Meu primeiro voto foi no Lula. Em 2002 estava me formando no Ensino Médio e recém tinha completado 18 anos. Olhando retrospectivamente não me arrependo: estava de acordo com a minha consciência da época.
Olhando para toda história do país, o PT foi o que de melhor a classe operária conseguiu produzir enquanto movimento de massas. Também foi o que mais se aproximou de uma expressão política da classe operária (sim, eu sei que é pouco e que hoje podemos mais; por isso a razão de ser desta reflexão). De 1979 (ano da fundação) até 1987 (ano do seu 5º encontro nacional), partindo de experiências de organizações de base, locais, barreais e sindicais, surgiram boas sínteses políticas e teóricas que tateavam na busca por um "socialismo brasileiro", renunciando às experiências sociais-democratas (reformistas) e burocráticas (stalinistas). Teve papel decisivo no fim da ditadura militar, embora tenha se iludido e deslumbrado com o novo regime "democrático" que se abria.
Vieram os anos de 1988 (Constituição Federal) e 1989 (1ª eleição que Lula participou) e a década de 1990, que adaptou as pretensões dos programas e declarações políticas à democracia burguesa. Faltou clareza, honestidade e ousadia para romper com esta armadilha. O pragmatismo e o imediatismo exigiram o sacrifício do programa. Este caminho sem volta desemboca num único lugar: a traição de classe.
O sindicalismo combativo que desbancou os "pelegos" dos sindicatos oficiais dos militares transformou-se no sindicalismo cidadão cutista. Adaptou a organização de base dos trabalhadores ao viciado jogo democrático-burguês. O orçamento participativo não decidia nada. A denúncia dos 300 picaretas com anel de doutor transformou-se na busca utilitária de "governabilidade" com o PMDB, PP, PSB et caterva. A "carta ao povo brasileiro", escrita por Lula quando da sua primeira posse, rasgou as primeiras declarações pretensamente classistas do partido e o submeteu totalmente às diretrizes do mercado e do sistema financeiro. Em 2002 ainda não tinha consciência para compreender a gravidade dessa carta.
Lula não está sendo condenado por corrupção. A burguesia brasileira jamais condenaria um político por isso (e o seu sistema judiciário, sua mídia, seus partidos e personalidades tampouco tem moral para isso). Isso significa se condenar a si própria. Ela está condenando a história pregressa de Lula. Quer desmoralizar a primeira trajetória do PT; dar a entender que todo o movimento se perverte; que Lula é apenas mais um; que não há saída senão submeter-se à sociedade tal como ela é, aceitando os partidos tradicionais, a corrupção tradicional, o poder absolutista do mercado e do sistema financeiro.
Não!
Não fiquemos cego com a peste emocional sustentada pela repressão e decadência moral da sociedade burguesa, pela mídia, pela perversão e pelo sadismo da classe média. Lula precisa ser julgado pelos trabalhadores e condenado por sua traição ao programa proletário, por sua adaptação ao regime democrático-burguês. Aprendamos definitivamente com uma amarga experiência: o reformismo e a conciliação de classe (frente popular) não gera outra coisa senão a adaptação e a traição. Toquemos fora a estratégia ilusória social democrata (ou democrático-popular, no linguajar petista) e a superemos por uma estratégia política revolucionária, de organização por local de trabalho, por bairros, pela base. Continuemos no caminho perseverante de onde o PT se desviou em 1987. Não julguemos a doutrina e o programa pela prática daqueles que a traíram, mas por aqueles que a mantém de pé sob as circunstâncias mais adversas.
Superemos o PT por um partido e uma estratégia melhor. Sem messias e sem conciliação de classe. Jamais sujei minhas mãos votando no lamaçal podre e colonial do PSDB, PMDB, Dem., etc.; e jamais as sujarei! Também não desperdiçarei meu voto outra vez no Lula e em um partido já superado pelo teste da História. Não sou refém do cinismo do "menos pior" e, tampouco, da peste emocional da direita colonial
Meus olhos estão no futuro, respeitando as boas experiências do passado. Parte da esquerda se apega ao passado e tem medo do novo. Não há como superar o velho sem tocar nas feridas, combater as ilusões flagrantes e buscar corajosamente a nossa própria autonomia.