ação perniciosa das grandes empresas transnacionais, mas
em muitos casos ajuda a mantê-las.
Na luta contra as empresas transnacionais, o movimento
operário, mais do que nunca, precisa exercitar o seu internacionalismo
proletário. Devemos escrever na nossa bandeira: regulamentação do mercado mundial para uma justa cooperação
comercial entre os países e expropriação dos monopólios transnacionais que hoje
dominam o mundo, visando distribuir sua riqueza para utilizá-la no desenvolvimento
dos meios de produção sociais necessários para promover o desenvolvimento
econômico das periferias do sistema e não apenas sustentar o seu centro. Provavelmente
o socialismo como “próximo degrau” e “sistema” nasça desta perspectiva
internacionalista.
8) O capitalismo de Estado e o Brasil: algumas
conclusões
Lenin e Trotsky sempre deram a entender que a NEP foi
aplicada em razão da destruição econômica ocasionada pela guerra civil. No
entanto, as afirmações de Lenin nesse sentido entravam seguidamente em
contradição com conclusões que davam a entender que o capitalismo de Estado era
necessário como formação transicional,
independentemente da guerra civil, tal como as passagens que foram citadas abundantemente
nesse texto.
Uma
vez que os debates sobre esta temática foram sepultados de forma precoce na
URSS – e depois mistificados pelos “teóricos” stalinistas –, não sabemos o
desfecho que poderiam ter no desenvolvimento do capitalismo de Estado dentro da
experiência soviética e, consequentemente, na teoria socialista. Partimos do
pressuposto de que todas as experiências históricas levam a crer que ele é um
“degrau” necessário como uma ante-sala do “degrau socialista”, nas palavras de
Lenin. Além da pequena propriedade ainda ser numerosa, esta visão sobre o
capitalismo de Estado complementa e dá certa lógica à proposta de Gramsci sobre
a estratégia socialista para os países ocidentais.
Ainda segundo Lenin, “do
ponto de vista econômico, o capitalismo de Estado é infinitamente superior à
nossa economia atual”[lix].
O mesmo valeu para a China e, com mais razão ainda, vale para o Brasil, que é
um país totalmente controlado pelo capital internacional do centro do mercado
mundial (tal como era o Brasil colônia – 1500-1822). O socialismo só poderá
surgir efetivamente quando superar o capitalismo, que é, por natureza, um
sistema econômico internacional – a encarnação do mercado mundial. Uma economia
isolada e baseada unicamente em planos quinquenais não pode construir o
socialismo, como nos atestou as experiências do século XX. Será necessário uma
troca comercial, cultural e social em um mercado mundial regulamentado e
controlado, que combata sem tréguas a especulação e a sabotagem. Tarefa muito
difícil, mas não impossível, que deve estar na perspectiva programática das
revoluções nacionais. As lições das revoluções russa e chinesa têm muito a nos
ensinar nesse sentido.
É claro que tais conclusões não pretendem ignorar a
realidade concreta e nem dogmatizar a teoria, mas, sim, pensar e buscar um
caminho que coloque muitas das dúvidas e abstrações teóricas em contato com a
realidade.
***
Atualmente, a burguesia brasileira – e grande parte da
mundial – combate qualquer tipo de controle estatal ou popular sobre a
economia. No nosso país vigora o “livre mercado” dos monopólios transnacionais,
que decidem e “planejam” tudo em detrimento do bem estar do povo. Os recursos
naturais e do Estado estão, em primeiro lugar, a serviço da exploração do capital
internacional que se encontra nos países centrais – por isso nosso povo passa
fome e é subempregado –; e em segundo, para subsidiar o empresariado
agroexportador. A burguesia brasileira, capciosa e ardilosamente, associa
controle estatal a “socialismo”. Foi assim que ela classificou os anos dos
governos do PT. Sabendo onde o capitalismo de Estado pode desembocar, ela
intensifica a sua salada de frutas ideológica.
