*Texto escrito por Eduardo Cambará para a Luta Marxista e publicado originalmente no seu site em 2009
A esquerda de hoje sofre de dupla personalidade. As principais organizações da esquerda “revolucionária” tem uma prática habitual de cultivar duas posições “ao mesmo tempo”. Este duplo sentido tem como fim esconder as reais posições defendidas e, geralmente, mescla posições revolucionárias e posições oportunistas. Intrigados, alguns ativistas nos perguntam: como isso é possível? Na verdade, isto não é possível. Quando existe uma política ambígua, com duplo sentido, sempre prevalecem as posições oportunistas sobre as pretensas posições revolucionárias. Toda a trajetória do marxismo nos ensina que não é possível servir a dois senhores. Ou servimos à burguesia, ou servimos ao proletariado, não há meio termo.
Frente a crise de direção revolucionária que se aprofundou ao longo do Século 20, o trotskismo teve os primeiros méritos em reconhecer e desmascarar os inúmeros “charlatães e importunos professores de moral”. As principais organizações que se reivindicam trotskistas são a negação acabada das lições do próprio trotskismo e a prova viva deste método nefasto de diluir o programa revolucionário num programa ambíguo. Esquecem do Programa de Transição quando ele afirma: “Olhar a realidade de frente; não procurar a linha de menor resistência; chamar as coisas pelo seu nome; dizer a verdade às massas, por mais amarga que seja; (...) ser rigoroso tanto nas pequenas, quanto nas grandes coisas” (grifos nossos). Este trecho define bem a intenção e a necessidade de sermos o mais claro possível, de não tergiversar, de combater a ambiguidade.
Contudo, a intenção descrita pelo Programa de Transição foi frustrada justamente porque os charlatães assumiram a direção da IV Internacional após a morte de Trotsky. E, sobretudo, após o racha em mil pedacinhos da IV Internacional, carregam o falso prestígio de serem os herdeiros legítimos de Trotsky. Não só frustraram esta intenção como foram no sentido oposto, isto é, aprofundaram a ambiguidade, o duplo sentido e a confusão programática. Terminaram por liquidar a IV Internacional. Não é necessário citar o papel do Mandelismo, do Lambertismo e do Pablismo. Estes dirigentes e suas respectivas correntes já foram suficientemente desmascarados ao longo da História. As organizações atuais que reivindicam o legado destes dirigentes (SU, DS, “O Trabalho”, etc.) são a prova viva do que afirmamos e já são sustentáculos diretos da ordem burguesa. Porém, dentre estes, cabe um destaque especial para Nahuel Moreno, que ainda hoje conserva e semeia inúmeras ilusões pela vanguarda revolucionária.
A LIT, o morenismo e a dupla linguagem
O morenismo é merecedor deste destaque porque todas as suas vertentes atuais sofrem de dupla personalidade. Desde a principal – a LIT/PSTU – até as sucursais menores – como a UIT/CST (corrente interna do PSOL); passando, inclusive, pelas declaradamente não-morenistas, mas que conservam o morenismo em todo o seu vigor. A tentativa deste duplo sentido da LIT e das correntes morenistas visa confundir o programa e a prática economicista com o programa revolucionário. Como isso não pode ser dito às claras, recorrem ao duplo sentido. Seus textos programáticos são repletos de ambigüidades e confusões. Dizem uma coisa e logo em seguida dizem o oposto. Não podem jogar às claras porque precisam manter uma aparência de combativos, de revolucionários; em suma, de marxistas. Como sabem que o marxismo não é compatível com esta prática, preferem recorrer a tergiversação e ao charlatanismo para manter as aparências.
Exemplifiquemos, para mais facilmente ilustrar, como Moreno faz para defender sua principal política: a Revolução Democrática. A Revolução Democrática é a negação de tudo o que representou o trotskismo em sua luta contra o revisionismo. É a luta histórica entre a Revolução Permante versus a Revolução Democrática e etapista. Para atingir este fim é necessário um verdadeiro malabarismo político, por isso, a dupla linguagem é o método perfeito. Entram em cena várias faces de um mesmo personagem.
