Publicamos abaixo, na íntegra, a tese da corrente Construção pela Base, apresentada ao X Congresso do CPERS, que foi realizado em setembro de 2019 em Bento Gonçalves (RS). Consta como a tese de número 1 do caderno publicado para este congresso. O blog Consciência Proletária teve participação importante na sua elaboração, por isso julga-se no dever de republicá-la.
Refundar o CPERS: por um novo sindicalismo organizado pela base e com uma estratégia socialista
1.
A
maior parte da nossa categoria está insatisfeita com o CPERS. Os interesses da
base não se expressam no nosso sindicato, que fala uma língua diversa da que se
fala no chão da escola. Isso se dá desta forma porque o sindicalismo praticado
pelo CPERS é de cúpula e atrelado ao Estado burguês, ficando de costas para as
reais necessidades dos trabalhadores, utilizando-se, até mesmo, de práticas
autoritárias contra ativistas e minorias. Assim, muitos colegas,
equivocadamente, querem “punir” o sindicato desfiliando-se e não participando
dele.
Hegemonizado por correntes sindicais
burocráticas e reformistas, sustenta-se numa maioria de aposentados e numa
visão da categoria que não corresponde mais à realidade vivida nas escolas.
Impera a politicagem burguesa e os acordos de bastidores entre estas correntes.
Se por um lado devemos reconhecer a importância das gerações passadas na
construção do CPERS (como os aposentados); por outro, temos que perceber que a
realidade mudou drasticamente e que se faz necessário uma mudança profunda na
condução do nosso sindicato. Para isso, é fundamental rever a estratégia
política que dá sustentação ao sindicalismo praticado até aqui e, sobretudo,
suas ligações com o Estado, o que praticamente transforma o nosso sindicato em
uma empresa privada e não mais em um instrumento de mobilização, conscientização
e construção de movimentos sociais.
Todas estas críticas e análises já
foram apresentadas nas teses da Construção
pela Base inscritas nos Congressos de 2013 e 2016, além de divulgadas nas
campanhas eleitorais de 2014 e 2017 para a direção central. Toda esta produção
teórica, alicerçada numa prática sindical dentro do CPERS de mais de dez anos,
está sintetizada no nosso blog (www.construcaopelabase.blogspot.com).
Julgamos estas contribuições importantes para a criação de um novo sindicalismo
capaz de enfrentar a conjuntura de esgotamento do capitalismo e de ascensão da
direita neofascista no Brasil e no mundo.
2.
A
atual direção do CPERS é composta por uma aliança entre PT, PCdoB, PDT e PP e
as centrais CUT-CNTE e CTB. Não se trata de espalhar preconceito contra a
organização em partido e corrente sindical, tal como faz o proselitismo da
maioria das correntes sindicais e ativistas do CPERS. Reconhecemos a
importância das correntes sindicais e dos partidos e a legitimidade de se
organizar, bem como daqueles que querem se manter independentes. Nossa crítica
se refere ao programa, atuação e à política dessas organizações; em suma: à sua
prática e, sobretudo, às suas consequências sobre a conduta do CPERS.
As
alianças feitas dentro do nosso sindicato não correspondem a princípios e ao
resultado de uma prática sindical conjunta, mas às necessidades de dominação do
aparato sindical e, portanto, à formação de maiorias artificiais que garantam
este domínio. Nesse sentido, não se diferem em nada do que acontece na política
burguesa tradicional dentro do Congresso Nacional. O Conselho Geral e os
Congressos do CPERS se caracterizam exatamente por isso. A base da categoria
sente a politicagem burguesa intuitivamente de distintas formas. Muitas vezes
suas conclusões estão certas, mas suas declarações e ações (como a
desfiliação), equivocadas e simplistas. Grande parte das polêmicas internas do
CPERS, escondidas sob sete chaves, teria um importante papel para a formação
política e sindical da categoria.
A
burocracia sindical, ao contrário disso, aposta na diplomacia secreta, sem
abertura de questões e polêmicas fundamentais à base. Este tipo de diplomacia
destrói qualquer confiança, exigindo dissimulação, hipocrisia e ocultamento de
posições. É assim que a burocracia sindical desta e de outras direções do CPERS
tem “educado” a base da nossa categoria. O aparato sindical é usado para
esmagar minorias, impor posições e sustentar o regime democrático-burguês. Esta
é a morte de qualquer mobilização real e concreta vinda da base; e a fonte da
sabotagem de qualquer luta independente, gerando antipatia e transformando o
CPERS numa verdadeira Torre de Babel (ou, como alguns preferem, numa “luta
fratricida”).
Um método burocrático nefasto tem
caracterizado esta direção central (embora tenha sido praticado sutilmente por
outras): o engavetamento de propostas aprovadas em assembleias e conselhos
gerais, bem como a aceitação de propostas em instâncias sindicais, para não
fazer nada por elas na prática. Ou ainda pior: assume como suas propostas que
antes eram combatidas, também para não fazer nada por elas.
O Sineta,
o site e a página no facebook, por exemplo, são usados inescrupulosamente para
fazer propaganda política da atual direção, sem a menor preocupação com a
organização de base, a orientação para um trabalho com os representantes de
escola e a diversidade de opiniões. A burocracia dirigente pratica com os órgãos
de imprensa do CPERS a mesma política que critica na mídia burguesa; qual seja:
monopólio, distorções e autopropaganda para favorecer apenas a sua fração
política.
3.
O
sindicalismo estatal, legalista-burguês e baseado na diplomacia secreta, sem
organização e intervenção da base, é praticado pela maioria esmagadora das
correntes sindicais do CPERS, embora tenha sua expressão máxima na atual
direção central. Esta forma de proceder está baseada numa concepção de mundo
reformista, expressa, principalmente, na estratégia democrático-popular, defendida explicitamente pelo petismo, e de
forma não admitida (ou sob outros nomes) por grande parte da “esquerda”.
Esta
estratégia se caracteriza por fazer alianças políticas com a “burguesia
progressista” para desenvolver o capitalismo no Brasil e fazer mudanças “a
favor do povo” por dentro das instituições democrático-burguesas (presidência
da República, Congresso Nacional, justiça burguesa, etc.). Sendo assim, seria
fundamental buscar alianças com esta burguesia, que se traduziria em acordos
espúrios e sem critérios com partidos burgueses e empresários que permitiriam a
chegada ao poder e garantiriam a governabilidade.
