sexta-feira, 20 de setembro de 2024

A abolição da escravidão foi uma revolução?


Treze de maio traição,
liberdade sem asas
fome sem pão
(Oliveira Silveira)

O movimento abolicionista foi
proeminentemente
um movimento da própria classe proprietária
(Joaquim Nabuco)

Os poucos negros que sobreviveram
ao sistema genocida da escravidão
não receberam mais que a emancipação civil,
nada ganhando no terreno econômico e social.
Sozinhos haviam trabalhado a terra por 3 séculos e meio,
e no entanto, saíram da escravidão
sem uma nesga de terra.
O racismo que os persegue ainda hoje,
prova que não se livraram
das sobrevivências ideológicas
de um passado maldito.
(Décio Freitas)

         Uma vertente marxista da historiografia brasileira muito competente, liderada por Jacob Gorender, nos brindou com grandes trabalhos acerca da formação econômica do Brasil. A despeito dessas brilhantes contribuições, existem apontamentos curiosos, como, por exemplo, interpretar a abolição da escravidão em 13 de maio de 1888 como uma “revolução”.

         Num pequeno livro, intitulado “A burguesia brasileira”, Gorender sustenta a ideia de que a abolição da escravidão teria sido o único processo revolucionário vitorioso da história do Brasil.

         Segundo suas palavras: “O que me interessa ressaltar consiste em que considero a extinção das relações de produção escravistas, no Brasil, um evento revolucionário. Ou dito de maneira mais taxativa: a Abolição foi a única revolução social jamais ocorrida na História de nosso país” (A burguesia brasileira - Jacob Gorender, Editora Brasiliense, coleção primeiros passos, 1981 - página 21).

         E mais adiante: “com todas as suas limitações, a Abolição não deixou de ser uma revolução. Pela via da luta política, deu vigoroso impulso à eliminação de formas de exploração já esgotadas” (idem - página 22).

 

A natureza das mudanças sociais ocorridas no Brasil até então

O desenvolvimento do capitalismo no Brasil seguiu a “via prussiana”, o que significa dizer que elas se deram pelo alto e sem participação popular.

O conceito de “via prussiana” foi cunhado por Lenin e desenvolvido posteriormente pelo comunista italiano, Antonio Gramsci. Adaptado à realidade brasileira isso significa dizer que as transformações ocorridas na história brasileira não resultaram de autênticas revoluções (sejam elas burguesas ou proletárias); de movimentos independentes provenientes de baixo para cima, envolvendo o conjunto da população e abrindo o caminho para o capitalismo (no caso do fim da escravidão); mas se processaram através de acordos de bastidores entre as elites, de uma conciliação entre os representantes de grupos opositores dominantes economicamente. Conciliação esta que se expressa sob a figura política das “reformas pelo alto”. 

Esta conciliação pelo alto jamais escondeu a intenção de manter marginalizadas e reprimidas as classes e camadas sociais “de baixo”. O conceito de “revolução passiva”, adotado por Gramsci para explicar o desenvolvimento do capitalismo na Itália, expressa o mesmo conteúdo que pretende sintetizar a ausência de participação popular nestas decisões políticas.

Ao longo da história do Brasil podemos constatar uma “revolução passiva” — isto é, uma “modernização conservadora — não apenas na questão da abolição da escravidão, mas, também, na proclamação da “independência”, em 1822, e da República, em 1889. Gorender reconhece que a abolição apenas eliminou “formas de exploração já esgotadas”. A elite cafeicultora e escravocrata somente acelerou o pacto pelo fim da escravidão por perceber o esgotamento de um modelo econômico. Isso foi feito, em parte, a contragosto, mas sem perder o controle do processo em nenhum momento.

Na medida em que a revolução industrial consolida-se no mundo, o capitalismo começa a firmar-se no Brasil no final do Segundo Reinado (1840-1889) e o sistema escravista acelera a sua deterioração — não por ação revolucionária do povo, mas pelas próprias mudanças econômicas. Assim, a elite “moderniza-se” para conservar seu poder. Quando essa transformação para o modelo capitalista industrial se completa no mundo, o escravismo brasileiro fica definitivamente condenado e, por isso, se fez necessário mudar, mesmo a contragosto da elite nacional. 