De fato, o petismo interviu em alguns setores da economia,
embora muito timidamente. Quem controlava todo o processo, em última análise,
eram as instituições burguesas e não os trabalhadores, que estavam alijados do
poder e, no sentido de sua emancipação histórica, não eram representados pelo
PT. Ou seja: o “capitalismo de Estado petista” era eleitoral e burguês! A ideologia comunista há muito
tempo havia sido abandonada pelo petismo – que não tomou o poder através de uma
revolução. Seus políticos e teóricos vestiram alegremente a camisa das teorias
burguesas modernas e pós-modernas, além de encarnarem o perfeito defensor das
suas leis, “constituições” e legalidade – ou seja, o PT incorreu no erro
criticado por Lenin na aplicação da NEP a quase 100 anos atrás.
Assim
sendo, fez muito pouco (quase nada) e inevitavelmente terminou alijado do poder
quando a crise internacional exigiu que os recursos do Estado fossem
integralmente drenados para o sistema financeiro e para subsidiar o agronegócio
– isto é, para as commodities que
garantem as matérias-primas para o centro do sistema. Aí surge o “bolsonarismo”
e o neofascismo brasileiro,
comprometidos com a destruição dos resquícios de “Estado de bem estar social”
(CLT, previdência, “bolsas-famílias”, etc.). Além disso, o “bolsonarismo”
queria retirar o Brasil da área de influência de China e Rússia, para
colocá-lo, novamente, sob a asa da águia de rapina estadunidense. A longo
prazo, o agronegócio tenderá a se converter no principal aliado do
“imperialismo chinês” dentro do nosso país – e este é todo o desespero por
parte da burguesia ianque. Daí advém não apenas o caráter “imperialista” da
economia chinesa, mas também o seu lado reacionário e anti-socialista para o
nosso país.
A
revista China Today comemora o fato
de que “Brasil e China criaram uma relação
de interdependência que precisa ser aprofundada”. E ainda aponta que “a parceria do agronegócio brasileiro
com a China, que começou no comércio e evoluiu para os investimentos, chegou a
um grau de importância para as duas economias do qual não dá para recuar.
(...) Além do comércio nos dois sentidos,
também estão na agenda de estreitamento dessa relação: aporte de capital chinês
em infraestrutura, inclusive logística de transportes, cooperação em tecnologia
e inovação, bem como na agricultura, ampliando a eficiência da produção dentro
e fora das propriedades rurais. Até mesmo no complexo grãos e carnes, o forte
dessa parceria, existem brechas para serem exploradas, assim como em produtos
ainda de pouca presença no mercado chinês – café, açúcar e algodão. (...) ‘Nos próximos dois anos, a China continuará
absoluta nas nossas compras externas. Hoje, 85% do que o Brasil importa da
China são manufaturados, e quase 100% do que exportamos são commodities’,
acrescenta José Augusto de Castro, presidente-executivo da Associação de
Comércio Exterior do Brasil.”[lx].
Ou
seja, a relação com o “imperialismo chinês” prega a manutenção do Brasil como
país exportador de commodities e
matérias primas; o mesmo papel que sempre cumpriu no mercado mundial sob
distintos imperialismos.
***
Os partidos burgueses do país (do PSDB ao “Novo”), por sua
vez, estão integralmente comprometidos com a manutenção do Brasil na periferia
do sistema, garantindo o Estado como fiador do setor agroexportador, bem como a
farra dos juros que dão lucros estratosféricos ao sistema financeiro. Em sua
maioria, defendem a submissão ao imperialismo estadunidense, embora já vejamos
setores da elite inclinados à China (como Dória, Rede Globo, dentre outros). Em
síntese: seja na submissão aos EUA ou na submissão chinesa, todos são
criminosos lesa-pátria, pois entregam os recursos do Estado e a riqueza
nacional ao centro do mercado mundial a preço de banana, deixando o país
desassistido, dependente e subdesenvolvido conscientemente!