Seguindo
esta estratégia, PT e a CUT sofreram profundas metamorfoses burguesas ao longo
da década de 1980 e 1990, expressas pelos seus congressos. Após um terrível
processo de adaptação e cooptação, que o levou a distorcer e tornar aceitável
para burguesia termos como “revolução” e “socialismo” nas resoluções do seu 7ª
Encontro Nacional, em 1990, o PT passou a sustentar abertamente a necessidade
de uma “etapa democrática” de “acumulação de força”. Então, muitos teóricos,
dirigentes e militantes do PT passaram a esconder o objetivo socialista atrás
da palavra “democracia”. Iniciou-se com o “socialismo democrático” (para,
corretamente, se diferenciar dos regimes stalinistas), mas degenerou na
“radicalização da democracia”, o que, dentro de todo o contexto, só tem um
significado: radicalizar a democracia burguesa. Ora, defender o capitalismo e o
Estado democrático (burguês não declarado) e, ao mesmo tempo, a “distribuição
de renda” é uma contradição absurda. A lógica central do “Estado democrático”
assentado em uma economia capitalista é justamente possibilitar que uma classe
concentre renda, e não distribua.
O
resultado dessa brilhante estratégia, já criticada inúmeras vezes, foi a
aliança com a direita que preparou as bases para o golpe de 2016, pavimentando o
caminho para ascensão do neofascismo de Jair Bolsonaro et caterva.
4.
A
história do Brasil é marcada por mudanças pelo alto, caracterizada por acordos
entre as elites, que se sintetiza na conhecida frase de um político mineiro
durante a Revolução de 1930: “façamos a
revolução antes que o povo a faça”. Alguns autores chamam este processo de
“modernização conservadora”. A burguesia brasileira se adaptou às práticas dos
modos de produção pré-capitalistas, preservando não apenas o latifúndio
introduzido pelos portugueses, mas a escravidão, que durante o Império conviveu
com formas de trabalho assalariado. Defende a meritocracia, mas ela própria não
é meritocrática, impondo o clientelismo e o nepotismo mais desavergonhado. Fala
em “liberalismo econômico”, mas trabalha febrilmente pela total
desindustrialização do país e pela entrega de seus recursos naturais. Não
possui nenhuma política protecionista visando o bem da economia nacional e das
condições de vida do povo (ao contrário, só protege o que diz respeito a sua
própria produção). Usa o orçamento federal como moeda de troca com o sistema
financeiro, endividando-se eternamente através da dívida pública e sabotando
qualquer tipo de desenvolvimento social e econômico do país. Está satisfeita
com a sua condição de produtora de comodities
e matérias-primas.
Sendo
assim, não existe burguesia progressiva no Brasil que seja capaz de empreender um capitalismo autônomo para
desenvolver o país, tal como quer a estratégia petista. Evidentemente que os
governos do PT são mais progressivos do que a direita tradicional, uma vez que com
esta última se trata de um entreguismo puro ao imperialismo. A experiência dos
governos petistas, pautada por um suposto “nacional-desenvolvimentismo” a
partir das estatais (Petrobrás) e dos bancos públicos, além da aliança com as
empreiteiras (as representantes da “burguesia progressista”), levou-os a
disputar recursos públicos com a burguesia agro-exportadora, que mantém
profundos laços com o imperialismo norte-americano e europeu. Em tempos de
“vacas gordas” isso foi tolerado. Daí vieram os programas sociais e algumas
iniciativas de desenvolvimento de uma suposta indústria nacional (aviação,
estaleiros, frigoríficos, etc.). Bastou a marolinha de Lula se transformar em
tsunami para que a crise capitalista acelerasse o processo de derrubada do
governo Dilma, visando a retomada total do aparato de Estado para manter o
orçamento federal sob seu controle. A fraudulenta operação Lava-Jato –
defendida vergonhosamente por grande parte da “esquerda”, inclusive pelo PT –
foi a espinha dorsal da estratégia da direita para derrubar os governos
petistas.
Em
síntese: o reformismo levou novamente os trabalhadores a um beco sem saída e à
ascensão da direita neofascista. A estratégia democrático-popular foi sintetizada por Lula, no seu discurso antes
da prisão, da seguinte forma: “Eu
acredito na justiça. Se eu não acreditasse na justiça eu não teria criado um
partido político, eu teria organizado uma revolução”. Evidentemente que
Lula se refere aqui à justiça burguesa, inalterada desde a época imperial e
hoje liderada por Sérgio Moro.
A
CUT tratou de aplicar esta estratégia ao movimento sindical. A aliança política
que compõe à direção central do CPERS hoje, bem como a sua prática, é o retrato
dela. Partidos como PCB, PCdoB e grande parte do PSOL seguem a mesma lógica sem
assumir. A outra parte do PSOL e o PSTU chamam esta estratégia de “revolução
democrática”, alterando-a em pequenas partes.
5.
Esta estratégia cria táticas, teorias e
projetos paternalistas, de estrito controle sobre as massas, e faz os
trabalhadores esperar passivamente um líder, uma política salvadora ou mesmo um
messias. Basta assinalar que grande parte da categoria possui inúmeras ilusões
na justiça burguesa, confundindo luta sindical com ações na justiça ou com a eleição
de um novo candidato “progressista”. É assim que o CPERS tem educado a nossa
categoria. O “trabalho de base” e a “formação” da maioria das correntes do
CPERS (e, sobretudo, da direção central) reforça esses sentimentos de
dependência e, ao mesmo tempo, impotência nos trabalhadores. Não é necessário
desenvolver o quanto isso é prejudicial para a luta sindical e política,
favorecendo os nossos inimigos de classe.
Um sindicalismo novo precisa abolir
esta concepção e este tipo de “trabalho de base”, substituindo-o por uma que
organize os trabalhadores por local de trabalho, leve em consideração seus
anseios, combata a diplomacia secreta, cobre os educadores de base dos seus
deveres, mas sempre dando o exemplo antes para que se supere esta mentalidade
paternalista e legalista.
6.
A situação internacional está marcada
pela ascensão da direita neofascista em vários países do mundo, inspirados
pelas posições reacionárias e desprezíveis da ala imperialista liderada por
Donald Trump e o seu Tea Party (a
direita radical do Partido Republicano); e pela guerra comercial e híbrida que
ele trava contra China e seus satélites, dentre os quais está a Venezuela.