Cabe destacar ainda que reconhecer essas limitações nas mudanças sociais do Brasil não significa que não possam ser diferentes no futuro, nem que não tenha havido pressão popular em muitos níveis. Porém, tais pressões não se transformaram em um processo revolucionário vitorioso por várias razões.

 

A luta dos escravizados e o 13 de maio de 1888

         Reconhecer que as mudanças sociais no Brasil se deram a partir de modernizações conservadoras, controladas e pactuadas pela elite nacional, em nada significa se contrapor ao fato trazido por Gorender e outros historiadores, de que houve muita luta dos trabalhadores escravizados — seja através dos quilombos espalhados pelo território nacional, seja através dos ativistas do abolicionismo ao longo do século XIX.

         Contudo, para nos aproximarmos mais da realidade histórica, há que se reconhecer, forçosamente, que estas lutas não conseguiram se transformar em uma revolução social capaz de liquidar o regime de exclusão e exploração imposto pela elite nacional, que teve a empáfia e a capacidade de vender a sua versão do liberalismo econômico como algo compatível com a escravidão.

         É verdade que, a partir de 1880, quando a campanha abolicionista se fortaleceu, as ações de resistência dos escravos foram acelerando o processo político e econômico de abolição: fugas em massa, invasão de propriedades para libertar outros cativos, recusa em trabalhar, desobediência civil, até o assassinato de alguns senhores foram meios de luta durante a agonia final do regime escravocrata brasileiro. Contudo, mesmo momentaneamente acuada, a elite nacional antecipou-se e pactuou a abolição, de forma gradual, controlada e exigindo indenização, para evitar os riscos de um levante social de maiores proporções. Sua estratégia deu certo.

         Basta comparar a abolição da escravidão brasileira com a haitiana. No Haiti, entre 1791-1804, houve um processo revolucionário que levou à abolição da escravatura através da derrubada do governo colonial. É visível a diferença entre a abolição da escravidão no Haiti e no Brasil — e esta diferença deve ser o nosso norte para diferenciar uma revolução social de uma “revolução passiva” (ou modernização conservadora).

         Ainda que se possa questionar a revolução haitiana, afirmando se tratar de uma insurreição popular e não de uma revolução; ou que ela terminou derrotada em razão do embargo econômico e asfixiamento por parte da Espanha e dos EUA, houve sim uma articulação política dos escravizados e um desfecho que significou uma ruptura que nem de perto vimos no Brasil.

         Aqui, ao contrário, os escravos não desempenharam o papel de uma classe revolucionária e não se pode, a despeito das várias e isoladas insurreições escravas, falar em uma “revolução de escravizados”. A nova ordem não foi imposta pelos escravos a partir de uma posição dominante. Houveram fugas e levantes locais, mas sem o “perigo” de insurreição geral. Em resumo: os oprimidos e os explorados não promoveram um reordenamento geral da sociedade de acordo com seus interesses e suas necessidades.

         O historiador gaúcho Décio Freitas, um destacado estudioso da escravidão brasileira, aponta que “é inadequado classificar como revolução uma mudança lenta, pacífica e legal, sem comoções sociais ou confrontos dramáticos entre as classes. De maneira especial, esta mudança não corresponde ao conceito de revolução social prevalecente na historiografia marxista” (Décio Freitas in O escravismo brasileiro. Editora Mercado Aberto, Porto Alegre, 1982 - página 140).

 

Uma abolição com indenização?

         Quem dirigiu o processo social de lutas, fugas e levantes isolados foi, incontestavelmente, o movimento abolicionista, composto por ex-escravos, poetas, jornalistas e políticos republicanos. 

Este movimento surgiu quando a escravidão já estava moribunda, em franco processo de desagregação, dadas as inúmeras proibições e pressões internacionais, sobretudo do imperialismo inglês. Os abolicionistas nunca formularam uma crítica sistemática, radical e profunda da sociedade brasileira, apenas pontualmente da questão da escravidão e da monarquia.

         É fora de questão que cumpriram um papel progressivo ao pressionar e a concretizar a lei áurea, contudo, tratou-se, como assinalou Décio Freitas, de uma lei de proprietários de escravos para proprietários de escravos, que se proporcionavam a si próprios um generoso presente às custas de toda a população. A abolição foi precedida por acaloradas discussões acerca de um “fundo de emancipação” que teria finalidades de indenização aos proprietários de escravos para “evitar que o país e a economia quebrassem” argumento sempre evocado pela elite brasileira em distintas épocas históricas.

