domingo, 7 de maio de 2017

O que é solidariedade de classe?*

A dominação da burocracia sindical sobre o CPERS impede o surgimento de uma consciência de classe na nossa categoria. Esta é uma das razões para vermos tanta alienação política e sindical no chão das escolas, que se expressa, de uma forma mais clara, nas redes sociais. A inexistência de consciência de classe leva à ausência de solidariedade de classe e facilita a vida dos governos e dos patrões. A nossa força reside no nosso número. Para fazer valer essa força é necessário união, organização e solidariedade de classe. Esta solidariedade é diferente da solidariedade “humana” em geral, que pode se dar em relação a uma calamidade natural e climática, ou relacionada a um problema de outra ordem. No caso da solidariedade de classe, trata-se de questões políticas, de companheirismo e cooperação entre os trabalhadores na luta pela sua emancipação.
A política das sucessivas direções do CPERS apenas aprofundou a divisão na base de nossa categoria. Os recentes episódios envolvendo remoções e demissões de educadores, em plena greve, também comprova a ausência de solidariedade de classe entre a categoria e, principalmente, dentro do CPERS. Sem cultivar esta solidariedade tão importante para a luta da nossa categoria, como falar em solidariedade intercategorias e sobre o internacionalismo proletário (isto é, a solidariedade entre os trabalhadores do mundo)?
                O capitalismo lança os trabalhadores numa luta entre si pela sobrevivência, representada pela concorrência por um emprego. Eles não percebem ou secundarizam que possuem um inimigo em comum, que se vale de suas necessidades imediatas para ganhar a vida; os donos do capital (a burguesia e, no nosso caso, o Estado), por sua vez, aproveitam-se do fato de não possuirmos meios de produção para nos obrigar a aceitar as suas condições empregatícias. A Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), fundada em 1864, tinha como um dos seus principais objetivos a solidariedade de classe internacional entre os trabalhadores do mundo.
                Nas suas Instruções para os delegados do conselho geral provisório, escrito em 1866, Karl Marx esboçou as diretrizes gerais da AIT, estabelecendo que ela tinha como objetivo “combinar e generalizar os esforços de emancipação, até agora desconexos, das classes operárias dos diferentes países”. Além disso, advertia para a necessidade de “contrariar as intrigas dos capitalistas”, que estão “sempre prontos, em casos de greves e lockouts, a abusarem do operário estrangeiro como ferramenta contra o operário nativo”, sendo que esta seria “uma das particulares funções que a nossa sociedade (a capitalista) tem, até agora, desempenhado com sucesso”. Conclui que um dos “grandes propósitos da Associação é fazer com que os operários dos diferentes países não só se sintam, mas atuem como irmãos e camaradas no exército da emancipação. Além dessas diretrizes gerais, a tradição da AIT incentivava o fundo de greve e o caixa de ajuda mútua para socorrer os operários nos momentos difíceis de perseguição e desemprego. Eram todas expressões materiais da solidariedade de classe. O ápice da organização deste movimento internacionalista se deu com a deflagração de greves de determinadas categorias do operariado que tinha como principal reivindicação a solidariedade para com outras categorias ou setores sociais que sofriam com os ataques patronais e a repressão; isto é: greve de solidariedade a outras categorias em greve. O quanto retrocedemos de lá para cá?