Cena 1, a exaltação: “Porém, seguimos acreditando que a teoria da revolução permanente era a maior teoria política revolucionária que se estruturou, nós acreditamos que os dois grandes descobrimentos do século são a teoria da revolução permanente e o desenvolvimento desigual e combinado, além do imperialismo e o partido, descobertos por Lênin” (Crítica às teses da Revolução Permanente de Trotsky, Nahuel Moreno in Escola de Quadros, Argentina 1984);
Cena 2, clareza teórica e distorção: “Quer dizer, ou a revolução é permanente, ou se detém e retrocede. Ou seja, Trotsky teve razão contra todo mundo no sentido de que não havia revoluções nacionais, em que era uma revolução mundial. Também acertou em que, dirija quem dirija o processo, se este avança, transforma-se em socialismo, não há maneira de evitar que seja socialismo”(Idem – grifos nossos). Trotsky nunca disse que independente de qual classe dirija o processo revolucionário ela se transforma em socialismo. O trotskismo nunca colocou em dúvida de que a única classe capaz de transformar as revoluções democráticas em proletárias era o próprio proletariado. Sempre foi o mais claro possível neste aspecto. Todas as direções pequeno-burguesas degeneraram suas respectivas revoluções e a colocaram novamente no caminho burguês – a cubana e nicaragüense confirmam Trotsky. Afirmar, irresponsavelmente, que Trotsky disse que “dirija quem dirija o processo” ele “transforma-se em socialismo”, e o pior, “não há maneira de evitar”, é a mais pura distorção teórica. Esta não é a única. Durante todo o texto Moreno faz inúmeros discursos indiretos de Trotsky, conforme sua interpretação, é claro: “Se existe um processo de revolução democrática, essa revolução vai ser socialista por seu próprio conteúdo (...) Então, não me interessa o sujeito. Seja qual for o sujeito, tem que fazer a revolução socialista” (Idem).
Cena 3, a justificativa e a negação: “Nós acreditamos que nestes últimos 40 anos produziram-se fenômenos distintos aos que Trotsky viu, que nos obrigam a começar a elaborar entre todos (...) uma nova formulação, uma nova forma de escrever a teoria da revolução permanente, tomando todos os problemas. Temos que formular que não é obrigatório que seja a classe operária e um partido marxista revolucionário com influência de massas quem dirija o processo da revolução democrática para a revolução socialista. Não é obrigatório que seja assim. Ao contrário: aconteceram e não está descartado que aconteçam, revoluções democráticas, que no terreno econômico, se transformam em socialistas. Quer dizer, revoluções que expropriem a burguesia sem ter como eixo essencial a classe operária – ou tendo-a como participante importante –, e não tendo partidos marxistas revolucionários e operários revolucionários na sua frente e sim, partidos pequeno-burgueses” (Idem – grifos nossos).
Este duplo discurso está presente em toda a teoria morenista e citar todas as passagens seria fugir ao nosso assunto principal. Cabe ressaltar que todas as correntes da esquerda “revolucionária”, declaradamente morenistas ou não, utilizam-se destes subterfúgios para renegar e rebaixar o programa marxista, transformando-o em mero economicismo, espontaneísmo barato. Fazem isso ora abertamente (como Moreno no referido texto), ora disfarçadamente. É tarefa dos autênticos revolucionários identificar e desmascarar esta impostura.
Lênin e o combate ao oportunismo
Esta prática oportunista de cultivar duas posições políticas não é novidade. Já foi muito bem identificada por Lênin e combatida pelos bolcheviques. O morenismo mostra-se não só a negação do trotskismo, mas, também, a negação acabada do leninismo. Ser fiel ao leninismo e ao bolchevismo passa por combater esta cultura nefasta da vanguarda economicista. Nas palavras dele: “... é preciso não esquecer nunca um traço característico de todo o oportunismo contemporâneo, em todo o seu domínio: o seu caráter vago, impreciso, inapreensível. Pela sua própria natureza o oportunismo evita sempre pôr as questões de maneira clara e definida, procura a resultante, arrasta-se como uma cobra entre dois pontos de vista que se excluem mutuamente, procurando ‘estar de acordo’ com um e com outro, reduzindo as suas divergências a ligeira modificações, a dúvida, a votos piedosos e inocentes, etc” (“Um passo em frente, dois passos atrás”, Lênin).
Frente a crise de direção revolucionária que se aprofundou ao longo do Século 20, o trotskismo teve os primeiros méritos em reconhecer e desmascarar os inúmeros “charlatães e importunos professores de moral”. As principais organizações que se reivindicam trotskistas são a negação acabada das lições do próprio trotskismo e a prova viva deste método nefasto de diluir o programa revolucionário num programa ambíguo. Esquecem do Programa de Transição quando ele afirma: “Olhar a realidade de frente; não procurar a linha de menor resistência; chamar as coisas pelo seu nome; dizer a verdade às massas, por mais amarga que seja; (...) ser rigoroso tanto nas pequenas, quanto nas grandes coisas” (grifos nossos). Este trecho define bem a intenção e a necessidade de sermos o mais claro possível, de não tergiversar, de combater a ambiguidade.