         Este fundo recebeu maciço apoio dos cafeicultores de São Paulo, já que receberiam estímulos para repor a mão de obra dos cafezais, a começar pelo incentivo à imigração europeia e da indenização indireta através dos chamados “auxílios à lavoura”. Isso resultou não apenas na abolição da escravidão pelo alto, como também serviu de base para a dominação política e econômica paulista ao longo da República Velha.

         Não houve indenização, mas os cafeicultores chegaram muito próximo disso, de forma indireta, conseguindo diversos incentivos. A começar pela própria proclamação da República: os cafeicultores perderam a indenização direta, mas ganharam o poder político e o Estado nacional.

 

Reconhecer os limites do abolicionismo é capitular ao identitarismo burguês?

         Existe uma corrente política internacional hegemonizada pelo partido democrata estadunidense que professa o identitarismo burguês, onde apenas alguns negros e negras, bem como mulheres e LGBTs seriam incorporados à cúpula do sistema (ou à sua classe média), como uma suposta forma de reparação, em detrimento da massa da população, que continuaria oprimida no dia a dia e sofrendo os piores tipos de preconceitos. É este movimento internacional que acaba por dar as diretrizes que influenciam os principais movimentos de massas de esquerda no Brasil atualmente.

         Por acaso o identitarismo teria influenciado a visão historiográfica que define a abolição da escravidão no Brasil como “passiva” e não revolucionária? Julgo que não.

         Certamente existem tendências aburguesadoras no movimento negro, que o deixam refém da institucionalidade capitalista, acabando por ver nisso um fim em si mesmo. Contudo, é equivocado não demonstrar os limites do 13 de maio de 1888, que são por demais evidentes — e considerar quem o faz de “identitário”.

         Mesmo que a elite cafeicultora imperial tenha se oposto à abolição e aderido à ela a contragosto, se voltando posteriormente contra o próprio Dom Pedro II e o Império, isso não significou, em nenhum momento, a perda do poder político estatal e social. Tampouco significou o fim da miséria, da fome e da dependência política e econômica da massa de ex-escravos.

        A resposta a este impasse foi dada involuntariamente pelo próprio Gorender, que reconheceu que a escravidão como forma de exploração “já estava esgotada”. Isto é, o Brasil, como o último dos grandes países a abolir a escravidão, encontrava permanentes entraves para a sua continuação. Contrariada e pressionada desde o início do século XIX, tanto interna quanto externamente, a elite escravocrata se viu obrigada a dar esse passo decisivo, que pode ser encarada como uma “concessão providencial”, mas, jamais, como uma revolução. 

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

A suja “arte da guerra” de Pablo Marçal


Quem luta com monstros deve cuidar
para que, ao fazê-lo,
não se transforme em um
(Nietzsche)

As eleições municipais de São Paulo prenunciam o possível futuro eleitoral do país.

Nas últimas eleições municipais Guilherme Boulos (Psol) foi ao segundo turno quase derrotando o tradicional partido da burguesia paulistana, o PSDB; e desde o início deste ano lidera as pesquisas eleitorais para a prefeitura. Sempre pensando à frente, o empresariado paulista não quer pagar pra ver.

O capitalismo tende a transformar tudo em um grande cassino. A democracia burguesa é uma espécie de hipódromo, onde os grandes capitalistas podem apostar nos cavalos que têm maior chance de vencer e de defender a sua pauta ou trocar de aposta antes, durante ou depois, de acordo com o seu “pragmatismo empresarial”.

Não que a candidatura de Boulos e do Psol represente uma grande ameaça ao capital, mas sempre coloca o problema da disputa pelo orçamento com o empresariado, que quer o tesouro público como fiador do lucro privado; além de trazer pautas que são desagradáveis para as elites e a classe média mais reacionária.

A direita e o empresariado paulista não podem perder o controle direto sobre a maior cidade do país, que serve de vitrine não só para o Brasil, mas para a América Latina inteira. Os tucanos serviram bem durante muitos anos, mas agora não servem mais. O grande capital tende a apoiar todo candidato direitista que dispute com a suposta “esquerda” e a migrar com peso para as candidaturas com maior chance de vencer Boulos.