Atualmente o mundo se divide entre a disputa imperialista de EUA e parte da
Europa, de um lado; e China, Rússia e seus aliados regionais, de outro. Os
governos do PT e os governos chavistas da Venezuela se alinharam ao
“imperialismo” chinês e russo, enquanto a direita brasileira se alinha
totalmente ao imperialismo norte-americano.
A fase do capitalismo em que era
possível fazer concessões aos trabalhadores, sobretudo através do Estado de bem estar social, foi
definitivamente sepultada com a crise econômica de 2008. O capitalismo não tem
condições de gerar bem estar para o povo, trabalhando para retirar direitos
mínimos que antes eram a vitrine dos economistas e intelectuais burgueses na
sua comprovação da “superioridade do capitalismo sobre o socialismo”. Após a
restauração do capitalismo na União Soviética (URSS), leste europeu, China e
Cuba, se abriu uma ofensiva política, econômica e ideológica que destruiu
grande parte das organizações operárias. A URSS, com todos os seus problemas,
representava um contrapeso e um freio às ambições dos países imperialistas
(EUA, Inglaterra, França, Alemanha e Japão), que precisavam fingir-se
preocupados com os direitos dos trabalhadores para que estes não voltassem seus
olhos para o socialismo. Uma vez que esta “ameaça” não mais existe graças à restauração
capitalista patrocinada pela própria burocracia soviética, o imperialismo
viu-se, então, com as mãos livres para iniciar uma cruzada contra os direitos
elementares dos trabalhadores, no que ficou conhecido como reestruturação produtiva. A reincorporação da Rússia e da China ao
mercado mundial deu um fôlego de algumas décadas para o capitalismo, que
trabalhou febrilmente pela desregulamentação total do mercado financeiro,
gerando capitais fictícios trilionários que desencadearam a crise econômica de
2008.
7.
Um
dos principais sintomas do esgotamento do modo de produção capitalista é a lei
da queda tendencial da taxa de lucros, já prevista por Marx há quase 2 séculos.
Com o aumento do uso de tecnologia e a diminuição física do proletariado, o
capital constante (expresso nos gastos com as máquinas e as matérias-primas)
tende a aumentar; e o capital variável (expresso nos gastos com salários e,
também, de onde provém o lucro) tende a diminuir. De onde, então, a burguesia
compensa esta tendência à queda da taxa de lucro? Do inimigo número 1 dos
neoliberais: da intervenção do Estado! O tesouro nacional funciona como uma
espécie de fiador do capital financeiro geral; isto é, como o pressuposto do
lucro privado. Nesse caso eles se tornam os maiores defensores da intervenção
do Estado na economia.
O
imperialismo e seus organismos financeiros (FMI, Banco Mundial, Troika, dentre outros) impuseram, então,
ajustes fiscais em vários países do mundo visando garantir que o orçamento dos
Estados seja destinado ao pagamento dos juros das dívidas públicas e, portanto,
aos bancos, grandes empresas e monopólios imperialistas. As dívidas públicas
cresceram ao ponto de se tornar uma escravidão monetária do Estado (inclusive
nos EUA). O número de miseráveis, desempregados e subempregados aumenta
assustadoramente no mundo todo, na mesma proporção em que cresce a fortuna de
uns poucos bilionários. Os encargos sociais dos Estados em praticamente todos
os países se tornaram obstáculos para essa apropriação privada dos orçamentos
públicos. Foi nisto que o capitalismo se tornou: o Estado transfere para os
grupos privados uma parte da mais-valia que gera ou de que se apropria através
dos impostos ou da tomada dos recursos naturais; com isso, aumenta a taxa de
lucro do setor privado (em especial das multinacionais imperialistas) e aparece
como um fator decisivo para contrabalançar a lei da queda tendencial da taxa de
lucros. Este é o pano de fundo que explica o ataque ininterrupto e brutal
contra os direitos trabalhistas em todo o mundo.
O
esgotamento do capitalismo tem gerado guerras híbridas, que misturam elementos
de guerra real com guerra psicológica, propagandística e comercial em distintos
países do mundo, mas em particular, na Venezuela, que se tornou o epicentro do
nosso subcontinente nos últimos meses, com criminosos bloqueios comerciais e
financeiros, inclusive tencionando por uma intervenção imperialista
estadunidense direta (fato que, felizmente, ainda hoje não aconteceu). O claro
objetivo do imperialismo é se apropriar do petróleo do povo venezuelano com
finalidades de especulação financeira sobre o preço do barril para se contrapor
à China e à Rússia, mas se esconde atrás de uma campanha midiática sobre a
“crise gerada pelo próprio governo”, ocultando seu papel decisivo nela.
8.
O
governo de Donald Trump expressa a decadência do capitalismo e, em particular,
do imperialismo norte-americano, endividado até a medula com a China,
possuidora das maiores reservas cambiais de dólares do mundo. O único trunfo do
imperialismo estadunidense é o seu monopólio sobre a emissão de dólares e a
capacidade de valorizar ou desvalorizar sua moeda de acordo com seus
interesses. China e Rússia, por sua vez, herdaram a força política e econômica
atual do que foi desenvolvido quando eram Estados Operários que “caminhavam em
direção ao socialismo”. Apesar de China ter uma política menos ofensiva do que
a norte-americana no plano internacional, pretende controlar países, fontes de
matéria-prima e rotas comerciais, não deixando de desenvolver uma política
“imperialista”. O seu proletariado – o maior do mundo – vive uma semi-escravidão.
Esta disputa pelo mercado mundial entre EUA e China tem caracterizado a
conjuntura mundial atualmente.
As
necessidades do sistema financeiro, dentro desse contexto, explicam o avanço em
todo o mundo contra os direitos trabalhistas e os serviços públicos. Como os
governos reformistas que apostam nas instituições da democracia burguesa não
conseguem aplicar os planos de ajuste fiscal com a rapidez exigida pela
burguesia imperialista, golpes diretos ou indiretos foram dados em vários
países para colocar no poder partidos ou movimentos de caráter neofascista,
capazes de impor o ajuste fiscal por vias “democrática” ou, se necessário for,
pela mão autoritária do fascismo.
9.
