sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Dialética da natureza (ou como a natureza responde à intervenção econômica humana)

Resumindo: ...o animal apenas utiliza a Natureza, nela produzindo modificações somente por sua presença; o homem a submete, pondo-a a serviço de seus fins determinados, imprimindo-lhe as modificações que julga necessárias, isto é, domina a Natureza. E esta é a diferença essencial e decisiva entre o homem e os demais animais; e, por outro lado, é o trabalho que determina essa diferença.

Mas não nos regozijemos demasiadamente em face dessas vitórias humanas sobre a Natureza. A cada uma dessas vitórias, ela exerce a sua vingança. Cada uma delas, na verdade, produz, em primeiro lugar, certas conseqüências com que podemos contar; mas em segundo e terceiro lugares, produz outras muito diferentes, não previstas, que quase sempre anulam essas primeiras conseqüências. Os homens que na Mesopotâmia, na Grécia, na Ásia Menor e noutras partes destruíram os bosques, para obter terra arável, não podiam imaginar que, dessa forma, estavam dando origem à atual desolação dessas terras ao despojá-las de seus bosques, isto é, dos centros de captação e acumulação de umidade. Os italianos dos Alpes, quando devastaram, na sua vertente Sul, os bosques de pinheiros, tão cuidadosamente conservados na vertente Norte, nem sequer suspeitavam que, dessa maneira, estavam arrancando, em seu território, as raízes da economia das granjas leiteiras; e menos ainda suspeitavam que assim estavam eliminando a água das vertentes da montanha, durante a maior parte do ano e que, na época das chuvas, seriam derramadas furiosas torrentes sobre as planícies. Os propagadores da batata, na Europa, não sabiam que, por meio desse tubérculo, estavam difundindo a escrófula. E assim, somos a cada passo advertidos de que não podemos dominar a Natureza como um conquistador domina um povo estrangeiro, como alguém situado fora da Natureza; mas sim que lhe pertencemos, com a nossa carne, nosso sangue, nosso cérebro; que estamos no meio dela; e que todo o nosso domínio sobre ela consiste na vantagem que levamos sobre os demais seres de poder chegar a conhecer suas leis e aplicá-las corretamente.

Na realidade, a cada dia que passa aprendemos a compreender mais corretamente as suas leis e a conhecer os efeitos imediatos e remotos resultantes de nossas intervenções no processo que a mesma leva a cabo. Principalmente em virtude dos gigantescos progressos realizados pelas ciências naturais no século atual, cada vez mais nos encontramos em condições de conhecer as conseqüências mais remotas de nossas mais comuns atividades de produção; pelo menos em condições de aprender a dominá-las. Mas, quanto mais se verifica isso, tanto mais os homens se sentirão unificados com a Natureza e tanto mais terão a consciência disso, tornando-se cada vez mais impossível sustentar essa noção absurda e antinatural que estabelece a oposição entre espírito e matéria, entre o homem e a Natureza, entre alma e corpo, concepção que surgiu na Europa depois da decomposição da antigüidade clássica e que adquiriu sua mais acentuada forma na doutrina do Cristianismo.

 

(Escrito por Friedrich Engels;  trecho extraído do texto – inconcluso – “Humanização do Macaco pelo Trabalho”, escrito em fins de 1875 e início de 1876). 

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