O empresário e “coach” Pablo Marçal, sabendo como funciona as engrenagens do sistema, apostou tudo e se lançou na disputa para se tornar o capitalizador dos investimentos do empresariado paulista, preocupado com a possibilidade de eleição de Boulos, visando se tornar o candidato preferencial do grande capital (basta ver, por exemplo, a ampla cobertura que a CNN faz do candidato). Para isso, comprou a sua vaga no PRTB, um partido que supostamente tinha raízes trabalhistas, mas que não passa de mais uma legenda de aluguel.


Marçal aprofunda as táticas bolsonaristas

Num momento em que o bolsonarismo vive uma pequena crise, Marçal avança nas táticas e na estratégia bolsonarista, que foi inspirada por Donald Trump, Steve Banon e Olavo de Carvalho. Porém, de um modo nada ortodoxo. Pelo visto, pretende superar os mestres no quesito de sujeira, distorções e mentiras.

A começar que Marçal aposta as suas fichas na provocação direta, na massificação da manipulação midiática e da psicologia de massas, via redes sociais, e usa sua fortuna como instrumento de luta política, tal como preconiza a principal liderança neofascista, Donald Trump.

Contudo, Marçal não para por aí. Ele introduz sua própria marca a partir da utilização de provocações baixas e histriônicas. Mesmo Bolsonaro e Trump mantém uma certa “postura de cavalheiros” durante os debates — ainda que vomitem ofensas e absurdos nas suas falas.

Marçal não. Ele provoca, performatiza, gesticula, agride com palavras baixas e gestos os oponentes no meio do debate ou em entrevistas. Não espera seus robôs atuarem. Faz antes do que eles e visa atingir muita gente que pensa que fazer isso “é ser contra o sistema” e a política tradicional.


A mentalidade popular que tende a idolatrar milionários e coachs

A sua tarefa de deslocar as intenções de voto para si a partir de distorções escandalosas, provocações baratas e declarações histriônicas, infelizmente encontra eco entre grande parte da população pobre, que tende a idolatrar milionários e coachs — ainda mais em São Paulo, a autointitulada “terra do empreendedorismo”. 

Este tem sido um tema impenetrável para a “esquerda”: a psicologia de massas! Mas não é nenhum pouco desprezível por parte da direita e dos grandes empresários, que a observam atentamente.

Grande parte da população, mesmo a mais pobre e miserável, detém-se respeitosamente diante da tradição, do “acúmulo da fortuna” e da propriedade privada. A doutrinação burguesa do empreendedorismo e do “suor do trabalho” lhe calou fundo e serve como armadilha contra si mesma.

Por que isso acontece? Ninguém conseguiu explicar bem, embora todas as correntes de esquerda prefiram ignorar o tema e continuar acreditando nos votos ou numa redenção miraculosa a partir de uma explosão popular que fica cada vez mais distante, já que quem tem conseguido capitalizar as mobilizações de rua é a própria direita.

Os milionários, como o próprio Marçal, conseguem se tornar ícones políticos, enquanto que a “esquerda” atola-se na mesmice ou no brutal isolamento. Parte da sua tática é usar a carteira de trabalho como um estandarte, quando na realidade ele não tem nem ideia do que é viver do próprio trabalho e não está nem aí para a realidade cotidiana da classe trabalhadora — sobretudo aquela precarizada, que não tem carteira assinada.

Como ele consegue criar essa confusão e ainda por cima “convencer” a maioria da população usando um truque barato como esse senão a partir dessa mentira que a população mais pobre gosta de acreditar de que os milionários enriqueceram a partir do próprio trabalho?


Quem “sequestra emocionalmente” a cidade e os debates?

Por não entender as estratégias neofascistas baseadas em manipulações da psicologia de massas, a esquerda perde terreno, palmo a palmo, e enreda-se na sua falta de resposta e compreensão. Marçal acusa Boulos do crime que comete — “sequestrar emocionalmente” a cidade — e fica tudo por isso mesmo!

É exatamente a campanha de Marçal, de Bolsonaro e do neofascismo em geral que “sequestra emocionalmente” o debate, prendendo-o em enredos sádicos, conspiratórios, fake news e nas picuinhas pessoais mais escabrosas. Não há possibilidade de debate político, programático, racional; mas apenas pequenos factóides, em sua maioria, irreais, baseados em ataques pessoais. Colocando este tipo de bloqueio emocional nas discussões, se cria ambientes para “lacrar” e evitar qualquer discussão real.