Os
ataques do capital contra os povos do mundo tem gerado mobilizações
semi-espontâneas dos trabalhadores, que tendem a rechaçar todos os partidos e a
institucionalidade, além de ocorrer por fora dos sindicatos e centrais oficiais,
mas que sem direção revolucionária correm atrás da própria cauda. Cabe um
destaque para o movimento dos coletes amarelos na França, caracterizados por
juntar diversos setores sociais, desde a classe média, que tende a misturar
reivindicações progressistas e reacionárias, até trabalhadores precarizados e
imigrantes (como os “coletes negros” que lutam por direitos civis). Os coletes
amarelos seguem uma tendência iniciada em 2011 com a “primavera árabe”, os
indignados, o Occupy Wall Street e as
manifestações de 2013 no Brasil. As burocracias sindicais não apenas não querem
compreender estes movimentos, mas agem como seus piores inimigos, trabalhando
para caluniá-los e trazê-los para o leito morto da institucionalidade burguesa.
Compreendemos
que estas mobilizações semi-espontâneas não podem vencer o capital e os seus
ataques devido à crise de direção e a falta de um programa socialista, mas
apontam tendências que a esquerda e o movimento sindical combativo devem
observar atentamente. Sem apontar a perspectiva de uma direção e de um programa
revolucionário para estas manifestações, elas tendem a desperdiçar energia e
oportunidades, abrindo caminho para o neofascismo. A nossa tarefa deve ser
politizá-las dentro da perspectiva revolucionária e combater o apoliticismo
espontaneísta e aqueles que querem levá-la para dentro da institucionalidade
burguesa. Tal como a “greve dos caminhoneiros” do Brasil (na verdade um
locaute), os coletes amarelos podem ser facilmente manipulados pelos setores
organizados da classe média (interessada em aumentar seus rendimentos às custas
de reivindicações gerais de classe de cunho socialista).
10.
A
política do PT de programas sociais gera uma disputa com a burguesia
imperialista e nacional pelos recursos do Estado. Em épocas de expansão
econômica é possível aumentar a trilionária “bolsa banqueiro, empresário e do
agronegócio”, ao mesmo tempo em que se garante a esmola do bolsa família, do
ProUni, do Pronatec, etc. Porém, em épocas de crise internacional, a burguesia
exige através de “reformas” a totalidade desses recursos para tentar contrabalançar
a queda tendencial da taxa de lucros.
O
neofascismo é um movimento criado pelo imperialismo decadente, os EUA e seus
satélites, para a manutenção do seu domínio mundial e dos seus mercados,
ameaçados por China e Rússia. Assume variadas formas de acordo com os seus
interesses geopolíticos. Assemelha-se ao fascismo clássico pelo terrorismo de
Estado ou pelo terrorismo mercenário, pela xenofobia, racismo e um
conservadorismo radical. Como todo fascismo, é um movimento antiproletário e
anticomunista, embora o proletariado venha de profunda derrota. O neofascismo é
o abre-alas da burguesia imperialista, usado quando necessário para concretizar
suas políticas econômicas. Apesar de disseminar ódio, preconceito, fake news, dando justificativas para
guerras, assassinatos e ditaduras militares, pode conviver com instituições
democrático-burguesas. O bolsonarismo é a aplicação desse neofascismo no
Brasil. O seu discurso a favor da ditadura militar não deixa de conviver com o
Congresso Nacional, embora seja sempre uma possibilidade a nos espreitar. O neofascismo
se caracteriza também pela manipulação através da divulgação de fake news nas redes sociais, cujos
assessores são técnicos utilizados pelo imperialismo. Elas ajudam a espalhar e
consolidar o irracionalismo, uma vez que a hipnose da massa necessita deste
controle a partir do ódio, do sadomasoquismo e do medo.
O
discurso contra o socialismo e o comunismo é parte fundamental desta campanha,
que tenta lançar um preconceito prévio entre a população contra estes sistemas
econômicos e suas teorias (os únicos que podem por fim ao caos do esgotamento
do capitalismo), ao mesmo tempo em que classifica qualquer intervenção estatal
na economia ou mesmo a existência de direitos trabalhistas mínimos como
“comunismo”. O golpe de 2016 intensificou esta confusão caótica, apoiada pela
grande mídia, culminando na eleição de Jair Bolsonaro à presidência da
República. As diversas organizações da direita brasileira levaram massas da
classe média para as ruas visando demonizar o PT e toda a esquerda, preparando
as condições para a eleição do governo neofascista de Bolsonaro e lhe dar as condições
de implementar o ajuste fiscal integralmente, salvando, assim, não apenas os
interesses do imperialismo, mas também os pequenos privilégios da elite
nacional e da classe média. Para isso, se utilizaram de métodos de manipulação da
psicologia de massas, o ódio sádico, o irracionalismo, suas emoções infantis; os
quais a “esquerda” sequer compreende (e muitas vezes nem quer), mantendo o seu
velho discurso padrão estéril ou oportunista.
O
sindicalismo praticado pelo CPERS, pelas centrais, demais sindicatos e por
quase toda a “esquerda” não consegue fazer frente a esse fenômeno político,
resultando no aumento do caos que prenuncia novas derrotas, perda de direitos,
sem novas conquistas. É preciso ter a coragem de questionar certos dogmas e
ousar novas tentativas de mobilização, organização, agitação e debates
teóricos.
11.
Aqui
no RS, o governo Leite (PSDB e comparsas) se alinha com a direita neofascista
de Bolsonaro e Dória (SP). Tem agido de forma muito mais rápida e articulada do
que o governo Sartori (MDB). Aproveitando-se da sua imagem e surfando na onda
do neofascismo desencadeada pela direita, pela mídia, pela conjuntura mundial e
pela inoperância da “esquerda”, destruiu a licença prêmio num passe de mágica e
atropelou a necessidade de plebiscito para privatizar o patrimônio público,
como a CEEE e a Sulgás. Leite continua e aprofunda a política de parcelamento e
atraso salarial, além de trabalhar duro no sentido da terceirização do serviço
público e da destruição da Previdência. Os contratados vivem uma verdadeira
ditadura na SEDUC e nas CREs, perdendo carga horária, sendo removidos ou
demitidos, inclusive em licença saúde. O novo ataque é a imposição de contratos
e convocações por tempo determinado, tal como a situação da categoria “O” de
São Paulo. A tendência dos governos do PSDB tem sido reprimir brutalmente os
movimentos sociais, tal como Marchezan Jr. fez com os municipários de Porto
Alegre.