Contudo, a intenção descrita pelo Programa de Transição foi frustrada justamente porque os charlatães assumiram a direção da IV Internacional após a morte de Trotsky. E, sobretudo, após o racha em mil pedacinhos da IV Internacional, carregam o falso prestígio de serem os herdeiros legítimos de Trotsky. Não só frustraram esta intenção como foram no sentido oposto, isto é, aprofundaram a ambiguidade, o duplo sentido e a confusão programática. Terminaram por liquidar a IV Internacional. Não é necessário citar o papel do Mandelismo, do Lambertismo e do Pablismo. Estes dirigentes e suas respectivas correntes já foram suficientemente desmascarados ao longo da História. As organizações atuais que reivindicam o legado destes dirigentes (SU, DS, “O Trabalho”, etc.) são a prova viva do que afirmamos e já são sustentáculos diretos da ordem burguesa. Porém, dentre estes, cabe um destaque especial para Nahuel Moreno, que ainda hoje conserva e semeia inúmeras ilusões pela vanguarda revolucionária.
A LIT, o morenismo e a dupla linguagem
O morenismo é merecedor deste destaque porque todas as suas vertentes atuais sofrem de dupla personalidade. Desde a principal – a LIT/PSTU – até as sucursais menores – como a UIT/CST (corrente interna do PSOL); passando, inclusive, pelas declaradamente não-morenistas, mas que conservam o morenismo em todo o seu vigor. A tentativa deste duplo sentido da LIT e das correntes morenistas visa confundir o programa e a prática economicista com o programa revolucionário. Como isso não pode ser dito às claras, recorrem ao duplo sentido. Seus textos programáticos são repletos de ambigüidades e confusões. Dizem uma coisa e logo em seguida dizem o oposto. Não podem jogar às claras porque precisam manter uma aparência de combativos, de revolucionários; em suma, de marxistas. Como sabem que o marxismo não é compatível com esta prática, preferem recorrer a tergiversação e ao charlatanismo para manter as aparências.
Exemplifiquemos, para mais facilmente ilustrar, como Moreno faz para defender sua principal política: a Revolução Democrática. A Revolução Democrática é a negação de tudo o que representou o trotskismo em sua luta contra o revisionismo. É a luta histórica entre a Revolução Permante versus a Revolução Democrática e etapista. Para atingir este fim é necessário um verdadeiro malabarismo político, por isso, a dupla linguagem é o método perfeito. Entram em cena várias faces de um mesmo personagem.
Cena 1, a exaltação: “Porém, seguimos acreditando que a teoria da revolução permanente era a maior teoria política revolucionária que se estruturou, nós acreditamos que os dois grandes descobrimentos do século são a teoria da revolução permanente e o desenvolvimento desigual e combinado, além do imperialismo e o partido, descobertos por Lênin” (Crítica às teses da Revolução Permanente de Trotsky, Nahuel Moreno in Escola de Quadros, Argentina 1984);
Cena 2, clareza teórica e distorção: “Quer dizer, ou a revolução é permanente, ou se detém e retrocede. Ou seja, Trotsky teve razão contra todo mundo no sentido de que não havia revoluções nacionais, em que era uma revolução mundial. Também acertou em que, dirija quem dirija o processo, se este avança, transforma-se em socialismo, não há maneira de evitar que seja socialismo”(Idem – grifos nossos). Trotsky nunca disse que independente de qual classe dirija o processo revolucionário ela se transforma em socialismo. O trotskismo nunca colocou em dúvida de que a única classe capaz de transformar as revoluções democráticas em proletárias era o próprio proletariado. Sempre foi o mais claro possível neste aspecto. Todas as direções pequeno-burguesas degeneraram suas respectivas revoluções e a colocaram novamente no caminho burguês – a cubana e nicaragüense confirmam Trotsky. Afirmar, irresponsavelmente, que Trotsky disse que “dirija quem dirija o processo” ele “transforma-se em socialismo”, e o pior, “não há maneira de evitar”, é a mais pura distorção teórica. Esta não é a única. Durante todo o texto Moreno faz inúmeros discursos indiretos de Trotsky, conforme sua interpretação, é claro: “Se existe um processo de revolução democrática, essa revolução vai ser socialista por seu próprio conteúdo (...) Então, não me interessa o sujeito. Seja qual for o sujeito, tem que fazer a revolução socialista” (Idem).
