*Texto e foto por Raquel Silveira
Corpo.
Corpo subalterno.
Corpo extenuado.
Amálgama:
Concreto-corpo-social
Crosta-corpo-urbe
Trabalhador-terminal
Cidades se elevam
Corpos caem invisíveis
Limpeza urbana em descarte
Sociedade suja imunda
Corpo funcional
Em desalinho
Em descarte
Concreto frio punhal
De Corpo-pedra-aço
Fez Estranho Amálgama.
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Subia o terminal da Aparício Borges, em frente à Igreja São Jorge e a saudosa Padaria Pão Dourado; um terminal de ônibus, mais um, dos tantos que foram erguidos — por outros tantos trabalhadores mesmo que as decisões tenham partido das ditas "autoridades" — e que modificaram as paisagens urbanas desta cidade; ao passar para o segundo piso noto um corpo deitado no chão; sigo subindo ao terceiro piso, quando o campo de visão me permite vê-lo novamente; percebo que é um trabalhador da empresa de limpeza urbana da cidade.
De imediato noto isso pelo uniforme e pelos sinalizadores luminosos que compõem as vestimentas. Não deixo de relacionar esta sinalização com os marcadores sociais: enquanto os sinalizadores das vestimentas os tornam visíveis mesmo a noite, para que possam trabalhar com suposta segurança, evitando inclusive atropelamentos, os marcadores sociais os tornam invisíveis; seu trabalho, por maior relevância, principalmente em uma sociedade de consumo e descarte de material, o transforma também em cidadão de segunda classe (talvez nem isso), descartável. Não posso deixar de pensar também na condição de precariedade que se encontra: por que deita ali? É pausa do trabalho extenuante e necessita de algum tempo para seu corpo? Ou não recebe pagamento suficiente que lhe permita ter uma casa? Ou tempo o suficiente para se deslocar até sua moradia antes de retornar ao novo turno? E, se é isso, as empresas não deveriam zelar pela integridade física e psicológica dos trabalhadores, assegurando alojamentos? Ou estaria este trabalhador que ali está, ainda empregado, ou teria perdido o emprego e esta seria a roupa que lhe restou? (Muitas perguntas, sabemos... devemos deixar de, pelo menos, fazê-las? Não.).
A tarde estava fria, então somaram-se as perguntas: ele sente frio? Dor no corpo? Fome? Da comida que alimenta o corpo e a alma...
Mas, enfim, termino minha subida e aguardo; o ônibus chega, parto ao meu destino; sou mais uma passageira que passou por ele, o trabalhador, e isto em nada alterou a sua situação. O fato é que, por quantas vezes seguiremos apenas avante...?
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