A
direção central do CPERS sustentou que “Sartori
foi derrotado”. Não! Nós fomos derrotados por ele, embora Sartori tenha
sido derrotado eleitoralmente por
Leite. Continuaremos sendo derrotados se esta compreensão eleitoreira e o
sindicalismo burocrático persistirem. O rosto de “bom moço” de Leite é
facilmente desmascarável, mas a política do CPERS não contribui em nada para
isso. Senão que o reforça. A exigência permanente de negociação nos trouxe a
este beco sem saída e não pode derrotar a agilidade da direita neofascista.
Aproveitando-se
da terra arrasada plantada pelo governo Sartori, Leite e a quadrilha do PSDB
têm sido muito mais hábeis em articular a destruição do patrimônio público do
que o MDB. Em menos de 6 meses de governo já concretizaram mais ataques do que
Sartori em 4 anos. O discurso cínico do governo Leite é totalmente respaldado
pela mídia comercial, que faz de tudo para distrair o povo contra si mesmo ou
distorcer os fatos escandalosamente. Eles falam em “modernizar o Estado” e “abri-lo
para a iniciativa privada”. O RS há décadas está de joelhos para a
iniciativa privada. São os empresários da FIERGS que governam esse estado com
mãos de ferro, manipulando e fazendo terrorismo psicológico contra o povo
através da grande mídia.
Combater
um governo ágil e preparado pra nos atacar requer um novo sindicalismo, a
aproximação real com as comunidades escolares e o fim da burocracia sindical.
Os ataques do governo Leite não seriam tão eficazes se não contassem com a
passividade das burocracias sindicais ligadas ao funcionalismo público (MUS,
CUT, CTB, etc.), que não mobilizaram, nem sequer denunciaram no momento preciso
em que os ataques aconteciam. Ficaram calados e inertes nas vésperas, montando
as suas patéticas “banquinhas” na Praça da Matriz para assistir de camarote a
destruição do patrimônio público e se lamentar e “denunciar” só depois, para
reafirmar a política ilusória de “votar certo” nas próximas eleições.
12.
Na
contra mão de um novo sindicalismo, a burocracia sindical aposta em novas
formas de antilutas. Tornaram-se comuns as “greves gerais” de 1 ou 2 dias na
América Latina e na Europa. Elas se caracterizam mais por serem dias de luta ou
paralisação de algumas poucas categorias do que “greves”, uma vez que não
existe um autêntico movimento grevista vindo da base, mas uma data pré-fixada e
descolada da realidade dos locais de trabalho. Também não levam em consideração
os milhares de subempregados e desempregados. Acriticamente quase toda a
“esquerda” brasileira e o CPERS defendem este tipo de “greve geral”.
Se
olharmos para a Grécia e a Argentina – países que foram campeões de “greves
gerais” deste tipo – perceberemos que a primeira continua esmagada pela Troika, soterrada pelos “acordos
financeiros” que engendram a sua futura crise econômica; e a segunda acabou por
eleger o famigerado governo de Maurício Macri, que está aplicando
impiedosamente os planos do FMI. Por aqui, seguimos para o mesmo desfiladeiro,
sem nenhuma perspectiva além da institucionalidade burguesa e do capitalismo.
Na verdade, estas “greves gerais” tem se constituído em verdadeiras válvulas de escape do descontentamento
popular, terminando por aliviar a panela de pressão do sistema. Na atual
conjuntura, parte fundamental da contenção das massas tem se dado, justamente,
a partir destas propostas inconsequentes de “greve geral” sem continuidade,
organização, trabalho de base e coerência com uma transformação revolucionária
da sociedade.
A
maioria esmagadora dessa burocracia sindical aposta nas eleições burguesas:
quer desgastar os governos neofascistas para trocá-los por governos petistas ou
de qualquer outro partido reformista. Isto é, pretende administrar o
capitalismo. Por isso, não tem contradição com propostas limitadas e
conciliadoras como este tipo de “greve”. O resultado está aí: o governo
Bolsonaro vai aprovando a “Reforma” da Previdência (na verdade, a destruição da
Previdência) aos poucos.
Pesa
ainda entre os métodos da burocracia sindical o problema do corporativismo e do
desemprego. A direção central do CPERS e a CUT falaram em “greve geral”, mas
não organizaram nenhuma luta real unificada com outras categorias do
funcionalismo público, nem mesmo com o SIMPA, também dirigido pelo PT e pela
CUT. Como organizar, então, uma “greve geral” sem preparação e organização
prévia verdadeira, testada a fortalecida na luta real intercategorias?
13.
As greves da nossa categoria se
desgastaram em razão da estratégia, da política e do peso da burocracia
sindical dentro do CPERS. As últimas greves que fizemos se caracterizaram por
serem de resistência: não arrancaram novas conquistas, mas lutaram para
preservar as velhas. Isto é um reflexo da conjuntura, da inoperância das centrais
sindicais e do desgaste do tipo de sindicalismo praticado até aqui. É
necessário iniciarmos uma nova cultura sindical e, para isso, tirar as lições das
derrotas e das vitórias é fundamental. Quase nenhuma corrente faz isso e, se o
fazem, não são coerentes com as próprias conclusões. Sem tentarmos nos pautar
pelas lições das nossas greves não podemos sintetizar experiências coletivas. Tal
como um cachorro correndo atrás do próprio rabo, cometeremos os mesmos erros de
sempre.
Muitas correntes e ativistas atribuem
às greves, bem como à ações radicalizadas descoladas da massa, um poder mágico
e místico que poderia, ao contrário do que a realidade nos diz, derrotar os
governos. Nós, inversamente, compreendemos que a burocracia sindical é o
principal impeditivo para greves vitoriosas: sabota a organização de base,
concentra poderes e decisões, desvia tudo para a sua estratégia eleitoreira e,
antes disso, se preocupa essencialmente com as questões da administração do
sindicato, tratado como uma empresa privada contraposta ao movimento.
A
burocracia sindical é um fenômeno surgido na época do imperialismo. Ela transformou
os sindicatos em agentes indiretos do Estado. Quem iniciou este processo no
Brasil foi o Estado Novo Varguista, na década de 1930, e até hoje não
conseguimos superá-lo. A burocracia sindical é, em síntese, uma casta que se
autoprotege contra a organização de base, sendo inimiga visceral da soberania
das bases. É por isso que a principal causa da situação atual do CPERS (a
desorganização, a desmoralização, a derrota das lutas) é a burocracia sindical,
que o mantém afastado da base e próximo do governo. Enquanto o CPERS estiver
dirigido por essa burocracia, a unidade real da categoria é impossível,
imperando a Torre de Babel.
O
problema é muito mais complexo do que a mera “existência de partidos na direção
do sindicato”, como pensa o senso comum da nossa categoria. Para combater a
burocracia sindical é necessária participação organizada e consciente da base
da categoria, não a sua desfiliação e omissão. A burocratização é, também, um
reflexo desta não participação. A sua adaptação à zona de conforto reforça a
burocracia sindical; e a burocracia sindical reforça as ilusões na sua zona de
conforto.
14.
Muitas outras medidas são importantes
para que as greves sejam vitoriosas nos seus propósitos. Uma das mais
importantes é que a greve seja a expressão de um autêntico movimento vindo da
base. Para isso, tem que superar os métodos da burocracia sindical: diplomacia
secreta, bajulação da categoria, comandos de greve fechados, fundos de greve
inexistentes; objetivos não declarados, mas que estão vinculados às eleições e ao
legalismo burguês. Cada greve deve deixar um saldo organizativo na base, bem
como lições incorporadas pela categoria e condensadas pelos congressos. Nada
disso é feito!
Para uma greve ter maiores chance de
vitória é preciso também que o máximo possível de educadores participe dela e
possa decidir sobre os seus rumos. A chance de adesão é muito maior, inclusive incentivando
uma futura filiação sindical, se os não-sócios puderem entrar nas assembleias
gerais que discutam e deflagrem greve, bem como as assembleias gerais que
ocorram durante o movimento grevista. Impedi-los de entrar nas assembleias
gerais é um dos tabus mais estúpidos da burocracia sindical, que apenas
dificulta futuras filiações e a própria adesão ao movimento.
Além desta abertura democrática, defendemos
a inclusão em nosso estatuto de um fundo
de greve permanente, lembrando as práticas históricas do movimento operário
que incentive a solidariedade de classe. A prestação de todas as contas do
CPERS deve ocorrer em assembleia do núcleo e geral, bem como ser divulgada no
site e jornal do sindicato, para que todos os trabalhadores conheçam e tenham
condições de opinar sobre as finanças sindicais. Hoje esta prestação de contas
é obscura, confusa e restrita a poucos.
Para nós, a grande lição da greve de
mais de 90 dias contra o governo Sartori, realizada em 2017, é que não pode
existir mais comandos de greve fechados, hegemonizado por correntes de forma
vertical e sem eleição ou indicação proporcional nos comandos abertos de base,
nos núcleos. Não há ligação entre comando central e comandos regionais. A
burocracia sindical quer se ver livre de qualquer controle. Em uma greve, as
direções precisam se estender para um comando que seja a expressão mais próxima
possível do movimento na base, eleito nos comandos abertos de núcleos,
desenvolvendo um critério que reflita proporcionalmente o número de escolas de
cada região que aderiram ao movimento. Os grevistas devem ser levados a
participar do comando; e não repelidos, como acontece hoje. A aprovação da
abertura do comando de greve para a base, ocorrida no final da greve de 2017, a
despeito de problemas de formulações (amplamente exagerados ou deformados pela
burocracia sindical), demonstrou claramente o total isolamento do comando
estadual dos comandos dos núcleos; e destes, do chão das escolas e da
comunidade escolar.
15.
Não
são apenas os políticos atuais que “falam sem dizer nada”, mas também as
correntes do CPERS, que se utilizam de todo o tipo de discurso e gritam nas assembleias
gerais para esconder que no cotidiano agem conforme a estrutura social, a moral
e os bons costumes. As assembleias estão cada vez mais esvaziadas e o sindicato
desacreditado. É o resultado do atual sindicalismo, que está em crise.
Por isso é importante revisar e renovar
toda a forma de funcionamento das instâncias sindicais. As assembleias gerais
devem ser democráticas, mas sem democratismo, ou seja, não se pode cansá-las
com dezenas de discursos sem objetividade e repetitivos apenas para contemplar
as correntes políticas. Devem ser objetivas, deliberar sobre as propostas
divergentes em pauta e organizar o movimento. A democracia e objetividade das
assembleias gerais dependem de serem preparadas e precedidas por discussões e
assembleias por escola e por núcleo. Todas as propostas que venham da base,
dentro da pauta proposta, devem ser apresentadas no Conselho Geral que
organizará a sua defesa na assembleia geral, sejam ou não membros desse
Conselho, sem prejuízo de propostas apresentadas diretamente na assembleia. Os
núcleos não funcionam de maneira melhor. Sofrem com os mesmos entraves burocráticos
e muitas propostas apresentadas nas assembleias ou conselhos regionais sequer
chegam ao Conselho Geral e, se chegam, são ignoradas.
16.
A desfiliação do CPERS da CUT foi uma
mentira. Rompeu formalmente com esta central, mas seguiu subordinado a ela não
apenas pelo fato de sua direção central ser orientada pela política oficial
cutista, mas porque segue filiado à CNTE (sua sucursal na educação). Ser contra
a CUT não significa ser contra as centrais sindicais em si, mas contra os
problemas de burocratização sindical criticado até aqui. Por isso, defendemos a
desfiliação do CPERS da CNTE, e que o dinheiro destinado a esta confederação
seja usado num fundo de greve, de mobilização e de formação controlado pelos
núcleos e, sobretudo, pela base. Para, além disso, precisamos romper com o seu
“sindicalismo cidadão”, disseminador de ilusões reformistas e eleitoreiras.
17.
A
precarização do trabalho reflete o processo de reestruturação produtiva do
capitalismo, que se expressa na política neoliberal imposta pelo mercado
aos governos. Esta política econômica foi se aprofundando ano após ano, com
desregulamentação do mercado de trabalho, contratos precarizados em todos os
setores e retirada sutil de inúmeros direitos. No Brasil temos hoje cerca de 14
milhões de desempregados e 4,8 milhões de trabalhadores que desistiram de
buscar trabalho. Além disso, aproximadamente 39,5 milhões de trabalhadores estão
na informalidade, o que corresponde a 43% da população trabalhadora. Qual a
política dos sindicatos e das centrais pra essa realidade? Nenhuma! Na nossa
categoria esta precarização se reflete nos contratos “emergenciais”, que
superaram os 25 mil, atingindo, portanto, cerca de 40% dela. A política do
CPERS não combate a precarização, mas a agrava.