Cena 3, a justificativa e a negação: “Nós acreditamos que nestes últimos 40 anos produziram-se fenômenos distintos aos que Trotsky viu, que nos obrigam a começar a elaborar entre todos (...) uma nova formulação, uma nova forma de escrever a teoria da revolução permanente, tomando todos os problemas. Temos que formular que não é obrigatório que seja a classe operária e um partido marxista revolucionário com influência de massas quem dirija o processo da revolução democrática para a revolução socialista. Não é obrigatório que seja assim. Ao contrário: aconteceram e não está descartado que aconteçam, revoluções democráticas, que no terreno econômico, se transformam em socialistas. Quer dizer, revoluções que expropriem a burguesia sem ter como eixo essencial a classe operária – ou tendo-a como participante importante –, e não tendo partidos marxistas revolucionários e operários revolucionários na sua frente e sim, partidos pequeno-burgueses” (Idem – grifos nossos).
Este duplo discurso está presente em toda a teoria morenista e citar todas as passagens seria fugir ao nosso assunto principal. Cabe ressaltar que todas as correntes da esquerda “revolucionária”, declaradamente morenistas ou não, utilizam-se destes subterfúgios para renegar e rebaixar o programa marxista, transformando-o em mero economicismo, espontaneísmo barato. Fazem isso ora abertamente (como Moreno no referido texto), ora disfarçadamente. É tarefa dos autênticos revolucionários identificar e desmascarar esta impostura.
Lênin e o combate ao oportunismo
Esta prática oportunista de cultivar duas posições políticas não é novidade. Já foi muito bem identificada por Lênin e combatida pelos bolcheviques. O morenismo mostra-se não só a negação do trotskismo, mas, também, a negação acabada do leninismo. Ser fiel ao leninismo e ao bolchevismo passa por combater esta cultura nefasta da vanguarda economicista. Nas palavras dele: “... é preciso não esquecer nunca um traço característico de todo o oportunismo contemporâneo, em todo o seu domínio: o seu caráter vago, impreciso, inapreensível. Pela sua própria natureza o oportunismo evita sempre pôr as questões de maneira clara e definida, procura a resultante, arrasta-se como uma cobra entre dois pontos de vista que se excluem mutuamente, procurando ‘estar de acordo’ com um e com outro, reduzindo as suas divergências a ligeira modificações, a dúvida, a votos piedosos e inocentes, etc” (“Um passo em frente, dois passos atrás”, Lênin).
O duplo linguajar de hoje
Desgraçadamente, esta prática não só persiste como se tornou ainda mais perniciosa para a organização independente dos trabalhadores. Atualmente, as organizações revisionistas usam um duplo discurso para defender a formação de novas frentes populares eleitoriais (Frente de Esquerda 2006/2008), com inúmeras distorções e ambiguidades sobre a participação eleitoral dos revolucionários; para defender unidade com o governismo (através da unificação da Conlutas com a Intersindical e com o calendário da CUT), “renunciando e ao mesmo tempo defendendo” a política de Trotsky para os sindicatos; para defender o chavizmo na Venezuela e ver pontos progressivos em seu nacionalismo e ao mesmo tempo esquecer as principais lições do marxismo sobre o nacionalismo-burguês; etc. Exemplos não faltam.
Esta prática teórico/programática significa o triunfo do revisionismo e da prostituição do marxismo. O partido revolucionário só poderá surgir, construir-se e firmar-se sobre as cinzas destas organizações centristas. Enquanto elas forem hegemônicas na vanguarda o proletariado continuará lutando de olhos vendados.
Desgraçadamente, esta prática não só persiste como se tornou ainda mais perniciosa para a organização independente dos trabalhadores. Atualmente, as organizações revisionistas usam um duplo discurso para defender a formação de novas frentes populares eleitoriais (Frente de Esquerda 2006/2008), com inúmeras distorções e ambiguidades sobre a participação eleitoral dos revolucionários; para defender unidade com o governismo (através da unificação da Conlutas com a Intersindical e com o calendário da CUT), “renunciando e ao mesmo tempo defendendo” a política de Trotsky para os sindicatos; para defender o chavizmo na Venezuela e ver pontos progressivos em seu nacionalismo e ao mesmo tempo esquecer as principais lições do marxismo sobre o nacionalismo-burguês; etc. Exemplos não faltam.
Esta prática teórico/programática significa o triunfo do revisionismo e da prostituição do marxismo. O partido revolucionário só poderá surgir, construir-se e firmar-se sobre as cinzas destas organizações centristas. Enquanto elas forem hegemônicas na vanguarda o proletariado continuará lutando de olhos vendados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário