quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Juntos com quem?



Luciana Genro e os militantes do MES-PSOL em uma atividade do Juntos

A corrente estudantil conhecida como “Juntos” é um movimento ligado e dirigido pelo MES (Movimento de Esquerda Socialista), uma corrente interna do PSOL da qual fazem parte Luciana Genro e Roberto Robaina. Parece progressivo que uma corrente estudantil se proponha a debater política com a juventude, ajudando na sua organização. Em um país atrasado econômica, política e culturalmente, sedento de todo tipo de organização de base e de debate político, de fato o é.
Contudo, o projeto desta corrente não visa emancipar os estudantes para que tomem consciência do seu lugar no mundo e na luta de classes, mas fazem o contrário: aproveitam-se desta disposição da juventude e não a desenvolvem no sentido que realmente interessaria aos trabalhadores – isto é, desenvolver consciência revolucionária de classe –; utilizam-na, então, como um movimento a serviço dos interesses eleitorais do PSOL (que não são os mesmos dos trabalhadores, a despeito dos discursos em contrário), ainda que eventualmente ajude a mobilizar estudantes com pautas progressivas. Como o PSOL não pode assumir sua intenção abertamente, pois certamente seria desprezado em razão do grande sentimento anti-partido que impera na população, em geral, e na juventude, em particular, aproxima-se dos estudantes como um “movimento” que não estaria subordinado a nenhum partido. Ao invés de combater a errônea consciência anti-partido, que visa apenas deixar os trabalhadores e a juventude sem organização política, ajuda a reforçá-la.
E o PSOL? Que espécie de partido é? O PSOL é um partido reformista, do tipo social-democrata, que segue exatamente os mesmos passos do PT, apesar de reivindicar o marxismo e, até mesmo, o trotskismo, em palavras. Por isso, não fazer esta crítica é deixar os estudantes que seguem o Juntos à mercê de uma burocracia política e sindical que emperra as lutas desviando-as totalmente para o terreno da burguesia, as eleições, utilizando-se para isso de um discurso “de esquerda”.
Inspirado em movimentos como o “podemos” e os “indignados” da Espanha (que também são caracterizados por esta repulsa aos partidos em geral), o Juntos explora o sentimento anti-partido a favor do PSOL, pois esta tática do MES serve para influenciar mais ativistas que não conseguiria atingir se se assumisse publicamente enquanto partido. Este é um ponto visivelmente negativo, pois capitula para este sentimento equivocado e reacionário da população que precisa ser combatido e melhor orientado. O problema não está nos partidos em geral, mas nos partidos burgueses (ou seja, aqueles que possuem um programa e uma prática burguesa: PSDB, Democratas, PMDB, PT, PSB, PCdoB, PDT, PTB, PPS, PSD, Solidariedade, PSC, PMN, Rede, PV, dentre outros); e nos partidos reformistas, dentre os quais está o próprio PSOL, além de PSTU, PCB e PCO. A consciência anti-partido impede que os trabalhadores tomem consciência da necessidade de ter um partido revolucionário, isto é, uma organização política que lute pela independência de classe do proletariado em relação à burguesia. É no programa dos partidos burgueses e reformistas que está o “DNA” dos seus crimes e traições políticas. A corrupção é uma conseqüência inevitável dele.
A tática política expressa pelo Juntos não é nenhuma novidade. O mesmo papel coube a União da Juventude Socialista (UJS), que é a corrente estudantil do PCdoB. A UJS caracteriza-se por ser extremamente oportunista, dirigindo com mãos de ferro a UNE e a colocando a serviço dos governos do PT, partido ao qual está subordinada. Não há formação teórica e política da juventude, mas o rebaixamento das discussões, a disseminação de uma alienação perniciosa, marcada por festas e confraternizações sem um contraponto real na elevação da consciência política de classe. Ainda que promova atos políticos e passeatas, a UJS e as correntes afins se caracterizam por sustentar acriticamente os governos petistas. O Juntos disputa com a UJS e suas correntes satélites a UNE, não para livrar esta entidade do reformismo e do peleguismo que a enferruja, mas para dar a sua orientação reformista. Na verdade, procura ganhar influência rapidamente através dos cargos e aparatos destas entidades. Não casualmente, um dos principais focos de atuação do Juntos é a intervenção nestas entidades burocratizadas do movimento estudantil (tais como UNE, UBES e UMESPA) sem denunciar o papel que cumprem de braços dos governos no movimento estudantil. Ao invés de cultivar um novo movimento estudantil, independente, livre das velhas práticas caducas, o Juntos procura ganhar influência política nas escolas e universidades (de uma forma muito semelhante à UJS, diga-se de passagem) para levá-las ao leito morto destas entidades governistas burocratizadas e ganhar influência dentro delas.

O "racha" do PSTU (Arrancar Alegria ao Futuro) mal saiu do partido e já está de mãos dadas com o Juntos
O programa político do Juntos
            Se tratando apenas de uma corrente para mobilização da juventude, então teríamos apenas um problema parcial de método e concepção que poderiam ser trabalhados a partir da crítica e da discussão. Porém, se trata de uma corrente estudantil dirigida pela PSOL, que procura dar-lhe uma suposta orientação “marxista”, conforme se pode ver nas declarações políticas do seu site. A concepção “marxista” do PSOL é extremamente deturpada, rebaixando o seu programa e a sua prática, e renegando, inclusive, as principais contribuições teóricas do trotskismo (em particular, a teoria da Revolução Permanente). Eis aí a questão central.
Por que, então, o PSOL-MES e o Juntos reivindicam o marxismo, o leninismo e o trotskismo, mesmo tendo que revisar os seus princípios? Porque é a teoria que demonstrou aos trabalhadores do mundo como lutar contra a burguesia coerentemente e como tomar o poder. Apesar das inúmeras tentativas de enlamear o seu nome por parte do stalinismo e dos reformistas de todos os matizes, seus méritos teóricos e políticos são profundos e reconhecidos até mesmo pelos seus inimigos. Então o que o PSOL e o Juntos querem, na verdade, são os méritos do marxismo, sem os sacrifícios; os direitos, sem os deveres; a imagem, sem o conteúdo, para poderem se vender como combativos e coerentes para o movimento e, assim, crescerem mais rapidamente.
Para além de todos os problemas de método e de princípio envolvendo o Juntos, cabe analisar o seu programa, apresentado nos seus meios de comunicação. Um programa sintetiza o conjunto da compreensão da realidade que conduz a uma visão de como superar a sociedade capitalista, somada a diversas tarefas imediatas, transitórias e históricas que precisam ser cumpridas para transformá-la em uma sociedade socialista. Os dois principais programas são: o “capitalista” e o “socialista” (dentro deste último existem diversas subdivisões, como o programa reformista e o revolucionário).
A quem serve o programa político do Juntos? Certamente não é ao socialismo. O seu programa é o que podemos caracterizar como “socialista reformista”, com traços nitidamente pequeno burgueses, apesar do seu discurso “libertário” e anti-capitalista. Para confirmar esta caracterização basta analisar suas publicações, como a revista J! (número 19, de outubro de 2015) que preparou a intervenção da corrente no 41º conubes (Congresso da UBES), bem como a atuação e programa do MES-PSOL (corrente política responsável pela orientação geral do movimento).
A revista do Juntos usa e abusa da denúncia de que o “capitalismo mata”, o que é aparentemente progressivo. No entanto, lendo mais atentamente os artigos, se percebe que não há clareza em relação ao que colocar no lugar do capitalismo. Em nenhum momento se fala sobre o “socialismo”; muito menos sobre como superarmos o capitalismo. Ao contrário, percebe-se que o programa do Juntos é o mesmo do MES-PSOL. Os teóricos do movimento aconselham a juventude à radicalizar a democracia, pois esta deve ser “a nossa saída” da crise capitalista. Mas qual “democracia”? Ora, só pode ser a democracia burguesa. E o PSOL, como um partido reformista, tem todo o interesse de incutir este engodo na juventude para ganhá-la para o seu projeto. Além disso, o Juntos propõe uma Assembleia Constituinte (que na atual conjuntura política só poderia ter uma larga maioria burguesa) e a refundação das instituições democrático-burguesas. Ao invés do socialismo, a juventude é educada na reforma e na refundação do capitalismo.
Os resultados práticos desta orientação oportunista e aparatista não poderiam dar em outra coisa. Nas ocupações de escolas públicas no Rio Grande do Sul, desencadeadas em consonância com a greve do magistério estadual em maio-junho de 2016, o Juntos teve um papel ativo nas maiores escolas. Todo este movimento culminou na ocupação da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, dirigida pelo Juntos e pela UJS através da UBES, UGES e UMESPA. Durante a ocupação da ALERGS, o governo Sartori (PMDB e aliados) apresentou uma proposta rebaixada, que consistia apenas em adiar a votação do PL 44 – projeto de lei que privatiza os serviços públicos – para seis meses (o que daria mais ou menos em janeiro ou fevereiro de 2017), sem retirá-lo de tramitação; e a liberação de apenas R$40 milhões para reformas nas escolas ocupadas. Dividido entre elas, isso daria apenas 16 mil reais para cada uma, o que significaria apenas a soma de alguns meses do repasse da verba que deveria entrar normalmente em cada mês. Além disso, o adiamento do PL 44 visa apenas acalmar o descontentamento e jogar a votação para as férias escolares (isto é: ganhar tempo!). Estas entidades – com o total consentimento do Juntos – vergonhosamente aceitaram o acordo proposto pelo governo!

Por tudo o que foi relatado, conclui-se que o Juntos é um movimento estudantil subordinado à lógica burocrática e aparatista, muito semelhante ao movimento governista. Por ser mais recente e estar fora do governo federal, se dá maiores liberdades no discurso, porém, mantendo uma mesma prática política no movimento e na formação dos seus militantes. Não é um movimento classista, que visa a unificação de trabalhadores e estudantes. É mais um estorvo no caminho da emancipação dos trabalhadores e da juventude proletária na luta pelo socialismo.

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