quarta-feira, 22 de novembro de 2017

O estelionato eleitoral de Sartori

O governo Sartori foi eleito com o seu conhecido slogan "o meu partido é o Rio Grande", querendo dar a ideia de que colocava os interesses do povo e do Estado acima dos interesses partidários e político-programáticos. Esta falsa retórica tem sido usada pela direita aqui e mundo afora (PMDB, PSDB, MBL, D. Trump, etc.). Dória, por exemplo, seria apenas um "empresário" eficaz, que não daria vazão à politicagem. O fato de ele ter sido eleito pelo PSDB seria um mero detalhe. O mesmo poderíamos dizer de Sartori, que mesmo eleito pelo PMDB (conhecida quadrilha de estelionatários), teria como seu partido o "Rio Grande".
Durante sua campanha, Sartori deveria ter apresentado seu verdadeiro programa: política econômica recessiva, privatizações, parcelamento salarial de servidores, destruição dos serviços públicos, etc. Esta é a sua única e verdadeira política para a educação e saúde públicas, bem como para o "desenvolvimento do Estado". Como insiste em dizer, a suposta "crise financeira" começou muito antes do seu governo (omitindo, é claro, que o precursor dela foi Antonio Brito, também do PMDB, cujo líder do governo na ALERGS foi ele próprio). Como um assunto tão grave como esta "crise", que começou muito antes, pôde ser ignorado durante a campanha eleitoral?
Isto só foi possível porque vivemos em uma falsa democracia, baseada em um sistema eleitoral farsesco, com debates "fakes", que permitem este tipo de estelionato, bem como o apoio inescrupuloso dos grandes meios de comunicação (RBS, em particular), que chegaram a fraudar pesquisas eleitorais (quem não se lembra que Sartori ganhou o 1º turno, mesmo aparecendo muito atrás nas pesquisas? Um verdadeiro trunfo do marketing eleitoral, que ludibriou com sucesso a opinião pública).
A bem da verdade, este programa político e econômico de submissão total ao neoliberalismo (qual seja: a única política permitida é a de privatizações; bancos e empresas públicas estão expressamente proibidos de disputar o mercado e de ter políticas de desenvolvimento social) é uma imposição ditatorial do mercado, da qual nenhum governo "democrático" pode fugir. Qualquer partido burguês eleito no lugar de Sartori aplicaria o mesmo programa neoliberal, de uma forma ou outra (incluso o PT e o PCdoB, provavelmente de um jeito mais brando). O fato, contudo, é que o governo Sartori se elegeu em um grande estelionato eleitoral, pouco ou mal compreendido (ou mesmo ignorado). Grande parte da população, ainda satisfeita com a política do pão e circo, afundada num individualismo atroz, foi conivente com isso, embora estejamos todos pagando o preço.
O partido do Sartori, na verdade, além de ser a máfia do PMDB, é composto pela RBS e grande mídia, os empresários da agenda 2020 e pelo sistema financeiro internacional. Enquanto não compreendermos que por trás das retóricas eleitoras (que se permitem toda a sorte de demagogias) estão os interesses dos empresários, banqueiros e agiotas, sustentados por instituições políticas que funcionam como o seu balcão de negócios, estaremos fadados a viver como escravos, pensando em sair do país (leia-se: fugir), fugindo da nossa responsabilidade social de encarar tudo isso e enfrentá-los como eles merecem. Apesar de ser duramente atacado e criminalizado pela grande mídia (em especial por jornalistas mercenários, como Diego Casagrande da Band), foi por tudo isso que fizemos greve.

sábado, 11 de novembro de 2017

A virtude de ter coragem

O texto abaixo foi escrito para a comunidade escolar do Alcides Cunha como resposta às muitas reclamações de pais e alunos sobre a interrupção das aulas para protestos, aulas públicas e períodos reduzidos contra a política neoliberal implementada pelo governo Sartori (PMDB), que sucateou ainda mais a educação pública, parcelando e atrasando o salário dos educadores.