Nesta
política há uma intenção consciente de “dividir para reinar”, aplicada por
todos os últimos governos, que usam e abusam desta autoridade da lei contra os
contratados, mas que eles próprios desrespeitam de diversas outras formas. A
contratação “emergencial” na nossa categoria, ao atingir dezenas de milhares de
trabalhadores por muito tempo, não pode ser revertida integralmente a curto ou
médio prazo através de uns poucos concursos públicos (isso o demonstra bem os 2
concursos do governo Tarso, que ainda que tenham nomeado educadores, mais
serviram pra jogar concursados contra contratados). O fim da contratação
pressuporia que o governo foi forçado a abandonar essa política.
Nessas
condições, a defesa apenas do concurso público como solução única para o
problema é alimentar uma ilusão mágica e, na prática, compactuar com a
continuidade da contratação “emergencial”. É isso que faz a direção do CPERS
com o discurso monótono de concurso público, que ignora a situação dos
contratados. Ela incentiva ocultamente o discurso meritocrático e reforça um
pensamento binário: “quem defende a efetivação dos atuais contratados é contra
o concurso público”. Os defensores do concurso público seriam os justos, os
corretos, os bons; e os defensores da efetivação dos contratados os maus, os
diabólicos, os aproveitadores. No mundo não existe apenas o preto e o branco,
mas uma infinidade de cores. Não se trata de tornar a efetivação a forma
preferencial de ingresso no magistério público, mas de reconhecer que
precisamos de bandeiras de luta casadas. Nós também defendemos o concurso público
e a nomeação dos aprovados, mas não fechamos os olhos para o problema dos contratados
que, como demonstrou de forma cristalina a greve de 2017, é usada por distintos
governos para dividir a luta sindical.
Há
muito tempo que a questão dos contratados transcendeu o campo jurídico e se
tornou uma questão política. É preciso sair do palavrório jurídico e entrar no
campo da denúncia e da agitação política, sem o quê, nenhum direito pode ser
conquistado ou ampliado. Assim, nota-se claramente que a bandeira única de
concurso público e a “explicação” de “violação da Constituição” por parte da
direção central do CPERS e das demais correntes sindicais, usada quase como uma
fatalidade divina, não passa de uma opção política que deixa os trabalhadores
mais precarizados de sua própria categoria sem nenhuma bandeira de luta,
resistência e direito ao trabalho.
Por
isso defendemos a bandeira classista
de efetivação dos atuais contratados.
Para os futuros, o ingresso deverá se dar prioritariamente por concurso
público, sem nenhuma concessão aos contratos “emergenciais”. Isto é a única
forma coerente de defender os concursos públicos e os trabalhadores, evitando
que o governo os utilize como forma de dividir a categoria jogando uns contra
os outros.
Nenhuma
questão deixa tão evidente o quanto a nossa categoria está atrasada em relação
à consciência de classe. O CPERS, ao invés de incentivar esta consciência, joga
contra, apostando no legalismo burguês e em sentimentos pequeno-burgueses. De
um ponto de vista classista, quem fala contra os educadores contratados não é a
razão, mas o conservadorismo de grande parte da categoria. Muitos colegas de
mentalidade conservadora, alimentada pela direção do sindicato, por parte das
correntes sindicais e pela grande mídia, tem se colocado escandalosamente
contra os contratados (que, afinal de contas, são parte da classe
trabalhadora), como se essa situação fosse culpa deles. Isso é o triunfo da
consciência burguesa e meritocrática contra a consciência de classe!
18.
A
burocracia sindical reproduz nos sindicatos a relação paterna que pauta o
sentimento infantil. É mais fácil e seguro seguir o pai, a mãe ou algum
“protetor” que tudo fará por nós, do que buscarmos nossa autonomia, pensarmos
por conta e risco e irmos para a vanguarda das lutas (desta mesma base psicológica
advém a noção religiosa de messias). Somente em momentos de crise os
trabalhadores rompem com esta conduta e dão um passo adiante, mas carregando
consigo todo o peso e o atraso das lutas e dos debates não enfrentados e não
superados. Quando conseguem romper esta passividade e se mobilizam, acabam por se
chocar com a estrutura sindical burocrática e autoritária.
Os dirigentes sindicais, por sua vez,
reforçam este sentimento paternalista visando consolidar sua influência tratam
a base como criança; bajulam os trabalhadores em momentos de calmaria e nunca
falam o que realmente precisam ouvir. Em caso de ruptura da alienação sindical
e política, os atacam furiosamente. Alimentam o sentimento imediatista quando
negam derrotas nas lutas e nas greves; quando omitem verdades desagradáveis que
os fariam perder votos e influência; quando defendem a forma vertical de
sindicalismo, que dá poder apenas à cúpula em detrimento da base.
Anos de sindicalismo burocrático,
somado à alienação e à repressão moral/sexual de grande parte da sociedade,
levaram a nossa categoria a compreensões equivocadas do sindicalismo. O
primeiro grande equívoco é compreender a luta sindical como ganho pessoal,
meramente salarial, em detrimento de outras categorias e áreas sociais; ou
seja, uma visão curta, mesmo quando expressa em linguagem econômica e
corporativa. Não foram poucas vezes em que o CPERS foi criticado por colegas
apenas por participar de atos com o MST ou por destacar pautas de outras
categorias, refletindo a má influência midiática. O nosso sindicato tem graves
falhas e desvios, mas não deveria ser criticado por isso, tal como fazem os educadores de consciência mais atrasada.
Esta subcultura corporativa também leva a referida atitude passiva: espera “que
o sindicato faça por nós”.
As
correntes políticas do CPERS e a sua direção central não tem o menor interesse
de combater esse tipo de consciência atrasada porque esta tarefa é impopular e
não rende votos. Mas se queremos mudar as coisas de fato, não há outro jeito senão
enfrentar seriamente todos os problemas que são escondidos sob mil véus de
hipocrisia.
19.
Um
desses problemas é que grande parte da categoria faz “paralisação” ou “greve de
pijama”. Isto não é apenas tolerado pelo CPERS, como muitas vezes incentivado.
