terça-feira, 24 de novembro de 2015

A única vez em que Stalin foi sincero

me enterrem com os trotskistas
na cova comum dos idealistas
onde jazem aqueles
que o poder não corrompeu
(Paulo Leminski)

Firmou-se a falsa ideia de que “o socialismo não deu certo”. Basta pronunciar a palavra “socialismo” e lá vem o discurso padrão! O surgimento de uma nova sociedade é um processo contraditório e não pode ser visto pela ótica utilitária do consumidor de classe média que pega uma mercadoria na prateleira e liga para o PROCON se ela “não funciona” como o esperado. Além deste reducionismo, o debate sobre “socialismo” é refém de uma grande ignorância, pois aqueles que sustentam que “não deu certo” nunca abriram uma única página de qualquer livro que analisa detalhada e cientificamente o problema das antigas experiências socialistas.

O socialismo é um sistema alternativo ao capitalismo. Não existe uma receita de bolo para aplicá-lo e nem um modelo pré-pronto. As experiências “socialistas” que tivemos degeneraram em regimes de nova opressão, chamados de stalinismo. Isto não atesta a ineficiência do socialismo. É, antes de tudo, fruto do isolamento internacional, da guerra, da derrota da revolução nos demais países europeus, do atraso da herança cultural e econômica dos países onde ocorreram, da política catastrófica de suas direções stalinistas e do seu programa; em suma, da conjuntura histórica de que cada país era refém. Lembremos que todas as revoluções do século 20 ocorreram em países extremamente atrasados. A história nunca nos brindou com uma revolução socialista em um país imperialista.

Ainda existe socialismo?
Atualmente, nenhum dos países que são insistentemente taxados de “socialista” pela grande mídia e pelo senso comum o é realmente. O socialismo não pode existir em só um país. Cuba, China, Coréia do Norte são países que já regrediram ao capitalismo, apesar de, em alguns casos, manter à cabeça do governo membros ou partidos que viveram e dirigiram a revolução no passado. Para todos aqueles que estudaram a fundo a história do movimento operário – sobretudo o trotskismo – a restauração do capitalismo não é nenhuma surpresa.

As vertentes socialistas de pensamento
É preciso dizer que existem diversas vertentes de pensamento dentro do movimento socialista: revolucionária, reformista, anarquista, etc. Algumas das mais importantes se conformaram dentro da União Soviética (URSS). Cabe destacar a luta entre o stalinismo e o trotskismo, que foram decisivas para o desfecho das experiências socialistas, uma vez que o primeiro consolidou um aparato político não apenas dentro da URSS, mas em diversos outros países através dos PCs ou mesmo cooptando as lideranças das revoluções que triunfaram posteriormente (coreana, cubana, chinesa).

Trotskismo X stalinismo: duas maneiras de interpretar a ditadura do proletariado
O trotskismo foi a corrente política que manteve vivo o pensamento marxista e leninista frente às grotescas distorções teóricas do stalinismo para justificar a sua prática política. Corajosamente os oposicionistas trotskistas denunciaram, um a um, cada desvio programático e cada fato absurdo na condução política do aparato. Em especial o trotskismo deu um grande destaque à denúncia da degeneração do partido: asfixia dos organismos de base, seguidismo, conchavos de bastidores, pseudo educação política que nada mais era do que o esvaziamento do pensamento crítico; perseguições, falsificações, deportações, prisões e torturas.

Como funcionava a cabeça do aparato soviético?
Stalin manobrou de todas as formas possíveis até ter em suas mãos todos os fios do aparato e liquidar seus oponentes, chantagear os indecisos, comprar os vaidosos, amedrontar os medrosos; falsificar fotos, livros, posições políticas de qualquer adversário (mas em particular do trotskismo). Matou um a um os velhos bolcheviques, pois estes representavam uma ameaça somente por saber qual era o verdadeiro legado de Lenin. Distorceu a teoria marxista como poucos, pois mudava de posição conforme suas conveniências e usava o poder do aparato para naturalizá-la contra qualquer possibilidade de questionamento.

O pior legado de Stalin
Contudo, o pior legado de Stálin não foi a repressão, mas o fato de ter enlameado o nome do socialismo e o de Lenin perante os olhos dos trabalhadores do mundo, facilitando a campanha ideológica da burguesia e a subsequente restauração do capitalismo. Trotsky teve razão quando o denunciou como o “coveiro da revolução”!