Os motivos egotistas que levam Marçal a se candidatar exerce um certo fascínio sobre o eleitorado de classe média e baixa, e mesmo sobre parte da classe trabalhadora — isto é, pessoas cuja vida dura e cujas frustrações as tornam presas fáceis de objetivos ilusórios simples, carregados de emoção. Quanto menos claro e concreto o programa de governo escondido atrás de frases histriônicas e “lacradoras”, mais aumenta o fascínio em torno da violência simbólica e real.

Ninguém com poder procura deter isso: grande imprensa, judiciário ou classe média; a própria esquerda (seja a reformista ou mesmo a “revolucionária”) fica paralisada ou falando disparates, sem se preocupar com as causas ou com a tentativa de relembrar as manipulações do passado. Todos órgãos oficiais e a grande imprensa “democrática” julgam ser um debate absolutamente normal e legítimo.


Uma democracia à base de enganação e do esquecimento

Marçal ataca a “ditadura” da Venezuela e condena a decisão do STF de tirar do ar o twitter (X) como uma censura, tomando estas bandeiras da grande mídia, que passa a vê-lo com uma simpatia não declarada — ainda que tenha que fingir certo horror quanto a alguns de seus métodos (o mesmo que fazia com Bolsonaro).

A “democracia” burguesa brasileira baseia-se na enganação e no esquecimento. Permite todo o tipo de método anti-debate, inclusive ataques pessoais infundados que destroem e distorcem campanhas inteiras. Nunca cobra retratação, nem punição, para que o método siga livre e em funcionamento.

Marçal é o herdeiro de uma longa tradição “democrática” brasileira. Em 1989, a elite nacional autorizou uma campanha de difamação contra Lula para evitar a sua possível eleição. Desde a manipulação do debate eleitoral pela Rede Globo, até o lançamento de panfletos supostamente anônimos que afirmavam que Lula iria colocar mendigos para morar dentro dos apartamentos de classe média. Nenhuma autocrítica foi feita pela grande mídia ou pela justiça. Tampouco o petismo relembra tais temas em suas peças publicitárias e campanhas atuais. Acaba sendo parte do “esquecimento”.

Em eleições recentes o mesmo método foi utilizado contra o PT, como a mentirosa afirmação de que se Lula vencesse em 2022 ele fecharia as igrejas evangélicas. Nada foi feito para inibir esse tipo de distorção novamente, tampouco um grande esclarecimento público oficial pela grande mídia, justiça e o próprio PT. Quando algo é feito para coibir a direita — que é campeã da prática da censura no Brasil e de reclamar dela em outros países — se levanta e acusa este regramento de “censura”, no que é apoiada por parte da população e pelo silêncio da grande mídia!

A destruição da reputação de alguém ou de uma campanha com base em mentiras, inviabiliza o debate, o esclarecimento público e a própria democracia. É a legalização tácita da má fé. 

O mesmo está sendo feito agora por Marçal na disputa pela prefeitura de São Paulo, não encontrando resistência à altura por parte de Boulos e do Psol — no que repetem o PT mais uma vez. A direita e seus marqueteiros têm plena consciência da impunidade quanto a utilização deste jogo sujo e baseiam seus dividendos eleitorais em cima desta tática.

Se não há punição, retratação ou denúncia por parte da grande mídia, da justiça e dos próprios partidos de “esquerda”, tanto das distorções e calúnias do passado quanto das feitas no presente, com a finalidade de desencorajar e desmentir esse tipo de jogo sujo, então, não haverá enriquecimento do debate público nacional, nem debate democrático algum. Não haverá, portanto, a menor possibilidade de enriquecer e elevar o nível da opinião pública nacional e viveremos de picuinhas e calúnias, chafurdando no mesmo círculo vicioso para que o povo e o país não avancem 1 centímetro.

É precisamente isto que a direita entende por “liberdade de expressão” e “democracia”. É este “sequestro emocional” do debate público que precisamos entender e desmascarar o mais amplamente possível. Quando lhe limitam ou lhe tiram este “direito de jogar sujo” ela grita contra a “censura”.

Nesta hipocrisia, lamentavelmente, ela tem contado com o apoio — ou pelo menos o silêncio conivente — de grande parte do povo.