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Segunda feira, dia 18 de abril de 2016, alunos e professores da escola Alcides Cunha saíram às ruas, mais uma vez, para protestar contra as condições da escola pública, após uma semana de períodos reduzidos, debates internos e ato de rua. Para muitos, pode parecer pouco e inconseqüente, mas não é. Nunca há inconseqüência na formação de um jovem e na politização de uma comunidade. O menor gesto finca suas raízes e produz os seus frutos, ainda que hoje não sejam perceptíveis.
         Num país em que homens-feitos se acanalham em frente às câmeras de televisão e de cargos no poder, cuidando apenas de seus interesses mais mesquinhos; e em que adultos não têm sequer a coragem de um pensamento próprio, ver adolescentes e educadores indo para as ruas lutar por um futuro para este país é, no mínimo, uma forma de cidadania.
          Sabemos que no Brasil as palavras não significam nada porque são vazias quando vem “dos de cima”. Neste contexto, em que a linguagem perdeu seu poder transformador, tornando-se uma forma de manter as coisas como estão, a nossa pequena escola resolveu pôr em prática o que os manuais do MEC e as “boas intenções” das leis do país apenas esboçam. A prática é o critério da verdade. Não podemos apenas ficar nas “boas intenções”, mas procurar traduzir a nossa indignação em formas de questionar a injustiça a que estamos submetidos por sucessivos governos, por menor que seja. Reclamar é fácil! Fazer algum movimento efetivo é muito difícil!

Nossos acertos e erros:
         Apesar destas lições de cidadania prática, tivemos muitos problemas de organização para expressarmos a nossa indignação. Fizemos um belo ato no dia 8 de abril e uma excelente aula pública no dia 18 do mesmo mês, mas a participação de alunos, professores e funcionários foi baixa. Tudo isso se deu por uma falta de planejamento maior dos professores e uma grande desmotivação por parte dos alunos, que preferiam correr para casa à participar de um movimento em defesa da educação pública. Porém, cabe destacar a participação da maioria dos alunos dos terceiros e segundos anos do Ensino Médio, que deram o exemplo de disciplina e compreensão do que se passa. Eles perceberam, de alguma forma, que a nossa luta não é apenas por salários em dia, mas em defesa da educação pública, das nossas condições de trabalho, ensino e aprendizagem.
Infelizmente, ao contrário dos 3ºs e dos 2ºs anos, muitos alunos e pais questionaram a validade da movimentação que fizemos, talvez, em razão das muitas traições de políticos, partidos, governos e sindicatos. Por isso eles não vêem perspectiva de mudança e voltam-se para o individualismo. Falam, erroneamente, que tudo isso é “perda de tempo”. Preferem ver os ataques aos serviços públicos e se resignar passivamente a eles. Para nós, a pior derrota é a derrota sem luta.
Em primeiro lugar, há que se perguntar por que se faz algo? O que leva uma pessoa a tomar uma atitude? Por que alguém deixaria de lado a comodidade tranqüila de sua vida cotidiana para se indispor com colegas, direção, pais e alunos? Qual imperativo conduz um professor, cuja sobrevivência depende, geralmente, de um único emprego, a expor-se ao assédio moral ou à uma demissão sumária e perder seu sustento?
Se houvesse democracia em nossa sociedade ou se o governo Sartori (PMDB) realmente tivesse interesse em resolver os problemas da educação, tal como fala durante os períodos eleitorais, certamente nada disso seria necessário. O nosso movimento de períodos reduzidos e atos de rua foi uma resposta de nossos professores, cansados dos desmandos de sucessivos governos que não deixam outro caminho a não ser a mobilização e a denúncia de rua. O atual “ajuste fiscal”, proposto por todos os governos, ameaça a existência dos serviços públicos. Se deixarmos, eles nos tirarão tudo.
E se nada ou pouco alcançamos com esta mobilização de períodos reduzidos, saibam que uma luta não se mede apenas pelo que se ganha ou se perde, mas pela justeza de sua causa e pelo coração de quem luta. Não é nossa intenção parar de lutar. Estamos apenas começando. Há muito que fazer. Mas precisamos de todos vocês: pais, alunos, professores, funcionários, direção. De toda a nossa comunidade, enfim! De todos aqueles que sabem que algo está errado neste mundo e sentem o peso da injustiça nas costas. Pois são os nossos ombros, os ombros dos trabalhadores, que sustentam o mundo. E ninguém mais vai aliviar esta carga a não ser nós mesmos: unidos e lutando!
Achamos que a vida não deveria ser apenas trabalhar, ver TV e consumir. A vida é mais do que um pobre salário para comprar outra TV ou um carro novo à prestações. A vida não deveria ser à prestações. É por pensarmos assim que continuaremos procurando formas de mobilização, de denúncia, de tencionar o governo e a opinião pública. Para nós, lutar é um processo. Não temos garantia de vitórias. Mas só vence quem luta, quem erra, revê os erros, acerta; quem junta mais uma, duas, dez, mil, um milhão de pessoas para lutar; quem revê as formas de luta, as bandeiras, os métodos. Quem não luta não pode vencer. O único caminho que resta para quem não luta é o de reclamar e ver a vida passando na janela ao lado.