Isto explica grande parte da situação econômica e social do nosso país. É precisamente
isso que a direita entende por “modernização” e “empreendedorismo”: a “gestão”
do subdesenvolvimento nas periferias para garantir o desenvolvimento do centro
do mercado mundial.
A “esquerda” nacional, por sua vez, oscilando do oportunismo
reformista mais desavergonhado até o sectarismo mais tacanho, fica presa aos
dogmas oficiais e à hipocrisia reinante, não conseguindo (ou não querendo) renovar
seus métodos e desenvolver uma nova prática que leve em consideração tudo o que
foi debatido até aqui. Segundo Lenin, “nós,
com frequência voltamos a cair neste raciocínio: ‘o capitalismo é o mal, o
socialismo o bem’. Mas esse é um raciocínio errado, pois esquece todo o
conjunto das formações econômico-sociais existentes, destacando apenas duas
delas”[lxi]. Saber
extrair tudo o que há de bom num sistema econômico para incorporá-lo, superando-o, no sistema econômico que
nos cabe construir, o socialismo, é parte fundamental da nossa tarefa histórica
– Marx e Engels já apontaram inúmeras vezes a necessidade de superar o
capitalismo e não retroceder para antes dele (estas são, precisamente, as
condições que “herdamos das gerações passadas” e, para as quais, os dois tanto
chamavam a atenção).
Para
Lenin, estas conclusões dicotômicas de bem
X mal não ocorrem por sermos fortes e inteligentes, mas “por sermos fracos e idiotas”. Ele ainda
acrescenta que “tememos olhar cara-a-cara
a ‘verdade vil’ e nos entregamos com demasiada frequência à ‘mentira que nos
exalta’. Sempre caímos na afirmação de que ‘nós’ estamos passando do
capitalismo ao socialismo, esquecendo-nos de definir com exatidão e clareza
quem somos ‘nós’. É necessário levar em conta a relação de todos os elementos
integrantes – absolutamente todos, sem exceção – das diversas formações sociais
de nossa economia. E para que ‘nós’ possamos resolver com êxito a tarefa da
passagem imediata ao socialismo, é necessário compreender quais são os
caminhos, os métodos, os recursos, os
elementos intermediários necessários para a passagem das relações
pré-capitalistas [e capitalistas] para
o socialismo. Este é o ponto nodal da questão”[lxii].
Além
disso, Lenin já havia assinalado no célebre Esquerdismo:
doença infantil do comunismo, que “podemos
(e devemos) empreender a construção do socialismo não com um material humano
fantástico, nem especialmente criado por nós, mas com o que nos foi deixado de
herança pelo capitalismo. Não é necessário dizer que isso é muito ‘difícil’;
mas, qualquer outro modo de abordar o problema é tão pouco sério que não deve
nem ser mencionado”[lxiii].
Estas
conclusões impõem uma inevitável ruptura com aquela prática militante que
incentiva “um espírito sectário e dogmatizante, embalado num verbalismo
revolucionário que dissimula a perda de noção da realidade” – isto é: a
transformação dos militantes em “religiosos socialistas” e não em “cientistas
militantes”. Temos que retomar esta noção de realidade encarando-a tal como ela
é; e desenvolver nosso programa, nossa teoria e prática, em cima dela, sem medo
de encará-la, de errar e começar de novo. Trata-se, principalmente, de
atualizar os desafios para as novas condições da luta de classes que
“herdamos”, visando, como disse Fernando Claudín, “ganhar as massas proletárias para uma política revolucionária em
condições não revolucionárias” – que tem sido uma realidade costumeira no
Brasil deste início de século.
Olhemos pra trás e, separando o joio do trigo, extraiamos
tudo o que pode ser extraído do século XX! Porém, insistentemente um estranho
nos cutuca o ombro. Ao virarmos de frente, topamos com o século XXI: olhemos
para ele com confiança, criticidade e, sobretudo, criatividade...
NOTAS
[i] Ver:
https://lutacontinuablog.blogspot.com/2020/04/repensar-o-socialismo-o-que-e-transicao.html?m=1
[ii] MARX, Karl. O capital –
crítica da economia política. Livro 1, o processo de produção do capital.