Em memória dos trotskistas
Os trotskistas corajosamente lutaram contra tudo isso em uma situação histórica dramática: isolados, caluniados, perseguidos. Afirmaram: “seguiremos criticando o regime stalinista até que fechem nossa boca fisicamente”. E assim se deu efetivamente: Trotsky foi expulso da URSS em 1929, muitos dos seus partidários foram presos, deportados para a Sibéria, coagidos a capitular ou mortos. Stálin não desistiu até conseguir assassinar Trotsky, no México, em 1940, pois sabia que a sua denúncia era implacável, muito bem armada e impossível de ser respondida (a não ser pela calúnia ou pela violência). O trotskismo nos legou uma preciosa obra política e teórica capaz de nos dar lucidez para formarmos um verdadeiro juízo sobre o que foi a experiência “socialista” na Rússia.

Stálin sincero: ao menos uma vez!
Na grande obra de Pierre Broue, O Partido Bolchevique, podemos tomar consciência de todo o processo de degeneração do partido e do Estado soviético que levaram ao surgimento do stalinismo. Sua valiosa pesquisa histórica é imprescindível para as gerações futuras e é leitura indispensável para qualquer indivíduo que queira ter opinião sobre “socialismo”. O livro tem o seu ponto alto quando traz a declaração de Stalin, registrada em ata, sobre a expulsão de Trotsky da URSS; única vez em que abriu seus planos:

Trotsky deve ser exilado no estrangeiro: 1º) Porque enquanto permaneça no nosso país, será capaz de dirigir ideologicamente a oposição, cuja força numérica aumenta incessantemente; 2º) Para ser desacreditado perante as massas mundiais como um cúmplice da burguesia, a partir do momento em que se encontre em um país burguês; 3º) Para poder desacreditá-lo frente ao proletariado soviético, pois, sem dúvidas, a social-democracia se utilizará de seu exílio contra a URSS, correndo ao auxílio de Trotsky, “vítima do terror bolchevique”; 4º) Se Trotsky atacar a direção com denúncias, poderemos acusá-lo de traição. Todas essas razões depõem pela necessidade de exilá-lo[1].

Eis uma pequena mostra de como a direção política stalinista liquidou a vertente socialista progressiva de dentro do território soviético, levando o socialismo a “não dar certo”.

Como se combate a monstruosa herança stalinista?
Os trabalhadores precisam perceber que se combate o stalinismo com a democracia operária (conselhos populares, liberdade sindical aos trabalhadores, socialização das decisões de estado, etc.) e não com a democracia burguesa, que pressupõe o capitalismo como sistema econômico; e este, como se vê, não representa futuro algum para a humanidade.

O que a burguesia recomenda para se entender o que é o socialismo?
A burguesia, através da sua grande mídia, sempre recomenda os mesmos livros viciados, traiçoeiros, que mostram as experiências socialistas através da sua ótica. Não há debate político, mas veneno subjacente. O oponente não olha nos olhos, mas pelas costas. Abaixo seguem alguns títulos:

            - 1984 e A revolução dos Bichos, de George Orwell;
            - O zero e o infinito, de Arthur Koestler;
            - O livro negro do comunismo, de vários autores;
            - Tudo o que você precisa saber para não ser um idiota, de Olavo de Carvalho

E outras preciosidades do gênero...

Para saber realmente sobre socialismo é preciso ler mais do que é vendido pela grande mídia
Para quem quiser ter opinião sobre socialismo (e não preconceito), recomenda-se as seguintes leituras que nos contam a experiência socialista pela ótica dos trabalhadores avançados:

- O Partido Bolchevique, de Pierre Broue
- A revolução traída; A revolução desfigurada; As lições de outubro; Stálin, o grande organizador de derrotas; A internacional depois de Lenin; A revolução russa – conferência; A natureza da burocracia soviética; Minha vida; dentre outros livros de Trotsky.
- Cartas das secretárias e o Testamento de Lenin, bem como os seus últimos artigos;

É importante ler as duas listas e comparar o conteúdo de cada bibliografia.




[1] Extraído de “O Partido Bolchevique”, de Pierre Broue.

Nenhum comentário:

Postar um comentário