segunda-feira, 15 de março de 2021

Dona Carmem


*Por Artigas Osores

O corpo pequeno, vestido de preto, se balança em direção ao rio.
Em sua alma de mulher, aromas de jasmim e manjericão.
Em suas pequenas mãos enrugadas se confunde o cheiro de terra, graxa e fumaça.
Dona Carmem carrega na cabeça a dignidade, sobre ela equilibra com dificuldade a trouxa de roupas dos poderosos.
Aurora, Carola, Graciana, Rosa, Juanita, Teresa, Piruncha e outras tantas vizinhas, pobres como ela, saúdam-na ao passar.
Junto às Toninas, sobre as pedras, esfregam e lutam as últimas lavadeiras de minha cidade.
Mulheres honestas do meu pobre bairro, que nada mais desejam do que criar seus filhos com valores e princípios.
Mulheres, esposas, mães que lutam, ganhando o pão.
De que material serão feitas essas guerreiras, que nunca reclamam, que nunca se queixam?
À tarde, da torneira da esquina carregam jarros de água; e à noite, cozinham com lenha sob o chão de terra batida, ainda em tempo, sem demonstrar cansaço, de dar carinho aos seus filhos antes de dormir.
Viveram sem luxos, sem confortos.
O sistema as oprimiu; não tinham direitos e muitas delas desconheciam as letras e a liberdade.
Não as presenteavam com flores e perfumes; e talvez elas não precisassem disso para saber o que é a felicidade.
As mulheres "de baixo", se soubessem o quanto eu as amo, o quanto me lembro delas quando vejo mulheres nas ruas, de punhos fechados, com gritos de "direitos iguais, justiça e liberdade".
Jovens moças, estudantes, trabalhadoras que carregam sob suas cabeças, tal como Dona Carmem, a dignidade.
Assim como Aurora, Carola, Graciana, Rosa, Juanita, Teresa, Piruncha e tantas outras exigindo o seu direito ao pão.


*Artigas Osores é um trabalhador com consciência de classe e escritor uruguaio que descreve as belezas e os sofrimentos da gente "de baixo" da cidade de Mercedes, do seu país e da América Latina.

Nenhum comentário:

Postar um comentário