Hegel diria que os povos do mundo são incapazes de aprender uns com os outros.
O povo argentino, constituído de uma elite tipicamente colonial e uma massa miserável, possui, em seu interior, razões distintas para eleger Milei.
Para a elite argentina e estadunidense, Milei é uma arma de guerra — sobretudo contra os BRICs. Para o povo, uma esperança manipulada e, portanto, furada — reforçando e mexendo em crenças esotéricas e religiosas bizarras.
Muita gente no Brasil e no mundo culpa o "desgaste do peronismo", o que "justificaria" a eleição de Milei. Certamente contribuiu o impasse político que o peronismo representa (o mesmo vale para o petismo no Brasil), mas não foi a única causa. Talvez nem a principal.
A estrutura econômica da Argentina, sua crônica crise financeira, resultado de sua evolução histórica; e a manipulação da psicologia de massas — não combatida e não debatida pela esquerda, que sempre reproduz o mesmo ramerrão político — são os motivos centrais, visto que o neofascismo já construiu uma espécie de "internacional" em diversos países e regiões. Milei faz parte disso.
Em geral, os estados latino-americanos — e o Estado argentino em especial —, que emergiram do processo de internacionalização da economia entre os séculos XIX e XX, apresentaram uma débil capacidade extrativa própria e uma forte dependência do financiamento externo. Como sempre, os recursos do Estado passam a ser disputados por "projetos nacionais": de um lado a elite procurando manter um projeto excludente, de enriquecimento de poucas famílias e, geralmente ligado às burguesias internacionais mais dinâmicas; de outro, projetos "desenvolvimentistas" de cunho "distributivo", que buscam a conciliação com setores golpistas e arrivistas, que mantém o alto preço do dólar e a dependência extrema desta moeda, pois lhes garante lucros maiores e mais imediatos. Seu "projeto de país" passa a ser, então, manter esta dependência internacional.
O peronismo sempre representou uma ameaça para estas bases de acumulação dos setores economicamente dominantes na Argentina. Milei, como Bolsonaro no Brasil e Trump nos EUA, segue a mesma receita: utiliza a confusão, o misticismo, as fake news, declarações bizarras e tonitruantes, o suposto "combate à corrupção" e à "gastança do ineficiente Estado" para confundir, dividir e reinar.
Nada do que é realmente essencial no discurso e na prática neofascista é combatido pela atual militância de "esquerda", seja em que esfera for. A "esquerda" atual a nível mundial não está preparada para enfrentar este movimento internacional. Precisa se reciclar, mas não dá mostrar de caminhar nesse sentido. Enquanto isso, os monstros nascem e crescem nesta recusa da esquerda em se renovar e na repetição do "mais do mesmo".
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