Editora civilização brasileira, Rio de Janeiro, 2002 (página 177).
[iii] LENIN, Vladmir Ilich. O
desenvolvimento do capitalismo na Rússia. Coleção “Os Economistas”, Editora
Abril Cultural, São Paulo, 1982 (página 372).
[v] MAO TSÉ-TUNG. Sobre a
ditadura do proletariado, 30 de junho de 1949; incluído no tomo IV das Obras
escolhidas, edição chinesa, em francês (página 442). Citado em CLAUDÍN,
Fernando. A crise do movimento comunista. Editora Expressão Popular, São Paulo,
2013 (página 653).
[vi] CLAUDÍN, Fernando. A
crise do movimento comunista. Editora Expressão Popular, São Paulo, 2013
(página 361).
[vii] HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos – o breve século XX, 1914 - 1991.
Companhia das Letras, São Paulo, 2006 (página 455).
[viii] Ver: https://www.marxists.org/portugues/rodrigues/1988/02/fim.htm
[x] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping. Editora Nova Fronteira,
Rio de Janeiro, 2007 (página 185).
[xii] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping. Editora Nova Fronteira,
Rio de Janeiro, 2007 (página 136).
[xv] TROTSKY, Leon. A Revolução Traída. Editora Instituto Joséu Luís e Rosa
Sundermann, São Paulo, 2005.
[xvi] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (páginas 156 e 157).
[xvii] Idem (páginas 193 e 200).
[xx] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (página 53).
[xxiv] Idem (páginas 38 e 39).
[xxvi] Idem – extraído diretamente do artigo de Lenin, “Sobre o imposto em
espécie – o significado da NEP e suas condições” (páginas 159, 160, 161 e 163).
[xxvii] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (páginas 189, 190 e
193 – negritos meus).
[xxviii] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping – o homem que pôs a China
na cena do século XXI. Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2007 (páginas 2
e 3).
[xxxi] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping – o homem que pôs a China
na cena do século XXI. Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2007 (página 139).
[xxxiii] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (páginas 40 e 41).
[xxxv] Idem (páginas 40 e 41).
[xxxvii] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (página 16).
[xli] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (página 152).
[xlv] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (páginas 200, 202 e
203).
[xlviii] CLAUDÍN, Fernando. A
crise do movimento comunista. Editora Expressão Popular, São Paulo, 2013
(página 703).
[xlix] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping – o homem que pôs a China
na cena do século XXI. Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2007 (ver página
273 e outras).
[li] Revista China Hoje –
edição brasileira de China Today – ano 5, nº29, fevereiro e março de 2020 –
Editora Segmento – Editorial China hoje (páginas 9 e 47).
[lii] MARTI, Michael E. A China de Deng Xiaoping – o homem que pôs a China
na cena do século XXI. Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2007 (ver página
229 e 230).
[lviii] BERNARDO, João.
Transnacionalização do capital e fragmentação dos trabalhadores – anda há lugar
para os sindicatos? Boitempo Editorial, São Paulo, 2000 (página 39).
[lix] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (página 147).
[lxi] A Nova Política Econômica
(NEP), capitalismo de Estado – transição – socialismo. De vários autores,
dentre eles Lenin, Trotsky, Valentino Gerratana. Organizado e traduzido por
BERTELLI, Antonio Roberto. Global Editora, São Paulo, 1987 (página 165).
[lxii] Idem (páginas 163 e 164 –
negritos meus).
[lxiii] LENIN, Vladmir. Esquerdismo, doença infantil do comunismo. Editora
Expressão Popular, São Paulo, 2014.
Post-Scriptum: há um certo
parentesco de ideias entre as que foram desenvolvidas nesse texto e as que
foram expressas por Christian Dunker neste outro:
https://blogdaboitempo.com.br/2020/08/12/por-uma-esquerda-que-nao-odeie-o-dinheiro/