A solidariedade de classe e a divisão da nossa categoria
No caso específico do magistério público estadual, um dos grandes fossos que impede a unificação da nossa categoria é a divisão entre trabalhadores nomeados e contratados. Nada demonstra mais a total falta de solidariedade de classe do que esta relação, tal como os “debates” que se expressam nas redes sociais ou pela política reacionária da direção central. Como sabemos, esta divisão foi conscientemente construída por diferentes governos com a finalidade de rebaixar e restringir direitos, reduzir custos e, evidentemente, dificultar a unidade sindical. Quem não consegue enxergar isso é cego ou está interessado em manter esta divisão – em ambos os casos deveria estar bem longe da direção do nosso sindicato.
                Apesar de regimes de trabalhos diferentes e da forma de admissão, nomeados e contratados estão no mesmo barco: os segundos têm os mesmos deveres, mas não os mesmos direitos. Vimos neste início de 2017 o caos nas escolas, com demissões e remoções de professores, enquanto a direção do CPERS nada fez e naturalizou tudo, com exceção do ato simbólico contra a remoção do professor Zé, da escola ditador Costa e Silva, que também não conseguiu ser reintegrado em razão desta inoperância. Em muitos casos a política oficial do CPERS apenas reforçou o discurso patronal contra os trabalhadores contratados. Um dos casos mais bizarros se deu com um dirigente do núcleo 39, de Porto Alegre, que é contratado e perdeu todas as horas em sua escola. Ele simplesmente foi largado à própria sorte pela direção do núcleo e do CPERS. Quando elaboramos a bandeira da efetivação dos educadores contratados após 3 anos de efetivo exercício, por exemplo, foi baseado nesta necessidade de solidariedade de classe visando a unidade sindical da base. Porém, ainda que setores atrasados de nossa categoria tenham se oposto a ela por razões rebaixadas, nada classistas, também vimos uma resistência inaceitável por parte de correntes sindicais da atual direção do CPERS e das ditas de “oposição”; correntes que se dizem “socialistas”. Que espécie de “socialismo” podem defender se não são capazes de lutar pela igualdade de condições de trabalho entre uma mesma categoria? Para elas, os mecanismos legalistas do Estado burguês estão acima da luta concreta e da solidariedade de classe.
O caso do fundo de greve também é simbólico: a direção do CPERS tem lutado com todas as suas forças para não aprovar fundos de greve e, inclusive, tem justificado tais ações teoricamente, dizendo que não há mais espaço para este tipo de “solidariedade”. Apesar de arrecadar mais de R$1 milhão por mês, a direção do CPERS sempre afirma que “está no vermelho”. Em quê todas estas ações se parecem com as recomendações de Marx aos delegados da AIT?
                O avanço da direita no país tem intensificado os planos de ajuste do grande capital. Um dos objetivos é a destruição total dos planos de carreira para possibilitar a demissão de servidores nomeados. Da forma aristocrática como conduz a discussão sobre os contratados, a burocracia sindical do CPERS só poderá aprofundar a divisão da nossa categoria e ajudar a preparar as condições para a destruição dos planos de carreira – como tem feito com sua política desastrosa – e a demissão dos educadores contratados – como já estamos acompanhando. As correntes sindicais majoritárias do CPERS são incapazes de intervir nos debates da base da categoria, que expressam um profundo atraso político e apenas reforçam esta divisão, no sentido de elevá-los; isto é, no sentido de fazê-los saírem do campo das picuinhas individuais para o da política. A solidariedade e a consciência de classe, neste caso, seriam os nomeados defenderem os direitos dos contratados (que somente se expressaria através da sua efetivação); e os contratados, defenderem o plano de carreira, mesmo sem ter o direito a ele neste momento. Solidariedade de classe também significa possibilitar a concretização de uma rede com a estrutura material do sindicato aos colegas descontados, removidos e demitidos; além de criar caixas de solidariedade e fundos de greve. Se não existem condições financeiras em determinado momento, há que se criá-las como uma de nossas prioridades.
Somente uma direção classista e revolucionária pode trabalhar para desenvolver solidariedade e consciência de classe em nossa categoria. O sindicalismo burocrático e reformista representado pelas sucessivas direções do CPERS apenas aprofunda o caos e a desunião no chão das escolas, deixando-as à mercê da sua própria sorte. A formação teórica continua sendo uma de nossas armas mais poderosas para desenvolvermos esta consciência de classe. Porém, ela precisa ser classista, revolucionária e deve se esforçar para integrar a base da categoria em todos estes debates.

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*Texto escrito por um militante da oposição de esquerda à burocracia sindical do CPERS.

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