O regime de trabalho no serviço público, ainda que pese o fato de ser sucateado
e precarizado, é mais brando do que o setor privado (caracterizado por uma
brutal ditadura sobre os seus trabalhadores no caso de qualquer manifestação ou
greve, resultando na maioria das vezes em demissão). Muitos colegas usam isso
como forma de fugir às suas verdadeiras responsabilidades sindicais e sociais. Será
possível derrotar governos decididamente empenhados em nos retirar direitos,
que além de tudo contam com o apoio da grande mídia e do empresariado, fazendo
uma “luta” com esta disposição e estado de espírito?
20.
O CPERS precisa retomar os debates
pedagógicos no chão da escola, mas não para reproduzir as concepções burguesas
e patriarcais de educação. O importante é conhecer, debater e incentivar as
boas práticas pedagógicas que criem, de fato, autonomia nos alunos,
professores, funcionários e pais. Diplomacia secreta, autoritarismo burocrático
e comando de greve fechado não incentiva isso, mas gera exatamente uma atitude
passiva e de repúdio à luta sindical, estudantil e social.
Graças à várias contribuições
pedagógicas e da psicologia moderna – em especial da psicanálise –, sabemos que
existe uma relação entre a família patriarcal autoritária, a educação bancária
e a mentalidade fascista. A prática de grande parte dos educadores das escolas
públicas e privadas reproduz valores morais autoritários e meritocráticos. Isso
precisa ser conhecido, debatido e combatido, pois tem reflexos nefastos sobre a
prática sindical e, sobretudo, assassina
caráteres de alunos. Cria pessoas prontas a obedecer e apenas a reproduzir
o que vem de cima. As direções, supervisões e muitos professores reforçam essa “educação”
quando abafam divergências, problemas da escola e não querem resolver nada;
muitas vezes não demonstram nenhum compromisso com os alunos e tampouco com a
luta sindical.
Somente combatendo este tipo de
“educação” e apostando na autonomia das comunidades escolares poderemos
combater as intervenções autoritárias da SEDUC e dos governos. O CPERS evita enfrentar
determinadas direções de escola autoritárias para não se chocar com eventuais
“sócios”. Quantos danos isso tem causado para a própria mobilização e que tipo
de educação uma direção autoritária pode oferecer a sua comunidade? Contendo os
mesmos vícios da “democracia” da nossa sociedade, muitos diretores “se
esquecem” de que foram eleitos pela comunidade e passam a ser gestores da SEDUC
e dos governos, sem nenhum tipo de “programa” que beneficie quem os elegeu. Não
são poucos os casos de perseguição, remoção e assédio moral, na qual, o CPERS
não intervém porque se tratam de “sócios” ou de educadores contratados,
deixando o autoritarismo crescer e fincar raiz.
21.
Antes
e durante as eleições para diretores é preciso orientar os representantes
sindicais a se candidatar ou, pelo menos, ajudar a construir o plano de ação de
candidatos independentes para que este possa ser cobrado posteriormente junto
com a comunidade escolar.
Este “plano de ação” deve conter as
seguintes orientações e noções gerais: os diretores devem dirigir a escola em
comum acordo com o Conselho Escolar, respeitando as liberdades sindicais, as
decisões deste Conselho (por votação de maioria) e o direito de organização dos
estudantes em grêmio estudantil. Devem ser criadas as condições para que as
reuniões de direções se tornem as mesmas, ou no mínimo, respeitem as
deliberações dos conselhos escolares e das assembleias de segmentos. Nesse
sentido, o CPERS precisa orientar a formação de chapas para o Conselho Escolar
e incentivar que os alunos participem ou montem grêmios estudantis para
fiscalizar, debater e propor políticas para a escola. Tudo isso exige muito
trabalho cotidiano e não pode ser negligenciado se queremos direções
democráticas e falamos seriamente em “trabalho de base”.
A
verdadeira liberdade pedagógica requer compromisso profissional e reuniões
democráticas, abertas e bem planejadas. Em sintonia com isso deve estar o
Projeto Político Pedagógico, que também necessita ser debatido e construído com
a participação do máximo possível de membros da comunidade.
É
preciso educar a comunidade escolar no sentido da fiscalização permanente das
direções e na reivindicação do debate democrático de onde investir a verba
recebida. Isso exige tornar comum a prestação de contas do que entra de dinheiro
na escola e onde ele é investido. Uma vez estabelecidas as diretrizes do plano
de ação, é fundamental formalizá-las no papel para comprometer a direção escolar
com sua comunidade. Quando as pressões da SEDUC vierem (e elas virão
inevitavelmente), com o trabalho prévio de organização no Conselho Escolar,
junto com os alunos no grêmio estudantil e com a liberdade sindical dos
professores e funcionários, estaremos em melhores condições para resistir e
cobrar coerência entre o propósito que levou a eleição daquele candidato à
direção da escola, além de ter mais instrumentos de fiscalização e pressão para
evitar que ele mude de trincheira. Compreendemos que aí está um embrião
importantíssimo de organização de base junto da comunidade escolar.
22.
Numa
conjuntura não revolucionária e reacionária como a que vivemos, o eixo da nossa
política sindical deve se deslocar da ofensiva para a defensiva; de questões
como a organização da “greve geral”, de uma “ação radicalizada” ou da
revolução, para os métodos e tarefas que as preparam: a organização de base,
dos setores precarizados, informais e desempregados; a unificação das lutas, a
denúncia da burocracia, do centrismo, do governo e, sobretudo, do capitalismo
(não denunciá-lo é um crime e uma traição); a propaganda do socialismo, a
autodefesa, o partido e o movimento revolucionário.
No
caso do magistério é necessário reorganizar todo o trabalho de base do CPERS,
partindo diretamente do contato com a comunidade escolar nos conselhos
escolares combativos e dos representantes de escola; no funcionalismo público é
preciso expulsar a burocracia sindical dos sindicatos, combater o
corporativismo e a falta de compromisso. Sem mudar radicalmente o sindicalismo
praticado até aqui não há possibilidade de enfrentar com êxito os ataques que
pretendem destruir a educação pública (ajuste fiscal, terceirização, EaD,
“reforma” do Ensino Médio, etc.). Se estes ataques triunfarem, não há futuro
para a nossa categoria; e, consequentemente, não haverá possibilidade de futuro
para o CPERS.
Construção pela Base – oposição à
direção central e à burocracia sindical do CPERS
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